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Por que fósseis não queimam, mas ainda assim podem se perder com incêndio

Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

03/09/2018 10h57

O fogo que consumiu o Museu Nacional no último domingo (2), no Rio de Janeiro, deve impor perdas à maior coleção de arte egípcia da América Latina e a um acervo importante da história e da ciência nacionais.

Mas como o fogo não consome material fossilizado, cria-se a expectativa de que joias da coleção como o esqueleto de Luzia, o ser humano mais antigo achado no Brasil, e restos de dinossauros estejam preservadas. O desabamento de partes da estrutura precária do museu histórico, no entanto, pode agravar a situação.

A esperança de que os fósseis do Museu Nacional estivessem intactos ganhou força depois de os bombeiros identificarem, em perfeitas condições, o maior meteorito encontrado no país, que abria o museu. Acontece que, embora resistentes ao fogo, os fósseis não são à prova de queda, especialmente se não estiverem armazenados de forma adequada.

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De acordo com relatório do museu, o prédio precisava de R$ 21,7 milhões para recuperar sua estrutura, comprometida desde 2016 com goteiras e infiltrações no telhado; gambás e morcegos no forro e ferragem exposta nas marquises.

A má conservação do edifício, no entanto, é anterior. Paleontólogo da USP, Max Cardoso Langer, disse ao UOL que tomou um “choque” quando visitou o museu para uma pesquisa no início dos anos 2000. “Nessa minha visita há mais de dez anos, os espaços estruturais em ambiente de coleção eram muito ruins”, conta. “A impressão na época foi chocante. Prateleira sem resistência, sem estrutura anti-incêndio, fiação elétrica sem boas condições.”

Essa falta de estrutura pode ter agravado os danos aos fósseis durante o incêndio, como os de pterossauros, os répteis voadores que são a especialidade do diretor do museu, o paleontólogo Alexander Kellner.

O que é um fóssil?

Langer explica que fóssil é um objeto que petrificou com o tempo. “Não se tem a matéria orgânica original, ela tem o formato, mas sua composição passa a ser mineral. É uma pedra, por isso não pega fogo.” Em alguns casos, aplica-se resina durante a restauração. “Nesse caso, o fogo pode atingir a resina e comprometer o fóssil, mas muitos não tem esse material.”

Nesse caso, é o desabamento que pode ter comprometido o acervo. A maioria dos fósseis fica sobre estantes dentro de caixas com etiquetas que informam a procedência do objeto: de onde vem e quem encontrou. “Saber a origem e a idade do fóssil é fundamental para qualquer estudo sobre o material.”

Langer acredita que a maioria dos pequenos fósseis foram triturados com a queda, e as caixas com a identificação foram carbonizadas. Mas ainda resta uma esperança para alguns objetos. “Muitos têm uma etiqueta pintada no próprio fóssil que remete ao número de coleção.” Esse número fica anotado no livro tombo, que atualmente conta com uma versão virtual. “Antigamente era um livro de consulta para identificar o fóssil.”

Museu Nacional abrigava fóssil Luzia, esqueleto mais antigo das Américas - Walter Neves/Biociências da U.S.P - Walter Neves/Biociências da U.S.P
Luzia: O maior tesouro do Museu Nacional era o fóssil do esqueleto mais antigo já encontrado nas Américas, com cerca de 12 mil anos de idade
Imagem: Walter Neves/Biociências da U.S.P
Com a má estrutura do prédio, o paleontólogo tem pouca esperança de que os objetos tenham se salvado. “Quando se compara com os museus na Europa ou Estados Unidos, a situação aqui era triste. Faltam recursos para cuidar, mas também falta conscientização da sociedade, autoridades, que não têm noção do quão importante é cuidar da estrutura.”

A esperança é encontrar o máximo de fragmentos para tentar restaurar. “É possível colar, mas a questão agora não é o que pode ter-se perdido, mas saber se é possível resgatar alguma coisa.”

Além dos pterossauros, o Maxakalisaurus topai, um dino hoerbívoro de 13 metros de comprimento, deve ter se perdido no desastre. Mas a maior perda, diz o paleontólogo, é Luzia, o humano mais antigo achado no Brasil. Ela viveu em Minas há cerca de 12 mil anos.

Sua descoberta levaram os antropólogos brasileiros a defenderem a existência de duas ondas migratória que ocorreram em direção às Américas no fim da Era do Gelo. É que Luzia se parecia muito mais com aborígenes australianos do que com índios modernos. “Dentro dos fósseis, da arqueologia, o crânio da Luzia é emblemático.”

Meteorito Bengedó

Embora a direção do Museu Nacional e o Corpo de Bombeiros tenham cautela para falar sobre itens que podem ter resistido ao incêndio do último domingo (2), já se sabe que está intacto um dos principais atrativos do acervo: o meteorito Bendegó, o maior do Brasil.

Por ser de ferro maciço, o meteorito pode suportar temperaturas superiores a 10 mil graus centígrados, de acordo com o geólogo Renato Cabral Ramos. "Os meteoritos, possivelmente, tenham sido as únicas peças a resistir a essa tragédia. O Bendegó está intacto. Mas as pesquisas realizadas a partir dele, nas últimas décadas, se perderam com a biblioteca", afirmou.

O meteorito Bendegó está exposto no Museu Nacional desde 1892. Considerado um dos objetos espaciais mais estudados do mundo, ele tem origem incerta, segundo os pesquisadores.