Não é só cerveja e shoyu: conheça outros alimentos que contêm milho
Não é só a cerveja e o shoyu produzidos no país que contêm milho. Muitos outros alimentos "made in Brazil" usam o grão como matéria-prima, segundo Luiz Antônio Martinelli, pesquisador do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo. Produtos que você certamente nem imagina.
Prepare-se para a extensa lista, que começa com missoshiru (típica sopa japonesa feita de soja) e passa pelo tempero em pó, molho bouillon, molho inglês e até a ração para cachorro.
Para fazer o levantamento, o pesquisador da USP analisou a presença e o nível de carbono presente em plantas do tipo fotossintético do milho. O grão, a cana-de-açúcar e pastagens produzem o carbono C4. Na sopa de missô brasileira, no tempero em pó, no molho inglês e na ração de cachorro, mais de 50% das moléculas de carbono desses produtos são do tipo C4.
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"Há indícios inclusive do uso do grão em nossa mostarda, que tem uma concentração significativa de C4 (44%). Mas a origem desse C4 precisa ser melhor investigada", afirma o pesquisador.
O carbono C4 também aparece, em menor proporção, na composição de maionese (14%) e de margarina (5%).
A alta concentração de C4 na composição do alimento, no entanto, não significa necessariamente que o produto é feito de milho. A alta concentração desse nível de fixação de carbono pode aparecer por "contaminação", ou seja, por produtos que carregam em si resquícios do milho. É o caso do frango brasileiro, que tem em média 70% de C4.
"O milho permeia a nossa cadeia alimentar de uma forma muito intensa. É a principal fonte de alimentação das galinhas e dos porcos", explica ele. Não à toa há uma alta concentração de C4 em nosso ovo (77%), assim como em nosso porco (64%), nosso presunto (65%), nosso salame (76%), nossa salsicha (75%) e atém nossa tilápia de criadouro (61%).
Como explica Martinelli, o milho --assim como a cana-de-açúcar e o capim-- absorve o gás carbônico da atmosfera e, sob a luz solar, realiza reações químicas que geram moléculas de açúcar contendo quatro átomos de carbono. Processo conhecido como fotossíntese C4. Já as frutas, verduras, leguminosas e quase todos os cereais --exceto o milho-- produzem açúcares com apenas 3 carbonos.
Outra diferença é que os açúcares das plantas C4 continuam a existir nos alimentos, mesmo depois de serem processados acrescenta o especialista, acrescenta o pesquisador, que descreve o processo de fotossíntese como uma "assinatura química da origem dos alimentos".
Por que tanto milho?
O preço, como cita Martinelli, é o principal motivo da predileção do uso do milho na alimentação de animais e mesmo na produção de itens brasileiros --como a cerveja. "Até porque a produção dessas plantas é favorecida pelo clima tropical, que garante a abundância do grão, consequentemente, o valor mais em conta", relata.
Só para se ter uma ideia, entre 2007 e 2017, o preço médio da soja era o dobro do preço médio do milho no país.
Martinelli também cita a ausência de uma regulação que controle o uso indiscriminado das plantas C4 nos produtos feitos no Brasil.
Em nota, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) informou que as especiarias, temperos e molhos são regulamentados pela Resolução RDC nº 276, de 22 de setembro de 2005. Mas, segundo o órgão, não existe restrição quanto a presença de grãos na elaboração dos produtos, desde que estejam devidamente declarados na lista de ingredientes na respectiva ordem de proporção.
Os ingredientes devem aparecer no rótulo conforme a sua participação na composição. Assim, se o milho é o primeiro elemento da lista, ele é a principal matéria-prima do alimento.
Apesar de não haver limites para os ingredientes na composição dos alimentos, no caso do shoyu, destaca o órgão, "um produto feito inteiramente com milho não poderia ser denominado de molho de soja, pois isto contraria os princípios gerais de rotulagem, por levar o consumidor ao erro quanto à identidade e natureza do produto."
Rei do milho
"O brasileiro é basicamente uma espiga de milho, um saco de capim ou um pé de cana-de-açúcar", brinca o pesquisador ao se referir a um estudo realizado pelo Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo que constatou um alto nível de C4 na unha da população. "Somos o rei do C4", completa ele.
"O nível desse tipo de carbono na unha dos brasileiros, principalmente daqueles que vivem nas grandes cidades, é uma das maiores do mundo. Muito maior do que a dos asiáticos e até do que a dos norte-americanos", relata Martinelli. Segundo ele, esse alto teor está relacionado ao consumo de produtos industrializados --a maioria deles com uma concentração significativa de C4.
Mas ainda não se sabe ao certo qual é o efeito disso na saúde dos consumidores. "Ainda assim, como há uma ligação desse carbono com produtos de origem animal e com alto teor de açúcar, podem contribuir com a alta dos níveis de colesterol e de diabetes. Mas são só suspeitas, que ainda precisam de confirmação científica."
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