Estudo feito no Brasil muda o que a arqueologia sabia sobre origem do homem
Um estudo realizado na Serra da Capivara, no Piauí, pode mudar o modo como arqueólogos e cientistas interpretam as origens da humanidade. Realizada em parceria entre pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) e da britânica Universidade de Oxford, a pesquisa publicada na Nature nesta quarta-feira (19) mostra que macacos-prego do parque nacional são capazes de criar ferramentas, o que antes imaginava-se que só humanos fariam.
Com a descoberta, artefatos encontrados em sítios arqueológicos e considerados como prova de ocupação humana podem ter sido feitos, na verdade, por macacos. Logo no início do estudo, os cientistas citam: "o entendimento do surgimento da tecnologia molda nossa visão das origens da humanidade".
O estudo realizado no Piauí mostrou que macacos-prego da região deliberadamente usam pedras para conseguir frutos, cavar em busca de aranhas ou retirar líquidos com minerais de outras pedras. Quando batem as pedras em busca de líquido, surgem por acaso lâminas de pedra semelhantes aos antigos objetos afiados utilizados como ferramentas pelos primeiros humanos.
Eu fiquei bastante atônito. Fiz meu PhD pesquisando sobre ferramentas de pedra feitas por humanos. Eu aprendi como fazer estas coisas. Estava olhando para o material e parecia que foi feito por humanos", Tomos Proffitt, arqueólogo de Oxford e um dos autores do estudo
Cientistas normalmente utilizam as características de pedras lascadas com arestas afiadas para distinguir ferramentas de humanos de pedras que poderiam ter sido naturalmente quebradas em sítios arqueológicos. A novidade pode provocar uma revisão de muitos achados arqueológicos feitos até então.
Os achados mais velhos do tipo, com datações de 3,3 milhões de anos e encontrados no Quênia, podem ser revistos, segundo pesquisadores envolvidos. O estudo, no entanto, não deve desafiar completamente a história da evolução humana na África, já que muitos dos achados no continente apresentam contexto humano maior nos sítios do que apenas pedras lascadas.
O pesquisador brasileiro Tiago Falótico, do Instituto de Psicologia da USP, e o colega Eduardo Ottoni, seu supervisor, estudaram por anos o comportamento dos macacos-prego na Serra da Capivara - em julho, identificaram que os macacos usam ferramentas há ao menos 700 anos. Nos últimos três anos, aprofundaram a pesquisa com ajuda dos arqueólogos Michael Haslam e Tomos Proffitt, da Universidade de Oxford, além de outros pesquisadores.
As observações dos macacos-prego culminaram em coletas de pedras fragmentadas após o uso delas pelos animais e também em sítios arqueológicos da região – vale lembrar que a Serra da Capivara é um dos locais com maior concentração de sítios pré-históricos do mundo. Os objetos foram identificados com as mesmas características e formas das ferramentas humanas.
A conclusão dos autores do estudo pode mudar para sempre a arqueologia e a forma como vemos as primeiras civilizações humanas. Os pesquisadores apontam que, sem outras evidências, a produção de pedras lascadas não pode mais ser associada sozinha como sinal de presença de nossos ancestrais em uma determinada área – apesar de muitas das pedras lascadas achadas serem bem mais elaboradas do que as feitas sem intenção por macacos.
No entanto, ao menos uma característica segue restrita aos humanos. Embora produzam estas pedras lascadas, os macacos-prego não foram vistos as utilizando como um elemento cortante. Estes animais da região, no entanto, utilizam outras ferramentas, como varetas e as próprias pedras.
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