Dentre os tantos muros que se colocaram no caminho político da mulher que por anos foi considerada a mais poderosa do mundo, os decorrentes das desigualdades de gênero estão entre os de mais difícil superação, segunda a própria Angela Merkel.
A primeira líder a ocupar o mais importante cargo da Alemanha deixa o cargo quase 16 anos depois com aprovação de 90% da sociedade. Apesar de ter sido elogiada pelas diversas crises que enfrentou, há hoje debate sobre o espaço das mulheres na esteira de seu período no poder.
Alemã oriental divorciada e sem filhos, Merkel enfrentou barreiras para se posicionar na política inclusive em seu partido, o conservador União Democrata Cristã (CDU). Hoje, críticos atacam de seu modo austero de vestir ao apoio considerado 'discreto' a políticas para mulheres.
Um dos terrenos nos quais as disparidades de gênero permanecem após a 'era Merkel' é no da disputa política. Nessas eleições, das mais de 6 mil candidaturas apresentadas somente um terço é de mulheres. O parlamento — Bundestag — é formado por maioria masculina.
Foi comum nos últimos anos presenciar reuniões internacionais nas quais Merkel era a única mulher. Xingamentos de caráter misógino por figuras como Silvio Berlusconi, embates com Donald Trump, ex-presidente dos EUA e duras negociações com Vladimir Putin, líder russo, estiveram na agenda da chanceler.
Pragmática e de postura majoritariamente conciliadora, Merkel sempre evitou posicionar-se como feminista, o que viria a fazer apenas recentemente em um evento com a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie.
Em 2020 o governo de Merkel lançou plano nacional para a promoção da igualdade de gênero chamado de Forte para o Futuro. Dentre as nove metas está a implementação de cotas de participação das mulheres na gerência de empresas e partidos políticos, por exemplo.
De acordo com a imprensa alemã, a chanceler sempre nomeou mulheres para cargos-chave de sua administração e assessoramento e manteve diálogo com lideranças. O Ministério da Defesa esteve sob a liderança de mulheres várias vezes nos últimos anos, algo até então inédito na história alemã. Atualmente, o cargo é ocupado por Annegret Kramp-Karrenbauer (foto).
Merkel deixa o poder com dificuldades para emplacar um nome para sucedê-la. O bloco conservador, a que pertence, obteve o pior resultado de sua história no último domingo — mas ainda pode tentar formar governo.