O que a calçada, o açaí, a fossa séptica e a bananeira têm em comum? Nada tão engraçado quanto a pergunta sugere. A resposta passa por um ramo da ciência muito criativo, que busca soluções de grande impacto, usando tecnologias descomplicadas e, muitas vezes, inusitadas: a inovação frugal.
Sabe o tanquinho de lavar roupas e o filtro de barro? Aquecedor de água e forno que funcionam com luz solar? Garrafas PET como fonte de iluminação? São exemplos disso. O brasileiro é mestre em arranjar soluções assim, mas o conceito é científico e ganhou visibilidade em 2010 com o artigo "First break all the rules - The charms of frugal innovation" (Primeiro quebre todas as regras - Os encantos da inovação frugal), da revista britânica "The Economist".
A graça está na simplicidade, mas não só. A inovação frugal se desenvolve silenciosamente, à margem dos sofisticados laboratórios e dos multimilionários centros de pesquisa e desenvolvimento, e passa pela capacidade de se equacionar baixo custo e alta eficácia para resolver problemas complexos. Geralmente acontece por dedicação individual e pode estar acompanhada ainda de uma preocupação com o meio ambiente ou uma causa social.
O tema virou objeto de estudos e pesquisas, mas como tudo ainda é muito novo na academia ainda não há um consenso sobre sua definição. Em geral, há uma característica fundamental: surge na base da pirâmide e envolve o uso inovador de materiais simples, quase sempre ignorados ou negligenciados, para incluir pessoas. Isso pode valer para fossas ou carros.
"Isso distingue a inovação frugal de outros tipos de inovação: ela começa a incluir pessoas que não têm uma escolaridade específica, uma formação técnica nem os recursos financeiros e materiais para inovar", explica a doutora em estudos do desenvolvimento pelo Instituto Internacional de Estudos Sociais (IISS), da Universidade Erasmus de Roterdã (Holanda), Ariane Agnes Corraldi. Por exemplo, quando são grandes empresas que fazem a inovação frugal, a questão passa a ser para quem se inova, e não quem inova.
O objetivo é aumentar o mercado para aquele que não tem renda, reforça Luc Quonian, professor livre docente em ciências da informação e da comunicação na Université Aix Marseille III (França).
E favor não confundir com "gambiarra", dizem os especialistas.
A gambiarra ocorre no improviso, "muitas vezes no limite da legalidade e sem observar normas técnicas e de segurança", diz Corraldi —ainda que se trate de uma ciência em que o senso prático e o empirismo podem ser mais valiosos do que o domínio teórico e uma titulação de pós-doutorado. "Já a tecnologia frugal é a manifestação de uma força criativa que inova a partir de soluções simples disponíveis através de um processo social."
Veja abaixo alguns exemplos de inovações "mais raiz e menos Nutella" aqui no Brasil.