Sex and the city: Samantha teve que correr muito para Fleabag poder voar
A notícia está em toda parte: Sex and the City estará de volta para uma nova temporada na HBOMAX. Só que mais que empolgação e expectativas para sabermos como estão estas personagens que influenciaram toda uma geração de mulheres, o que todo mundo quer saber é: existe Sex and the City sem Samantha Jones? Sex and the City, sem sex.
Pois é, cara leitora, é isso mesmo. A atriz Kim Cattrall já mandou avisar há alguns anos, enquanto se especulava a produção de um terceiro filme inspirado na série, que não reviveria o papel de Samantha. Muita gente usa isso pra alimentar aquele velho fetiche social de rivalidade feminina, mas a questão aqui é outra: Kim declarou que ao chegar aos 60 anos resolveu que era o momento de encerrar este ciclo na sua carreira. Quando uma mulher diz não, cabe a toda sociedade respeitar sua escolha.
Eu devia ter uns 19,20 anos, logo no início dos anos 2000, quando ouvi falar de Sex and the City a primeira vez numa revista de moda. Sempre fui "a loca das séries" então corri para a revista da TV a cabo para descobrir quando passava essa série que representava tanto a vida da mulher moderna. Eu era uma jovem adulta do subúrbio do Rio, adolescente de igreja, namorinho de portão que não sabia era nada sobre o mundo ou da própria sexualidade.
Samantha Jones me chocava. A liberdade sexual dela por vezes assusta quem foi reprimido por toda a vida. Por mais que ela me deixasse de olhos arregalados em muitos episódios, eu a admirava. Era importante demais ver que existiam mulheres (mesmo que na ficção) que tinham a si mesmas como grande amor e sua própria felicidade como foco na vida.
A abertura da série era um anúncio da coluna da Carrie que dizia que ela conhecia um bom sexo, mas, a real é que, quem deu aulas sobre liberdade sexual por todas as temporadas da série (e nos 2 filmes) não foi a Carrie Bradshaw. Foi, sim, Samantha Jones.
Muito antes de amarmos a franqueza de Phoebe Waller-Bridge em Fleabag, Samantha Jones já estava praticando o seu direito de ter uma vida sexual plenamente ativa (inclusive se apaixonando por padres por aí...) e priorizando o seu prazer. Ela gostava de sexo e não tinha vergonha nenhuma disso, mesmo sendo incompreendida pelas suas próprias amigas que muitas vezes recriminavam seu comportamento. Carrie, Charlotte e Miranda eram obcecadas demais pela aprovação masculina para compreenderem uma mulher que se importava com suas próprias necessidades.
Samantha popularizou não só o uso dos vibradores, mas também a noção de que sexo tem que ser prazeroso para ambas as partes envolvidas — porque, se não for assim, não vale a pena, viu garotas?
Sex and the City foi ao ar a primeira vez em 1998 e (re)assistindo aos primeiros episódios, me impressionou ver como a liberdade sexual da Samantha é, talvez, a única coisa que tenha "envelhecido bem" na série.
Tomada pela nostalgia, ao rever o segundo episódio da primeira temporada vi Carrie, Miranda e Charlotte simplesmente não conseguindo compreender que Samantha tivesse uma autoestima saudável.
Enquanto as três olhavam para as modelos nas capas de revistas e depreciavam a si mesmas, Samantha reconhecia um vestido igual ao seu. Ela não se intimidava com convenções sociais.
Enquanto Carrie, Miranda e Charlotte viviam sofrendo por uns homens meio bosta, Samantha estava sempre cuidando da própria felicidade. Era honesta sobre si e seu prazer. 'Tento de tudo, pelo menos uma vez', dizia. Defendia sua libido (e suas amigas) acima de todas as coisas. E tá errada?
"Se eu me preocupar com o que falam sobre mim, nem saio de casa", dizia.
Samantha correu muito para que Fleabag pudesse voar. Mas, mesmo passados 20 anos da estreia de Sex and the City, a sociedade ainda se choca ao ver uma personagem feminina em controle da sua própria vida sexual como a criada por Phoebe Waller-Bridge. O sexo feminino continua sendo um grande desconhecido na televisão.
Talvez seja este o grande incômodo gerado pelo anúncio dessa nova temporada.
Sem a autonomia de Samantha e suas lições de sexualidade e amor-próprio, o que podemos esperar de uma série protagonizada por três mulheres heterossexuais brancas da elite de Nova York em 2021?
Bom, o jeito é aguardar para ver se finalmente a influência de Samantha bateu nas suas amigas da ficção como bateu nas fãs da série.
*Carla Lemos é feminista, carioca e produtora de conteúdo há mais de 15 anos. Observadora atenta das mudanças de comportamento das mulheres na sociedade, Carla comanda o podcast PRIMAS e é autora do livro "Use a Moda A Seu Favor". Em 2021, lançará seu novo livro, "As Mentiras que te Contaram Sobre Ser Mulher"
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