Com Marília Medalha, 'Maria Esmeralda' costura nostalgia em álbum de rap
22/10/2024 18h02
Longe dos estúdios há mais de três décadas, a cantora Marília Medalha voltou a soltar a voz e virou estrela de um dos melhores álbuns de rap brasileiro lançados em 2024.
Aos 80 anos, uma das artistas mais emblemáticas da MPB declama um poema muito pessoal logo na abertura do disco "Maria Esmeralda", assinado em coletivo por Thalin, Cravinhos, Leo VCR, Pirlo e iloveyoulangelo.
Marília Medalha venceu Caetano Veloso e Gilberto Gil, em 1967, na disputa do terceiro Festival de Música Brasileira da TV Record, ao cantar "Ponteio". Ela também foi parceira de Vinicius de Moraes e atriz revelação no musical "Arena Canta Zumbi". Esses feitos, no entanto, não a credenciaram no panteão da MPB.
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O poema faz referência aos desejos e limitações de tantas mulheres das gerações passadas, o que diz muito sobre a trajetória dela própria - e o que inspirou os jovens MC's e produtores que se conheceram em São Paulo.
Os amigos estavam ouvindo toda a produção da música brasileira nos anos 1960, inclusive Marília Medalha, quando ela própria cruzou o caminho - eles contam isso e outros bastidores do álbum com exclusividade ao TOCA.
"Infelizmente, a Marília é uma pessoa que foi meio deixada de lado. A gente estava ouvindo muito, foi mais ou menos na mesma época", conta Thalin.
Apesar da produção atualíssima, que vai do boombap ao trap, o que se ouve é uma narrativa repleta de imagens fragmentadas sobre relações e sentimentos de outras épocas - a maior parte escrita por Thalin, um MC de 22 anos, com flow letárgico e rimas um tanto psicodélicas
"Não é uma crônica de fato. Maria Esmeralda é uma personagem fictícia, mas que também não é inspirada em uma pessoa só. Acho que todo mundo aqui meio que nas suas próprias avós", conta.
Samples de músicas de Thiago França, Roy Ayers e Chico Buarque (ficando apenas em alguns exemplos) se mesclam a trechos de novelas e filmes num digno álbum conceitual, que ganhou elogios do produtor Daniel Ganjaman e de B. Negão.
Sequestrados no estúdio
Desconhecidos até pouco tempo atrás , Thalin, Leo VCR, Pirlo, iloveyoulangelo e Cravinhos sequer tinham pensado em fazer um álbum juntos.
"Maria Esmeralda" só surgiu quando um amigo os trancou sem querer no estúdio. "A gente se olhou dentro de uma sala, com tudo que a gente precisava, sem hora para ir embora. Bom, vamos fazer música, óbvio", conta Cravinhos.
As horas de ócio em que ficaram trancados renderam a primeira música feita coletivamente e até um clipe gravado numa handycam.
"Lince" foi feita com camadas de samples e efeitos sonoros, criando uma atmosfera de filme antigo, em preto e branco - o que serviu de fio condutor para as novas experimentações no estúdio.
"Criamos um cenário para emergir criativamente e consequentemente tudo o que a gente fazia, tanto letra quanto de estética e visual", lembra Cravinhos.
"Quando lançamos, uma pessoa virou e disse que o álbum soava como uma homenagem. Uma homenagem ao hip hop, ao rap, às coisas antigas, às histórias das casas de vó. Parece que você fica nostálgico. Mas isso é meio abstrato. Acho que cada um sente isso da sua própria maneira."