Ecofrango em cápsula e hambúrguer de impressora 3D; encara essas novidades?
Três anos atrás, a mídia internacional se reunia diante de um palco em Londres para ver um homem comer hambúrguer. O que havia de tão sensacional no evento? Custando 290 euros, o sanduíche era o resultado de um projeto de pesquisa de vários anos, financiado por Sergey Brin, o excêntrico cofundador da Google.
Seus cientistas haviam cultivado 20 mil fibras de músculo a partir de células-tronco bovinas, para criar uma substância biologicamente idêntica à carne de vaca. Tratava-se de uma prova de viabilidade, e na época os cientistas afirmavam não esperar que essa "carne cultivada" fosse comercializável antes de 20 a 30 anos.
No entanto, no início deste ano a startup israelense SuperMeat lançou uma nova forma de fazer crescer artificialmente carne de galinha, com potencial de se tornar comercialmente viável dentro de apenas cinco anos, e com um hambúrguer de frango custando apenas 1,80 euro (menos de 6,50 reais).
Da vaca à galinha 3D
Para o porta-voz da companhia Shir Friedman, "é a solução perfeita, porque não força ninguém a mudar seus hábitos". "Você não está pedindo às pessoas que se convertam a algum produto tipo tofu ou à base de vegetais, mas oferece exatamente o mesmo produto que as culturas delas vêm comendo há séculos."
Enquanto a maior parte dos experimentos para a carne de proveta se concentrou em bovinos, SuperMeat focou nas aves, por serem a carne mais consumida - para cada vaca, são abatidas 100 galinhas.
A meta é cultivar peitos de frango num "forno de carne", a partir das células de aves reais. Localizados em fábricas, supermercados, restaurantes e, por fim, até mesmo em residências particulares, os aparelhos permitiriam aos consumidores criarem sua própria carne apenas com a introdução de uma cápsula.
Nesse método não se usa soro animal, como no hambúrguer de Brin, mas sim células. Ele se baseia na tecnologia revolucionária desenvolvida em 2006 por Yaakov Nahmias, professor da Universidade Hebraica: uma técnica de impressão em 3D utilizada por ele para mapear células hepáticas humanas.
Impacto climático do consumo de carne
A ideia de cultivar carne em laboratório não é nova. Em seu ensaio de 1932 Fifty years hence (Daqui a 50 anos), o político inglês Winston Churchill predizia: "Vamos escapar do absurdo de criar todo um frango para comer o peito ou a asa, cultivando essas partes separadamente, com o uso de um meio adequado."
Essa previsão não se concretizou, principalmente pela falta de demanda pública. Nas últimas décadas tem aumentado no Ocidente o número daqueles que, horrorizados com as práticas da pecuária industrial, tornam-se vegetarianos por motivos éticos. No entanto seu número não é suficiente para justificar a produção comercial de carne de laboratório.
Mas a ameaça global das mudanças climáticas deu novo impulso à ideia. Muitos ignoram que o consumo de carne é responsável por algumas das maiores emissões de gases do efeito estufa. Os diferentes tipos de gado são responsáveis por 5% das emissões de dióxido de carbono (CO2) e 40% das de metano, um gás ainda mais nocivo.
Além disso, para cada 15 gramas de proteína animal, são necessários 100 gramas de proteína vegetal, e criar animais para corte exige enormes terras e rações em proporção gigantesca. Quase metade da superfície arável do planeta já é coberta por pastos ou plantações para produção de ração animal, enquanto apenas 4% é dedicada a safras para consumo humano.
Supercarne superecológica?
A explosão demográfica nos países emergentes, aliada ao aumento do consumo de carne entre a classe média de países como China e Índia, sugere que o mercado de carne dobrará de volume até 2050, tornando o impacto climático da carne como alimento tão sério quanto o dos transportes.
Simplesmente não é sustentável. Nós realmente não teríamos alternativa, senão parar. A Terra não possui água nem superfície suficientes, não temos planeta suficiente para continuar nesse caminho
Friedman, da SuperMeat
Segundo um estudo conduzido pelas universidades de Oxford e Amsterdã, se a humanidade passasse a comer em massa carne cultivada, seriam emitidos 80% menos gases do efeito estufa, e 99% menos terra seria ocupada para a pecuária. Cultivar carne em grande escala exige grande consumo de energia - mas, ainda assim, 7% a menos do que a criação de animais para abate.
Superando a repulsa
Contudo ainda é grande a descrença em relação à produção, em curto prazo, de carne de laboratório em escala comercial. Há poucos investidores tão aventureiros quanto Brin, e para firmas como a SuperMeat tem sido difícil obter patrocínio, devido ao ceticismo dos investidores sobre se os consumidores estarão realmente dispostos a comer carne de proveta.
Entre as iniciativas para normalizar a ideia na mente do público, combatendo o fator da repulsa, o termo "carne cultivada" é uma tentativa de tornar o produto mais apetitoso: originalmente ele era denominado "carne de células-tronco".
"Uma vez que entre em escala comercial, a SuperMeat não mais crescerá em laboratório, mas sim em máquinas de fazer carne", rebate Friedman. "Nada que as pessoas vão comer tocará qualquer espécie de equipamento laboratorial."
A SuperMeat conta com financiamento por parte de apoiadores privados, mas necessita desesperadamente de mais. Ela lançou uma campanha de crowdfunding na internet, com um vídeo promocional. Mas desenvolver a tecnologia exigirá somas vultosas, numa dimensão improvável de se alcançar unicamente com esse recurso público e espontâneo.
"As pessoas nos perguntam por que lançamos a campanha de crowdfunding, se o projeto exigia muito mais dinheiro [do que se consegue assim]", relata o porta-voz Friedman. "É para mostrar aos investidores que o público quer ter a supercarne. Quem contribuiu com o crowdfunding está, na verdade, adquirindo vales para futuras compras de SuperMeat. Isso vai mostrar aos investidores que as pessoas querem comprar nosso produto."
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