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Aquecimento do mar provoca migração de espécies e cria novos ecossistemas

Wu Lixin/Xinhua
Imagem: Wu Lixin/Xinhua

Carl Zimmer

10/09/2015 11h19

No Maine, Estado no extremo nordeste dos Estados Unidos, as lagostas florescem. A Comissão de Pesca Marinha dos Estados Atlânticos informou no mês passado que os cardumes chegaram a um recorde de expansão.

Descendo o litoral, no entanto, a história é diferente. No sul da Nova Inglaterra, a lagosta despencou para o nível mais baixo já registrado, tirando do negócio muitos de seus pescadores.

A população de lagosta aumenta e cai por diversos motivos. Porém, em seu novo relatório, a Comissão destacou um fator que provavelmente está motivando as mudanças recentes: o oceano está se aquecendo.

No extremo norte da área em que a lagosta vive, temperaturas mais elevadas podem estar acelerando o metabolismo, levando à explosão populacional. Porém, na ponta sul, a água pode estar ficando quente demais, colocando os animais em uma condição de estresse extremo.

As lagostas da Nova Inglaterra fazem parte de uma tendência global. Os oceanos vêm aquecendo nas últimas décadas, em grande medida por causa dos gases do efeito estufa, que aprisionam o calor, liberados pelo homem na atmosfera. Muitas espécies marinhas do mundo inteiro reagiram, mudando-se para águas mais confortáveis.

Segundo estudo de 2013, as espécies marinhas estão ampliando os limites de seu habitat no sentido dos polos, afastando-se do Equador, a uma velocidade média de sete quilômetros por ano. É uma velocidade dez vezes maior do que aquele com que espécies terrestres se deslocam.

Para compreender como a temperatura em elevação vai mudar a vida no oceano, cientistas estão desenvolvendo modelos computacionais para entender onde as diversas espécies vão terminar. No presente momento, os modelos são simples, mas a imagem que produzem é bastante clara.

O aquecimento global vai reembaralhar os ecossistemas marinhos em uma escala não vista há milhões de anos. Os biólogos marinhos ainda não sabem dizer como serão os novos habitat.

"Quando se coloca um monte de espécies num liquidificador, nunca se sabe o que irá sair", disse Malin L. Pinsky, biólogo marinho da Universidade Rutgers.

A tentativa mais ambiciosa de mapear o futuro da vida oceânica foi publicada em 31 de agosto em "Nature Climate Change". Uma equipe internacional de cientistas analisou os habitat atuais de quase 13 mil espécies de peixes, invertebrados e outros organismos marinhos.

Os pesquisadores computaram as temperaturas mais quentes e frias nas quais cada espécie foi observada. Se o futuro transcorrer como se deu no passado, avaliaram os cientistas, cada espécie vai provavelmente se mudar para permanecer em seu "nicho térmico".

Segundo o estudo, a jornada será mais fácil para alguns animais do que para outros. Alguns serão capazes de nadar pelo mar aberto para escapar de águas quentes demais. Outros podem achar o caminho bloqueado por massas de terra ou mares rasos.

Os cientistas também compararam a biodiversidade projetada de cada região do oceano em 2100 com a vista hoje em dia. Os trópicos vão perder uma parcela substancial de suas espécies, concluíram. E não veremos novas espécies emigrando para a região para ocupar seu lugar.

À medida que mais espécies se afastam do Equador, elas vão entrar em novos ecossistemas mais próximos dos polos. Essa migração produzirá combinações de espécies sem precedentes nos últimos milhões de anos.

Jennifer Sunday, bióloga marinha da Universidade da Colúmbia Britânica que não participou do novo estudo, disse que ele representava um progresso importante na compreensão do futuro do oceano. "Eles deram um grande passo ao manter o registro de onde as espécies estão", ela assegurou.

Ela alertou que os cientistas ainda precisam entender muita coisa sobre a influência da temperatura marinha sobre seus habitantes. Em um estudo que ela e outros colegas publicaram na edição de setembro de "Ecology Letters", constatou-se que espécies com habitat pequenos podem sobreviver em temperaturas que variam bastante em comparação às dos habitat atuais.

Se os animais fossem retidos apenas pela temperatura, poderiam ser encontrados a 1.600 quilômetros ou mais dos habitat presentes. Em vez disso, "eles são limitados pelo habitat, pela competição e todas essas pequenas coisas que os mantêm em áreas menores", afirmou Jennifer.Jorge García Molinos, principal autor do novo estudo, concordou que as projeções sobre o futuro dos oceanos vão melhorar conforme os cientistas acrescentarem uma maior complexidade biológica. "Nosso modelo é bom para um primeiro retrato."

É difícil prever o que a chegada de novas espécies às regiões de maiores latitudes do oceano fará com aqueles ecossistemas. Algumas espécies recém-chegadas podem estar mais bem adaptadas a águas quentes, superando as nativas. Outras podem ser extintas. "Creio se tratar de um jogo sobre vencedores e perdedores", declarou Molinos.

Pinsky, que não participou do estudo, também vê sinais agourentos para a humanidade na pesquisa.

"Muitas espécies estão se afastando dos trópicos, e muito provavelmente isso terá implicações sobre a segurança alimentar. Em muitos desses países, os frutos do mar são uma fonte muito importante de nutrição. A mudança climática pode produzir um vazio gritante nos oceanos."