Humanos estão em plena evolução no Tibete e se adaptam à falta de oxigênio

As comunidades que vivem nas grandes altitudes no platô do Tibete provaram uma ideia que parecia coisa do passado: o ser humano continua em pleno processo de evolução. Os moradores daquela região estão se adaptando aos baixos níveis de oxigênio.

A conclusão é de um estudo publicado no dia 21 de outubro no periódico PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America).

Como o estudo foi feito

Os cientistas coletaram informações em campo de 417 mulheres tibetanas que tinham entre 46 e 86 anos. Elas viviam entre 3.657 metros e 4.267 metros acima do nível do mar, em Mustang, no Nepal, extremo sul do platô do Tibete. Até 2019, eles coletaram dados sobre o histórico reprodutivo delas, suas medidas corporais, amostras de DNA e fatores sociais.

Objetivo era entender como mecanismos de distribuição do oxigênio no organismo influenciavam o número de partos de bebês vivos. Nascimentos são considerados uma medida-chave de boa adaptação evolutiva, mesmo após colocar na balança os fatores culturais (mulheres que se reproduzem cedo e são casadas por longos períodos têm maior chance de ter filhos).

O que resultados mostram

Vilarejo tibetano visto do Himalaia
Vilarejo tibetano visto do Himalaia Imagem: James Yu/Divulgação

Características únicas. Especialistas descobriram que as mulheres que tiveram mais filhos tinham uma coleção única de características sanguíneas e cardíacas que auxilia seus corpos a distribuírem oxigênio. Estas mulheres de organismos "fortes" têm maior probabilidade de ter mais bebês. E estes bebês, tendo herdado traços de sobrevivência de suas mães, têm maior probabilidade de sobreviver à vida adulta e passar estas características para a próxima geração.

Saturação alta e níveis médios de hemoglobina. Na prática, as mulheres que deram à luz mais crianças vivas apresentavam níveis médios de hemoglobina (proteína do sangue que transporta o oxigênio para os órgãos), mas seu nível de saturação de oxigênio era alto — ou seja, suas células recebem oxigênio mais eficientemente sem aumentar a viscosidade do sangue. Quanto mais "grosso" o sangue, maior o esforço (e o desgaste) do coração.

Anteriormente achávamos que um valor mais baixo de hemoglobina fosse benéfico, agora entendemos que um valor intermediário traz o maior benefício. Sabíamos que altos níveis de saturação de oxigênio de hemoglobina eram bons, agora entendemos que quanto mais alta a saturação, melhor. O número de nascimentos vivos quantifica os benefícios. Cynthia Beall, autora do estudo, em entrevista ao site especializado ScienceAlert

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Mulheres com os mais altos índices de sucesso reprodutivo também tinham alto nível de fluxo sanguíneo nos pulmões. Seus corações ainda tinham ventrículos esquerdos mais largos do que a média — esta é a câmara do coração responsável por bombear sangue oxigenado para o corpo. Levando tudo isso em consideração, esses mecanismos aumentam o transporte e entrega de oxigênio e tornam o corpo humano capaz de aproveitar melhor o ar que respira.

"Este é um caso de seleção natural em andamento", classificou Beall. A professora explicou que as mulheres tibetanas "evoluíram de uma forma que equilibram as necessidades de oxigênio do corpo sem sobrecarregar o coração".

Gene seria responsável por regular a concentração de hemoglobina das mulheres do Tibete. Segundo os pesquisadores, as populações indígenas do Tibete possuem uma variante única do gene EPAS1, que regula a proteína sanguínea. Este traço genético teria, provavelmente, se originado com os hominídeos de Denisova, que viveram na Sibéria há cerca de 50 mil anos e cujos descendentes migraram posteriormente para o platô tibetano. Junto com as outras características, como aumento de fluxo sanguíneo pulmonar e ventrículos mais largos, permitiram maior sucesso reprodutivo e adaptativo.

Estudo demonstra também como o ser humano se adapta a ambientes extremos. Isso oferece pistas de como poderemos lidar com os futuros desafios ambientais trazidos pelas mudanças climáticas. "Entender como as populações como esta se adaptam nos dá um melhor entendimento dos processos da evolução humana", comemorou a professora em comunicado à imprensa.

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