1º dia da Tech Trends: 'IA deixou de ser papo de nerd e virou papo de bar'

Na mesma semana em que São Paulo recebe duas grandes feiras, a Gamescom (de videogames) e a Febraban Tech (de tecnologias financeiras), uma nova iniciativa tenta consolidar a veia tecnológica da capital paulistana. É a Tech Trends, que começou em 25 de junho e Tilt está acompanhando de perto.

No Pavilhão Amarelo do Expo Center Norte, três salas têm programação praticamente ininterrupta entre 14h e 20h. Por lá passaram vários empreendedores, pensadores e gestores públicos para discutir tendências tecnológicas —entre eles, representantes de empresas como Nvidia, Foursys e Oracle.

Além das salas, com debates e palestras, a feira conta com estandes de algumas marcas, da Prefeitura de São Paulo e da São Paulo Negócios (agência pública para o fomento de inovação na capital). Não é por acaso: muitos dos convidados são agentes públicos ou startups que gostariam de fazer negócios com governos.

Uma das áreas de maior destaque do evento é a Startup Village, onde dezenas de líderes de startups em estágios iniciais ficam em uma pequena bancada para apresentar seus negócios e trocar contatos.

Segundo estimativas da organização do evento, aproximadamente 2.000 pessoas passaram por ali no primeiro dia.

"São Paulo tem muitos eventos de tecnologia segmentados. Queremos contribuir para esse cenário com um que traga temas mais guarda-chuva para compartilhar o conhecimento de forma holística", explica Kevin Tang, sócio da V3A, agência responsável pela organização do Tech Trends 2024.

Embora os temas das palestras sejam variados, não dava para fugir: ao menos no primeiro dia, a inteligência artificial apareceu em todas —algumas vezes como uma provocação no meio da conversa, em outras como a espinha dorsal de toda a discussão.

Quem tem medo de regulação?

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Imagem: Divulgação
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Justamente pela centralidade do tema da IA, uma das mesas mais aguardadas no primeiro dia era a que discutia a regulamentação da IA no Brasil. Marcos Pontes, senador e ex-ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação do governo Bolsonaro, estava anunciado como um dos participantes ao lado da advogada Carolina Giovanini e do presidente do Fórum Inova Cidades Antonio Carvalho e Silva Neto.

Pontes tem participado das discussões sobre a regulamentação da IA no Senado. No Tech Trends, no entanto, afirmou ter tido problemas de saúde e não compareceu.

Giovanini e Silva Neto compartilharam visões semelhantes durante a conversa. Segundo eles, é importante propor uma regulação que não seja extremamente restritiva para não matar a inovação.

"A regulação não pode ser uma castração da IA. Dependendo de como for colocada, podemos matar uma tecnologia que continua na sua infância", defendeu Silva Neto, ao dizer que não deveríamos nos inspirar tanto em legislações europeias, como foi o caso da LGPD.

Giovanini concordou dizendo que os reguladores deveriam ouvir mais a comunidade técnica no assunto. "Normalmente, os legisladores são os que chegam com a plaquinha do 'não', mas muitas vezes a própria comunidade encontra soluções para aqueles problemas que simplesmente seriam proibidos", disse a advogada.

Segundo ela, da forma como a proposta de regulamentação da inteligência artificial está sendo debatida no Senado, ela arrisca restringir tecnologias em fase de teste. "Mas esse é o momento em que a tecnologia não só pode falhar, como espero que ela falhe antes de ir ao mercado."

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No mesmo dia, o instituto Brazil Fórum UK divulgou pesquisa que revela que 73% dos brasileiros defendem a necessidade da criação de regras para o uso de IA. Além disso, 52% dos entrevistados afirmaram acreditar que a IA traz mais riscos que benefícios, enquanto apenas 19% acreditam que é o contrário e 28% não souberam responder.

Bob Burnquist

Outro nome em destaque para o primeiro dia do Tech Trends 2024 foi o de Bob Burnquist, skatista brasileiro com o maior número de medalhas no X Games, para falar de NFTs e web3.

Foi um momento nostálgico. Entre 2022 e 2023, antes de a IA tomar o noticiário de tecnologia e festivais de inovação, web3 e cripto eram as grandes promessas de futuro da tecnologia ao lado do metaverso.

Mas lá estava Burnquist para lembrar que, para alguns, o sonho não morreu. Performático, entrou de skate no palco e logo começou a falar sobre criadores de conteúdo não poderem mais depender de big techs como Google e Meta para ganharem dinheiro.

A grande promessa da web3 é, por meio de tecnologias como blockchain, descentralizar a propriedade digital e, com isso, eliminar intermediários no caminho.

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Burnquist é sócio da NFT.Brasil, exposição de arte de NFTs, mas estava lá para falar do Vrbs, projeto que criou dentro da Nouns.

Explicamos: uma NFT é um bem eletrônico que não pode ser copiado ou substituído por outra coisa; já DAO é uma espécie de coletivo descentralizado online onde tudo é decidido coletivamente conforme o poder de voto que cada um tem; e a Nouns é uma dessas DAOs, na qual Burnquist criou um subprojeto para empoderar artistas.

Se ainda estiver complicado, saiba que foi muito mais confuso para a maioria do público, que assistia olhando um para o outro e soltando pequenos risos de cumplicidade para indicar que também não entendiam muito bem o que estava sendo falado.

A apresentação de Burnquist não levantava muitas bandeiras e focava mais em explicar o funcionamento de sua tecnologia. Ele alegava que poderia utilizá-la, por exemplo, para angariar fundos para um projeto social, como o seu Instituto Skate Cuida.

Os NFTs estão em queda há um tempo. A coleção Bored Ape, que ficou conhecida pelo grande investimento de Justin Bieber, perdeu mais de 90% do seu valor. Para Burnquist, no entanto, isso não é tão relevante. "Uma NFT que eu tinha [dentro da Nouns] valia mais de US$ 130 mil e hoje está valendo uns US$ 20 mil. Caiu, mas eu ainda tenho poder de voto e acesso a um tesouro coletivo com US$ 20 milhões."

Inovação aberta, inteligência artificial

Pausa para um café e vamos para mais palestras já que, no resto da feira, não tinha muito o que se ver. Um debate sobre inovação aberta começa, com participação de Morganna Tito, do Inovabra, Alvaro Machado, da Singularity University, Gabriela Aguiar, da Plug and Play e Fábio Neto, do Startse.

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Os debatedores discutiam o conceito de inovação aberta e como, em 2024, ainda continua muito relevante a estratégia de grandes corporações investirem em startups. Mas Neto alertava para um risco: "As corporações não podem pensar com cabeça de executivo, tem que ser com mentalidade de empreendedor. Se não, compra a empresa e mata a inovação".

E quem ganha com esse jogo? Segundo os debatedores, todos. "Se a relação não for boa para startup e corporação, é tudo menos inovação aberta", disse Machado. "Quem se beneficia da inovação aberta é a economia como um todo", disse Aguiar.

A conversa, como não poderia ser diferente, acabou em IA generativa. Para Neto, 2023 foi o ano de espanto; 2024 é ano de amadurecimento e estudos sobre o tema; e 2025 será o ano em que o Brasil investirá nele. "IA deixou de ser papo de nerd e virou papo de bar", comentou.

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