Quais as chances de um míssil atingir avião comercial cheio de passageiros?
Por que um míssil seria lançado contra um avião civil depois da decolagem? E quais são as chances de isso acontecer? São perguntas que muitos se fizeram após essa hipótese ter sido levantada na investigação da queda de um avião comercial da Azerbaijan Airlines, na quarta-feira (25).
Um avião civil consegue escapar de um míssil?
Uma vez lançado o míssil, o avião não tinha o que fazer para evitá-lo. "Os aviões civis não têm nenhuma forma de saber que estão sendo atacados", afirma o especialista em aviação civil Adalberto Febeliano.
"Os [aviões] militares têm várias tecnologias desses sistemas antiaéreos. Alguns usam radar, outros usam infravermelho. Se usa radar, por exemplo, você percebe que está sendo iluminado pela radiação. Mas tem muito pouca chance de manobra evasiva de míssil. Ele não precisa acertar, ele precisa explodir perto de você", explica.
Uma aeronave de combate ainda teria recursos para despistar os mísseis, que quase ganham "vida própria" depois de lançados. Os sistemas seguem calor, ou a iluminação de um radar direcionado no alvo, e são difíceis de despistar.
As estratégias para isso são ferramentas para enganar radares com nuvens de pequenas partículas ou pequenos foguetes que confundem mísseis direcionados por sensores infravermelho e atraídos por altas temperaturas.
Aviões normais não estão equipados com estes recursos, nem têm motivos para isso. "Ninguém quer derrubar um avião de passageiro. Todos eles são fruto de algum mal entendido, procedimento errado. Nesse aspecto, é sempre um acidente", conclui Febeliano.
Já houve outros casos assim?
O retrospecto de casos parecidos com o que pode ter acontecido com o avião da Azerbaijan Airlines aponta para erros de forças armadas ou a ação de grupos que não seguem uma doutrina militar, na análise do especialista.
Feito na Rússia, o armamento teria partido do oeste russo e atingiu a aeronave na Ucrânia. O incidente ocorreu meses depois de russos e ucranianos entrarem em guerra, o que tornava aquela região perigosa.
"É um caso que poderia ter sido evitado. Quando os pilotos vão decolar, recebem o Notam (aviso aos aeronavegantes, da sigla em inglês), que traz um monte de informações operacionais ao piloto. Se você vai fazer um voo de 12, 13 horas [caso do MH17, que saiu de Amsterdam para Kuala Lumpur], esse Notam é um calhamaço. Uma das informações que tinha era que aquela era uma zona de conflito a ser evitada. Essa notícia acabou escapando do piloto", lamentou Febeliano.
Em junho de 2019, investigadores holandeses acusaram três russos e um ucraniano como responsáveis por abater o avião. Nenhum deles representava, oficialmente, as forças armadas dos dois países.
Um caso que tem mais semelhanças com o que ocorreu no Irã —se confirmado que a queda ocorreu por conta de um míssil— também teve como principais envolvidos americanos e iranianos. Em 1988, um navio da marinha dos Estados Unidos derrubou um voo comercial da Iran Air, que voava de Teerã para Dubai, no Estreito de Ormuz.
O motivo pelo qual mísseis antiaéreos foram lançados é disputado entre os dois países. Americanos afirmam que a tripulação do navio identificou, erroneamente, o avião comercial como um jato de combate, enquanto iranianos acusaram que foi um ato negligente da marinha. 290 pessoas morreram com a queda do Airbus A300.
A identificação de aviões é feita por um equipamento chamado transponder, usado em aeronaves civis e militares. Ele gera um código ao se comunicar com o radar de controle de tráfego aéreo, que passa a ser a identidade do veículo. Aviões militares podem desligar o transponder quando estão em missões, mas os civis, não.
Há a possibilidade do equipamento apresentar problemas, mas Febeliano explica que isso é pouco provável. Analisando o caso de 1988, o especialista afirma que houve um erro por parte dos americanos, que deveriam "ter percebido que era um avião civil, mas não tinham a informação completa".
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Quero receberO outro recurso para tirar dúvidas se um avião é civil, mesmo com problemas na identificação, são as regras de engajamento entre aeronaves. Felebiano descreve como isso funciona na prática: "Você identifica um avião sem transponder. Esse é um cara que quer se esconder. Aí você coloca um caça para observar o avião e tentar se comunicar. Se não tiver resposta, o caça vai se aproximar do avião, vai mostrar que está próximo e fazer sinais para que ele pouse. Se ele ignorar, o caça vai pedir autorização para o tiro de abate".
Um procedimento desses resultou no abatimento do voo 007 da Korean Air Lines em 1982. Saindo de Seul rumo a Anchorage, no Alaska (EUA), o avião fugiu de sua rota e atravessou espaço aéreo soviético considerado proibido. Considerada como espiã americana, a aeronave foi abordada por um caça soviético e, por não obedecer os avisos, abatida por mísseis lançados no ar.
Todas as 269 pessoas que estavam naquele Boeing 747 morreram.
Texto republicado. Originalmente foi ao ar em 10/01/2020
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