Mulheres vivem suas revoluções pessoais enquanto o mundo parou
Por Nathália Geraldo
Revoluções pandêmicas
Se reorganizar, conquistar, dar um passo em direção ao novo. A pandemia nem de longe pode ser vista como um momento inspirador, mas, para cinco mulheres entrevistadas por Universa, o ano em que o mundo se isolou também foi marcado por revoluções pessoais. Aqui, elas contam suas transformações.
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Cris escreveu um livro
Márcio Rodrigues
Cris Guerra, 50, realizou um desejo antigo: publicou um livro infantil. Ela conta que o livro já estava dentro dela, mas não vinha à tona. Quando o isolamento começou, ela se viu muito chorosa e só conseguia fazer suas colunas para revista e rádio. Após escrever a 4ª capa de um livro infantil e assistir a um documentário sobre masculinidade, nasceu "O menino que engoliu o choro".
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"Sem dúvida, também existia um menino engolindo o choro dentro de mim. Numa madrugada produtiva, entrei em contato com várias dores e o livro nasceu. Foram mais três dias para existir por inteiro. E eu sinto que a pandemia ajudou a colocá-lo no mundo, foi um pouco autora dele. Aprendi que as situações-limite podem ser muito produtivas, e não apenas em um sentido da produtividade."
Cris Guerra, escritora
O que o isolamento me trouxe
Cris conta que a pandemia a ensinou a ficar próxima do silêncio. "Em setembro, tive perda auditiva do ouvido direito, com zumbido, tontura. Isso me fez olhar para a saúde e me perguntar o que eu não estava querendo ouvir. E fiz 50 anos nestes tempos, meu envelhecimento me fez entender que temos uma criança sempre para gente."
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Pamella está sem o cabelão
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Pamella Moreno, 30, cortou os fios em agosto, curtinhos como nesta foto. "Queria me encarar sem a feminilidade que o cabelo traz", diz. E em dezembro, o cabeleireiro perguntou: "Chegou a hora?". Ela sentiu que sim, era hora era adotar a cabeça raspada. Se não fosse a pandemia, não teria acontecido. O isolamento trouxe coragem para mudar.
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Quem não ficou de frente consigo mesma neste momento não viveu a pandemia direito. Eu 'trintei', me olhei no espelho e percebi que meu cabelo era uma muleta. Costumava brincar que as pessoas gostavam mais dele do que de mim. Mas eu tinha zero apego. Sempre desejei raspar.
Pamella Moreno, artista plástica
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O que o isolamento me trouxe
A coragem de mudar ganhou urgência. "A quarentena fez um reboliço na minha vida: comecei como tatuadora em SP e vou me mudar para o RS para estudar artes plásticas", conta. "O pontapé foi a sensação de que preciso fazer as coisas acontecerem."
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Aline agora anda de carro
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Isolamento é regra na pandemia, mas para quem precisa se locomover, tudo mudou. Em São Paulo, Aline Monteiro, 34, de repente se viu sem ter como visitar a mãe na Baixada Santista. "Passei a pensar em carro e depois de pesquisar muito pela internet, comprei!", conta. Mas faltava uma coisinha: reaprender a dirigir. Ela ligou para autoescola e agendou as aulas para a hora do almoço.
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Durante a pandemia, uma amiga me contou que comprou um carro e que estava reaprendendo a dirigir. Sabe quando você vê alguém próximo fazendo alguma coisa legal e percebe que também consegue?
Aline Monteiro, consultora de comunicação
O que o isolamento me trouxe
A liberdade de ir e vir, conceito tão em xeque, chegou com o carro próprio e a segurança de pilotá-lo. "A meta era ir para a casa da família do meu namorado no Natal. Superei o trauma de duas reprovações para tirar carteira de motorista e consegui! Agora, faço o carro trabalhar para mim."
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Talita mudou de estado
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Talita Aquino, 34, dividia apartamento com a irmã em São Paulo e sonhava com o Nordeste. Ela conta que 2020 foi um ano muito ruim sem contato com amigos. Junto da irmã, alugou uma quitinete em Aracaju para ficar perto da família e, com o trabalho ainda remoto, não tem prazo para voltar.
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Vim visitar minha família em Aracaju nas festas de final de ano já estava decidida a ficar, nem comprei passagem de volta. Trouxe até meu cachorro, o Farofa. Meus pais, minhas irmãs e sobrinhos moram aqui e sentia muita falta deles.
Talita Aquino, costumer success manager
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O que o isolamento me trouxe
Para Talita, a pandemia abriu uma janela no tempo, em que ela pode estar com a família e manter a carreira ao mesmo tempo. "Meu pai vem tomar café quando termina o expediente, minha mãe às vezes trabalha ao meu lado. Moro em frente a um rio, e vejo os barquinhos passando na janela."
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Bianca mudou de profissão
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Até há pouco tempo, Bianca Coelho, 25, trabalhava em uma empresa de tacógrafo. Sempre que precisava manobrar caminhão, era ela que assumia o volante. Em janeiro, conta que sua vida mudou completamente. Ela foi chamada para trabalhar na Klabin e fazer parte da frota da fábrica em Betim (MG). "Sou a primeira caminhoneira da minha família, do meu bairro e da empresa."
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Meu sonho desde pequena era dirigir caminhão, via nas ruas e achava lindo. Com 18, tirei carteira de motorista para carro e, com 21, a categoria D. Mas nenhuma empresa me dava oportunidade, justamente por ser mulher. Uma vez, eu e um amigo tentamos uma vaga, os dois sem experiência. Não fui contratada e ouvi que não daria conta do serviço.
Bianca Coelho, caminhoneira
O que o isolamento me trouxe
Mudar de emprego durante um ano de tantas dificuldades foi fruto da perseverança. "Minha rotina é pegar as viagens bem cedo, circular no estado mesmo, entregar as cargas. Com essa mudança na minha vida, digo para outras mulheres que querem ser caminhoneiras para não desistirem. Tem serviço."