Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Projota no BBB: o curioso caso do homem que não era para casar
O ideal seria começar esta coluna ensinando a fazer arroz. Mas, antes, eu teria que explicar como aprendi e eu, na verdade, nunca tive ninguém que me ensinasse. Aprendi a fazer arroz instintivamente, olhando, observando, assim como todos as demais comidas tradicionais do brasileiro.
Aprendi porque sentia que um dia teria que me virar sozinha, sob esse peso de aprender a cozinhar para preparar a comidinha do marido para quando casarmos. Provavelmente você, mulher, também aprendeu muitas coisas sem nem ao menos ser ensinada.
No episódio deste domingo no Big Brother Brasil, em meio a um breve desentendimento sobre porque só haviam deixado arroz queimado para Juliette, uma voz máscula me chamou atenção: "Se alguém me ensinar, eu faço", bradou Projota.
Não que ele fosse o único ali a não saber cozinhar arroz, vozes femininas também mostraram pouca familiaridade com a coisa. Thais, por exemplo, embora tenha afirmado nunca ter feito arroz "gostoso", acendeu o fogão e se prontificou a tentar.
Pois bem, as mulheres do programa é que estão sendo agredidas nas redes. Afinal uma "mulher" acima dos 9 anos (sim, a sociedade quando convém rouba a infância, sim) não saber fazer arroz é inaceitável. Mas vamos pensar por outro lado?
É inadmissível que um homem aos 34 anos nunca tenha vivido a experiência de fazer um arroz. Como esse homem conseguiu casar minha gente? ( leia com ironia). Esse assunto deveria gerar riso coletivo, justamente hoje, Dia Internacional das Mulheres. E seria cômico dizer que, enquanto estou aqui escrevendo, o arroz está no fogo?
Me virando entre um pouco mais de água, fogo baixo e algumas tecladas para que esse texto traga um pouco de sentido à afirmação quase infantil do Projota de que faz o arroz, mas alguém vai ter que ensinar.
Como deixar com que essa preciosidade passe despercebida? Não aqui, não comigo!
"Economia do cuidado": você já ouviu falar?
Talvez você nunca tenha ouvido falar da economia que praticamente sustenta muitas outras. A economia do cuidado nada mais é que tornar visível o trabalho invisível de milhares de mulheres no mundo.
O cuidado envolve muitas horas e tempo para lidar com a casa e com pessoas: dar banho e fazer comida, faxinar, comprar os alimentos que serão consumidos de acordo com um orçamento previamente calculado, cuidar das roupas (lavar, estender, passar e guardar), prevenir doenças com boa alimentação e higiene em casa e remediar quando alguém fica ou está doente, fazer café da manhã, almoço, lanches e jantar para os filhos, educar e posso seguir por horas com a lista. Entre os afazeres está: FAZER ARROZ (risos).
Uma mulher após o parto, chega a trabalhar 650 horas em apenas 6 meses apenas com a amamentação. Ao todo, mulheres gastam em média mais de 61 horas por semana em trabalho não remunerado no Brasil, segundo o IBGE.
É um esforço que equivale a 11% do PIB. Mais do que qualquer indústria. E mais do que o dobro do que todo o setor agropecuário produz.
O trabalho de cuidado das mulheres equivaleria a US$ 10,8 trilhões. Apenas 4 economias ficariam acima desse montante, segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho. Vocês tem ideia do que é isso?
Sinto em informar que enquanto eu escrevia essas informações e me sentia empolgada em provar que posso ser mais útil do que a sociedade diz, e eu acabei queimando o arroz, e me senti fracassada.
Falar de um homem que é "pai e casado" aos 34 anos e revela não saber fazer um arroz é necessário para que você fique de olho nos seus pretendentes e não dê oportunidades para quem não ajuda nas tarefas. Em segundo lugar, um homem que canta sobre desconstrução se mostrar tão construído em cima de estereótipos do machismo não é mais aceitável na nossa sociedade.
Projota será ridicularizado por uma parcela de mulheres que sabe exatamente o que é um julgamento idiota que nos atrela à responsabilidades como fazer o arroz. Ele será ridicularizado uma única vez, como sempre fomos a vida inteira.
Embora eu esteja triste porque queimei meu arroz enquanto fazia este texto, eu fico aqui me perguntando porque nem mesmo aquela velha fala clichê "Não se fazem mais homens como antigamente" pode ser usada. Nunca fizeram dos homens o que deveria ser feito.
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