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Português quer provar que Einstein estava errado e medirá velocidade da luz

João Magueijo, físico português - Acervo pessoal
João Magueijo, físico português Imagem: Acervo pessoal

Fernando Cymbaluk

Do UOL, em São Paulo

07/12/2016 15h45

O físico português que desafiou Einstein imaginando que a velocidade da luz pode variar está mais próximo de testar se sua ideia radical está certa. João Magueijo celebra grandes avanços. O que era fruto da imaginação de um estudante rebelde virou uma previsão precisa, com o cálculo de um índice que pode ser colocado à prova. O recente estudo publicado na revista "Physical Review" golpeia o que parecia um inabalável pilar da física erguido por Albert Einstein, o de que a velocidade da luz é, e sempre foi, constante.

A imaginação foi o começo de tudo para Magueijo. Desde que foi descoberto o Big Bang, os físicos não conseguem explicar como o Universo chegou ao seu tamanho e estado atual. Imagine você que o Universo observável é do tamanho de uma sala, e que o Big Bang ocorre quando ligamos um aquecedor que está encostado na parede. O problema é que não teria dado tempo para que o ar quente (luz e energia) viajasse até todos os cantos da sala e se misturasse de forma homogênea. Mas e se a luz tivesse acelerado no primeiro arranque do cosmo? Foi isso que o físico pensou.

A ideia apresentada na década de 1990 significava contestar uma premissa que sustenta diversas teorias, como a da relatividade. Até então, todas as tentativas de explicação do cosmo nascente levaram em consideração a velocidade da luz como imutável.

Passados 20 anos, as propostas de Magueijo ganharam maturidade, na forma de previsões e construções de modelos matemáticos. 

A ideia de que a velocidade da luz poderia ser variável era radical quando proposto pela primeira vez, mas com uma previsão numérica, ela se torna algo que os físicos podem realmente testar. Se verdadeiro, isso significaria que as leis da natureza não foram sempre as mesmas que são hoje"

Para colocar a teoria à prova, seriam usadas imagens geradas por telescópios especiais que detectam a radiação cósmica de fundo em micro-ondas. Se imaginarmos os físicos que buscam decifrar o mistério do início do universo como arqueólogos, essa radiação pode ser comparada a uma espécie de fóssil da luz.

É possível ver índice ao qual Magueijo chegou bate com espectros dessa onda. O físico acredita que testes podem ser realizados a partir de 2022.

Einstein - Reprodução/Sciencemag - Reprodução/Sciencemag
Ao formular a teoria da relatividade, Albert Einstein estabeleceu como premissa que a velocidade da luz é constante. Esse postulado tornou-se um pilar da física moderna
Imagem: Reprodução/Sciencemag

Da imaginação para a calculadora

A radiação cósmica de fundo, detectável hoje, é o resultado de uma época em que o universo era quente e denso --apenas 380 mil anos após o Big Bang. Ela nos mostra flutuações que levaram à formação das galáxias. Há um índice que indica a intensidade dessas flutuações, que para a maioria das teorias fica em torno de 0,9. 

Trabalhando com Niayesh Afshordi, no Instituto Perimeter no Canadá, o físico chegou ao índice de 0,96478. O número previsto pelos cientistas incorpora a ideia de que as flutuações foram motivadas por uma velocidade variável da luz no início do universo, permitindo que as bordas distantes fossem conectadas à medida que o universo se expandia. A velocidade da luz teria caído à medida que a densidade do universo mudava.

“Foi um momento de transição do universo, com transformações dramáticas, brutais”, afirma o físico. Com isso ele quer dizer que, apesar de existirem ainda situações extremas, como fronteiras de buracos negros, em que as leis da física mudam, no universo atual as variações de velocidade que a luz pode sofrer são minúsculas.

Assim, a teoria da relatividade não cai por terra, mas teria de ser revista. O que, para Magueijo, pode ser visto como menos radical, é mais um ganho para a teoria.

“Não é que quero ser conservador, continua a haver mudança. Filosoficamente, é grande a diferença, mudamos fundamentos da física. Tecnicamente, não muito. O que se ganha é poder fazer contas”, diz.

Radiação cósmica de fundo - ESA - ESA
Radiação cósmica de fundo, registro de quando o universo tinha 370 mil anos detectado pela sonda espacial Planck
Imagem: ESA

“A inflação perde valor científico”

Além de desafiar Einstein, Magueijo teve de confrontar outra teoria, a da inflação. Criada na década de 1980 e com mais adeptos, a teoria inflacionária explica o início do Universo preservando as leis da física como a conhecemos. Para ela, o Universo estabilizou-se quando era incrivelmente pequeno. Após isso, passou por uma fase de expansão extremamente rápida, mas de maneira uniforme.

A teoria inventa um "campo de inflação", um conjunto de condições que só existiam na época.

Magueijo comemora o avanço com relação à teoria rival. “Temos vantagem experimental, de poder testar a teoria, coisa que a inflação não faz”, diz. Ele aponta como fraqueza da teoria inflacionária o fato de ela não prever um número concreto e, assim, não poder ser verificada experimentalmente.

“A da variação da velocidade da luz tem essa vantagem, possui aplicação concreta. A falta de previsibilidade está a minar a credibilidade científica da inflação”, diz.

Ver o que era considerado suicídio acadêmico se tornando uma teoria cada vez mais aceita anima Magueijo. “Há um grupo de Roma que mostra que velocidade da luz varia com a cor”, conta.

Ele não maldiz os primeiros passos, de dificuldades para se publicar artigos e de desconfiança dos pares.

Ideia nova tem que despertar dúvida, e o cientista que a propôs [tem que] ser capaz de responder as perguntas que surgem.” 

Assim, o português radical que desafia Einstein mostra ser fiel a uma outra de suas premissas. A de que para o avanço da ciência, como disse uma vez o físico alemão, a imaginação é mais importante que o conhecimento.