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ChatGPT já escreve leis e participa de debates. Isso é bom para a política?

Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Imagem: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Redação

RFI

26/04/2023 15h48

O bot (robô) de Inteligência Artificial (IA) ChatGPT passou em exames escolares, escreveu poesias e foi implementado em redações. Agora, políticos de todos o mundo procuram utilizar seus "serviços", mas os especialistas alertam contra a rápida adoção de uma ferramenta também famosa por fabricar "fatos". O chatbot, lançado em novembro do ano passado pela empresa norte-americana OpenAI, rapidamente se tornou o centro das atenções na política, especialmente como uma forma de marcar pontos. 

Recentemente, o primeiro-ministro japonês Fumio Kishida foi golpeado diretamente pelas argumentações de um bot quando respondia a algumas perguntas inócuas sobre a reforma do sistema de saúde, feitas por um deputado da oposição.

Sem o conhecimento do primeiro-ministro, seu adversário havia gerado as perguntas com o ChatGPT. Ele também gerou respostas que, segundo ele, eram "mais sinceras" do que as de Kishida. O premiê japonês rebateu dizendo que suas próprias respostas tinham sido "mais específicas".

A chefe de um sindicato francês, Sophie Binet, seguiu a tendência quando avaliou de forma irônica um discurso recente do presidente Emmanuel Macron como um texto que poderia ter sido escrito pelo "robô do ChatGPT".

Mas o bot também tem sido usado para escrever discursos e até mesmo ajudar a redigir leis. "É útil pensar no ChatGPT e na IA generativa em geral como um produtor de clichês", disse David Karpf, da Universidade George Washington, nos EUA, durante um recente painel online. "A maior parte do que fazemos na política também é geração de clichês", argumentou.

"Valor agregado limitado"

Em nenhum outro lugar do globo, no entanto, o entusiasmo pela arrogância do ChatGPT foi tão grande quanto nos Estados Unidos. No mês passado, a congressista Nancy Mace fez um discurso de cinco minutos em um comitê do Senado enumerando os possíveis usos e danos da IA, antes de dizer que "cada palavra" de seu texto havia sido gerada pelo ChatGPT.

No entanto, um político norte-americano, Barry Finegold, já havia ido além, declarando em janeiro deste ano que sua equipe havia usado o ChatGPT para redigir um projeto de lei para o Senado de Massachusetts. O bot teria apresentado ideias originais para o projeto de lei, que tem como objetivo, justamente, controlar o poder dos chatbots e da IA no país.

Anne Meuwese, da Universidade de Leiden, na Holanda, escreveu, em uma coluna para a revista jurídica holandesa RegelMaat, na semana passada, que ela havia realizado um experimento semelhante com o ChatGPT e que também descobriu que o bot havia introduzido ideias originais no documento.

Mas, embora o ChatGPT fosse, até certo ponto, capaz de gerar textos jurídicos, ela escreveu que os legisladores não deveriam se atropelar para usar a ferramenta. "Além de ainda não haver muita clareza sobre questões importantes, como impacto ambiental, parcialidade e ética da rmpresa OpenAI, o valor agregado também parece limitado por enquanto", escreveu.

Robôs sim, mas à (extrema) direita ou à esquerda?

No entanto, o valor agregado poderá ser mais óbvio e útil na parte inferior da cadeia alimentar política, onde os funcionários das campanhas enfrentam uma esteira de tarefas repetitivas. Karpf sugeriu que a IA poderia ser útil para gerar, por exemplo, e-mails solicitando doações - mensagens necessárias que não foram planejadas para serem "obras-primas".

Isso levanta a questão de saber se os bots podem ser treinados para representar um ponto de vista político. O ChatGPT já provocou uma tempestade de controvérsias por causa de seu aparente viés liberal — o bot inicialmente se recusou a escrever um poema elogiando Donald Trump, mas produziu alegremente dísticos para seu sucessor como presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.

O magnata bilionário Elon Musk diz ter enxergado uma oportunidade no setor, no entanto. Apesar de advertir que os sistemas de IA poderiam destruir a civilização, ele prometeu recentemente desenvolver o TruthGPT, uma ferramenta de texto de IA sem o "preconceito liberal" percebido. Seria possível um robô "em cima do muro", sem cores políticas evidentes?

Talvez ele não precisasse ter se preocupado. O pesquisador neozelandês David Rozado já fez um experimento reequipando o ChatGPT como RightWingGPT — um bot que aceita valores familiares, economia liberal e outros gritos de guerra da direita clássica. "De forma crítica, o custo computacional de experimentar, treinar e testar o sistema foi inferior a US$ 300", escreveu ele em seu blog Substack em fevereiro.

"Inteligência Artificial marxista"

Para não ficar para trás, a esquerda tem a sua própria "IA marxista". O bot foi criado pelo fundador do site de humor satírico belga Nordpresse, que usa o pseudônimo Vincent Flibustier. Ele disse que seu robô apenas envia consultas ao ChatGPT com a ordem de responder como se fosse um "sindicalista irritado".

A maleabilidade dos chatbots é fundamental para seu apelo, mas anda de mãos dadas com a tendência de criar fakenews, tornando os geradores de texto de IA aliados potencialmente perigosos para a classe política.

"Você não quer ficar famoso como o consultor político ou a campanha política que estragou tudo porque decidiu que uma IA poderia fazer [algo] por você", concluiu Karpf.

(Com AFP)