Briga por Taiwan pode paralisar líder mundial de chips e gerar crise global
O gás russo pode ser substituído, mas os semicondutores da fabricante de chips TSMC, de Taiwan, não.
A empresa domina o mercado global como nenhuma outra, e por isso é alvo da cobiça da China. Não é uma coincidência que a presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, tenha também se reunido com Mark Liu durante sua visita a Taiwan. Ele é o presidente da empresa mais valiosa da ilha, a Taiwan Semiconductor Manufacturing Company (TSMC).
Liu tem grande poder sobre o fornecimento de semicondutores para a economia global, desde chips de ponta para a indústria aeroespacial a circuitos usados em carros e geladeiras. Se a produção de chips parar na cidade de Hsichnu, a metrópole de semicondutores de Taiwan, na costa noroeste da ilha, logo os fabricantes de automóveis na Alemanha, do outro lado do mundo, também terão que interromper suas linhas de montagem e dispensar funcionários.
Liderança mundial conquistada em 30 anos
Na zona franca de Hsinchu, que tem menos de 500 mil habitantes, a indústria de semicondutores é a prioridade desde os anos 80. Lá, a menos de 150 quilômetros da China continental, estão duas das mais importantes universidades da ilha, que formam especialistas para as empresas no parque científico local.
A indústria ótica está representada, assim como algumas das empresas de energia solar de Taiwan. O coração do parque, entretanto, são os 20 fabricantes de semicondutores que produzem chips para as grandes tendências digitais da economia global. A partir de lá, os dois maiores fabricantes de semicondutores do planeta, TSMC e UMC, fornecem ao mundo seus produtos de alta tecnologia.
A TSMC é a líder incontestável, com cerca de 65 mil funcionários, não apenas em Taiwan, mas em todo o mundo. A empresa fabrica mais de 10 mil produtos diferentes, que definem o ritmo do mundo digital.
Desconhecidos, mas muito relevantes
O logotipo da empresa não aparece em nenhum dos produtos, porque a TSMC é o que se chama de fundição - fabricantes contratados para produzir semicondutores de alta qualidade em nome da Apple e de outras corporações de tecnologia.
Muitas das empresas mais conhecidas do mundo da tecnologia não têm fábricas próprias, e dedicam toda sua energia ao desenvolvimento e ao projeto de semicondutores. Os chips são então produzidos em uma fundição como a TSMC.
Aposta autoconfiante
Mark Liu dirige essa empresa extremamente importante, da qual a maioria das pessoas nunca ouviu falar antes. Pouco antes da visita de Pelosi a Taiwan, o chefe da TSMC, falando à CNN, advertiu que uma invasão chinesa da ilha provocaria a interrupção da produção de chips nas fábricas da TSMC.
Em uma rara entrevista, veiculada na segunda-feira, o chefe da TSMC declarou com confiança: "Ninguém pode controlar a TSMC pela força." No caso do uso da força militar ou de uma invasão, "uma fábrica de TSMC não estaria mais operacional", afirmou Liu, sem detalhar o motivo. Ele apenas disse: "São instalações de produção muito sofisticadas, que dependem de conexões em tempo real com o mundo exterior, com a Europa, o Japão, com os EUA".
Domínio do mercado como nenhuma outra empresa
A TSMC domina mais da metade do mercado global de semicondutores. Seus clientes são todos os grandes nomes da indústria global de semicondutores: além da Apple e da Qualcomm, a alemã Infineon também tem sua produção em Taiwan.
As americanas Intel e Broadcom também têm semicondutores que elas desenvolveram produzidos pela TSMC, assim como a Nvidia, especializada em processadores gráficos. Todos as empresas envolvidas nas grandes tendências tecnológicas atuais, como digitalização, inteligência artificial ou veículos autônomos, dependem dos especialistas em semicondutores em Hsinchu.
"Eles construíram para si uma posição de importância sistêmica", afirmou Peter Fintl, especialista em semicondutores da consultoria Capgemini, ao jornal alemão Handelsblatt. A TSMC também é líder mundial em processos de fabricação de chips de ponta, como para a indústria aeroespacial ou de defesa.
Nos EUA, os semicondutores da TSMC são usados em aviões de combate F-35 ou no sistema Javelin de armas antitanque, com o qual a Ucrânia conseguiu neutralizar muitos tanques russos. Os componentes da TSMC também estão em supercomputadores dos laboratórios nacionais dos EUA, onde são realizadas pesquisas de interesse estratégico do governo americano.
Não apenas tecnologia de ponta
Como as empresas de Taiwan também fabricam chips menos sofisticados para diversos bens de consumo, a indústria global é particularmente dependente de uma produção ininterrupta na TSCM. Não é surpresa que alertas soam quando Pequim ameaça invadir e incorporar Taiwan à China.
Desde que o então presidente dos EUA Donald Trump aumentou a pressão sobre as empresas asiáticas de alta tecnologia para construírem fábricas em território americano, muita coisa aconteceu. Uma nova fábrica de chips da TSMC está sendo construída no Arizona e deve ficar pronta em 2024, ao custo de 12 bilhões de dólares (R$ 62 bilhões). A empresa pretende produzir semicondutores para clientes americanos como Apple, Nvidia ou Qualcomm perto de Phoenix.
Não será a primeira fábrica da TSMC nos EUA. A empresa já produz os wafers - discos finos nos quais os circuitos integrados, os microchips, são feitos - em fábricas na costa oeste americana. No Texas, a TSCM mantém centros de pesquisa para projetar processadores.
Mais produção nos EUA e na Europa
De acordo com o Washington Post, a reunião com Pelosi também envolveu o Chips and Science Act, que acaba de ser aprovado pelo Congresso americano. Com um total de 52 bilhões de dólares (R$ 271 bilhões), os Estados Unidos querem promover novas fábricas em seu território. Porém, os generosos subsídios só estão disponíveis para fabricantes que garantam que tecnologia sensível para a produção de chips não seja usada na China. Afinal, nenhum outro país tem se esforçado mais há anos para adquirir o know-how para produzir chips de alta qualidade a fim de acompanhar o Ocidente no setor bélico ou aeroespacial, para depois ultrapassá-lo tecnologicamente.
Em uma entrevista à emissora Welt, o especialista em China e colunista da DW Alexander Görlach, da Universidade de Oxford, resumiu: "A China está interessada na indústria de produção de semicondutores de Taiwan porque a China tem as terras raras e Taiwan tem a tecnologia e o know-how". Essa é uma das razões centrais pelas quais a Alemanha e os EUA não podem simplesmente ficar parados e ver Taiwan ser tomada pela China, diz Görlach. "Porque então nenhum carro também sairá das linhas de montagem em nosso país se os chips de Taiwan não chegarem."
O programa de semicondutores da Europa
A União Europeia (UE) também está trabalhando em busca da independência na produção de chips e planeja estímulos para a sua indústria de semicondutores. Com o Ato Europeu de Chips, a Comissão Europeia quer apoiar a indústria de chips com 43 bilhões de euros (R$ 230 bilhões) em fundos públicos. O objetivo: dobrar a participação da Europa na produção global de chips, hoje em menos de 10%, para 20% até 2030. O projeto de uma enorme fábrica de chips da Intel em Magdeburg, no estado alemão da Saxônia-Anhalt, é um passo nesse caminho.
Até lá, porém, ninguém poderá deixar Taiwan de lado. De acordo com a Associação da Indústria de Semicondutores dos EUA, a ilha produz mais de 90% dos chips de alta qualidade do mundo - e a TSMC tem de longe a maior participação.
Mark Liu é conhecido por dar declarações sutis. Quando questionado por que a China, apesar dos bilhões em subsídios governamentais, não consegue produzir chips de tão alta qualidade como Taiwan, o chefe da TSMC respondeu à CNN com um sorriso: "Ah, eles podem, mas alguns anos mais tarde do que nós."
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