O ódio venceu: por que 'haters' superam fãs na internet?

(Toda semana, Diogo Cortiz e Helton Simões Gomes conversam sobre tecnologia no podcast Deu Tilt. O programa vai ao ar às terças-feiras no YouTube do UOL, no Spotify, no Deezer e no Apple Podcasts. Nesta semana, o assunto é: 'Detector de injustiças'; Ódio x amor: o que une a internet?; Como dar fim à polarização?)

Se você tinha alguma suspeita, aí vai: o ranço, de fato, une as pessoas. Mas não só isso: esse sentimento de aversão a alguém ou a alguma ideia tem agrupado mais pessoas do que o amor.

Em entrevista ao Deu Tilt desta semana, o neurocientista Paulo Boggio explica que os seres humanos tradicionalmente se unem em grupos baseados naquilo que defendem. Ultimamente, porém, o ódio vem vencendo e é essa emoção que está unindo as pessoas.

Se olharmos a polarização atual, vamos ver pessoas muito diferentes apoiando o mesmo candidato. Pessoas que, do ponto de vista da pauta positiva, não estariam no mesmo grupo, mas que estão se unindo pelo elemento negativo
Paulo Boggio

Professor do Mackenzie e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Neurociência Social e Afetiva, Boggio conta que essa inversão de tendência é captada por pesquisas norte-americanas.

A gente entra em grupos ou está em grupos com a tentativa de valorizar positivamente as próprias características. Obviamente precisaremos estar em grupos em que valorizamos as características deles
Paulo Boggio

Há dois termos usados no mundo acadêmico para definir essas relações, explica o cientista. Os seres humanos costumam se agregar em torno daquilo que amam —é o chamado "ingroup love" ("amor pelo que pertence ao grupo")—, enquanto dedicamos ódio ao que é de fora do grupo —é o "outgroup hate" ("ódio ao que vem de fora do grupo").

"Se eu for pensar em política, eu posso apoiar um candidato porque ouço e vejo nele pautas que considero importantes, que são positivas. Isso seria afiliação a um grupo por um 'ingroup love'. Mas eu posso não votar em um candidato porque eu sou contra tudo o que ele propõe, porque odeio o que ele fala. Essa é uma identificação mais forte pelo 'outgroup hate'"
Paulo Boggio

Em termos técnicos, o que está ocorrendo é que mais pessoas estão se unindo em torno do "outgroup hate" do que pelo "ingroup love". E a guinada dessa tendência é uma possível explicação para a crescente polarização entre diferentes grupos, diz Boggio.

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Esse comportamento não apaga outras possíveis filiações que as pessoas venham a ter. Ou seja, as pessoas continuam se associando por defenderem algo ou por amarem algo. Mas o que as faz agir como coletivo é aquilo que repudiam.

Como exemplo, o cientista cita os apoiadores de Donald Trump, presidente eleito dos Estados Unidos. Nesse caso, há um perfil específico de votantes no candidato republicano, mas ao mesmo tempo há pessoas muito diversas que votaram nele na última eleição.

Boa parte do que nos define e que define os grupos é como a gente julga moralmente pessoas e atos. Nós fazemos isso o tempo inteiro. Para polarizar, é fácil: basta apontar para o lado e dizer que o outro está propondo algo moralmente errado
Paulo Boggio

'Radar de injustiça': o mecanismo do cérebro que salva você de gente egoísta

Pode não parecer, mas seu cérebro é capaz de identificar injustiças —e rejeitá-las— em um tempo menor do que um piscar de olhos. É o que aponta Paulo Boggio, professor do Mackenzie e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Neurociência Social e Afetiva.

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Um dos neurocientistas brasileiros mais respeitados do mundo, Boggio explicou em entrevista ao Deu Tilt, podcast do UOL para humanos por trás das máquinas, que o cérebro leva menos de 100 milissegundos para identificar uma situação que pode ser considerada injusta.

É aquela sensação incômoda que a gente não sabe de onde vem, mas que está detectando alguma coisa
Paulo Boggio

Por que 'se colocar no lugar do outro' gera mais polarização --e não menos?

Você já deve ter ouvido que a solução para conflitos é "se colocar no lugar do outro", mas talvez não seja bem assim. Muito pelo contrário. Pelo menos, é o que diz o neurocientista Paulo Boggio, professor do Mackenzie e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Neurociência Social e Afetiva.

Boggio afirma que o exercício de "se colocar no lugar do outro" —também conhecido como empatia— pode levar ao que filósofos alemães chamam de "Schadenfreude", que não tem tradução para o português, mas significa algo como, "prazer na dor alheia".

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Teve um hype de promover a empatia, que é um mecanismo excelente para promover cooperação, mas ela também promove competição entre grupos
Paulo Boggio

DEU TILT

Toda semana, Diogo Cortiz e Helton Simões Gomes conversam sobre as tecnologias que movimentam os humanos por trás das máquinas. O programa é publicado às terças-feiras no YouTube do UOL e nas plataformas de áudio. Assista ao episódio da semana completo.

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