Arqueólogos encontram cemitério indígena de 500 anos intocado na Amazônia
Arqueólogos do Instituto Mamirauá encontraram na Amazônia um cemitério com nove urnas funerárias de uma população indígena que pode ter habitado a região há cerca de 500 anos. Esta é a primeira vez que cientistas brasileiros localizam e escavam urnas funerárias da chamada Tradição Polícroma --conjunto de cerâmicas da pré-história sul-americana-- diretamente do solo.
"Urnas funerárias como as que foram encontradas são comuns pela Amazônia brasileira e nas partes amazônicas de países como Peru e Equador", afirma o arqueólogo do Instituto Mamirauá, Eduardo Kazuo Tamanaha. "Mas os pesquisadores costumam recebê-las da mão de moradores do local, que de fato encontram os artefatos e os retiram da terra. Agora, escavar e encontrar uma cova com as urnas dessa cultura, do jeito que estavam, e realizar todo o registro científico, é algo inédito."
Segundo o Instituto Mamirauá, a descoberta aconteceu em julho na comunidade Tauary, localizada na região central do Amazonas. As urnas estavam enterradas a uma profundidade de 40 centímetros da superfície, dentro de uma área de 4 m² nas imediações da escola comunitária. "Nós descobrimos mais de uma por dia, primeiro veio uma, começávamos a limpar, aí surgia outra ao lado, elas foram aparecendo como um efeito dominó", conta Eduardo Kazuo.
As condições do solo e a localização de fragmentos de cerâmica indicaram aos pesquisadores que aquelas era uma área possivelmente reservada ao enterro de corpos do povo que habitava ali.
A maneira como as urnas foram encontradas também chamou a atenção. "As urnas funerárias têm rostos desenhados, o interessante é que nenhum desses rostos estava 'olhando' para outro. Se uma urna foi enterrada com o rosto para cima, a urna ao lado dela estava 'olhando' para baixo, e a seguinte estava enterrada de lado. É como se elas não quisessem olhar uma para a outra. As urnas seguiam uma ordem, claramente elas foram enterradas daquele jeito e foi intencional", comenta o pesquisador.
Com base nas avaliações preliminares do material e na profundidade das covas, os arqueólogos acreditam que as urnas podem ter sido enterradas ao mesmo tempo. "Se fossem momentos diferentes de enterramento, as urnas estariam em alturas distintas. É como se tivessem escavado uma única cova e depositado uma urna ao lado da outra", aponta Eduardo Kazuo.
O conjunto das urnas arqueológicas também se diferencia pela variedade entre tipos e adornos nos acabamentos cerâmicos, como a pintura de cabeças humanas, formas animais e a presença ou ausência de bancos, onde as urnas podiam ser colocadas.
O motivo por trás desta organização e a presença desses detalhes ainda são desconhecidos, mas a equipe espera encontrar pistas a partir de análises mais aprofundadas em laboratório, de acordo com o instituto. "Esperamos ter essas informações a partir das próprias urnas, associando ao local em que elas estavam depositadas, a sua decoração, com a morfologia, o conteúdo que tinham dentro e juntar todos esses fatores em busca de algum sentido para elas estarem ali da forma que elas estavam", explica Kazuo.
Resquícios de civilização ainda mais antiga
A escavação também revelou sinais de uma sociedade ainda mais antiga que aquela que produziu as urnas funerárias. São fragmentos de cerâmica que pertencem a um grupo que habitou a mesma região, mas em um tempo diferente. "As urnas do Tauary são próximas ao ano 1500 depois de Cristo. Mas essa outra cerâmica encontrada aparenta ser muito mais antiga, com uma diferença de 40 centímetros de profundidade em relação ao período das urnas, o que indica uma passagem grande de tempo", conta.
"Nossa hipótese é que, quando o grupo escavou os buracos para depositar as urnas, eles encontraram esse material muito mais antigo, pegaram todo ele, espalharam e fizeram quase que um piso de cerâmica, colocando as urnas em cima dele. É uma cerâmica mais antiga que provavelmente não tem a ver com os antepassados deles", afirma o pesquisador do Instituto Mamirauá.
Na comunidade Tauary, existe um grande sítio arqueológico, cuja real extensão ainda está sendo levantada pelos arqueólogos. Em 2014, as primeiras urnas funerárias foram encontradas no lugar e, quatro anos depois, os pesquisadores retornaram para mais investigações.
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