Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Caso Klein: Violência sexual como negócio de família?
Nos últimos dias, Universa publicou uma nova leva de reportagens em que mulheres denunciam de forma ainda mais detalhada como funcionaria o esquema de abusos, violência e exploração sexual comandado pelo empresário Saul Klein, filho do fundador das Casas Bahia, Samuel Klein.
Uma das matérias traz a terrível história de uma jovem de 22 anos que no papel de "uma das preferidas do excêntrico milionário" teria sofrido estupro, torturas físicas e psicológicas durante anos até que em 2020, em profundo sofrimento psíquico, tirou a própria vida.
Outra reportagem aponta que Saul teria "comprado" o silêncio de possíveis vítimas para que não seguissem com processos na Justiça e traz um vídeo em que ele diz ter "namorado" uma menina de 17 anos sem saber que ela era menor de idade.
No entanto, 32 mulheres denunciam atualmente Saul Klein por uma série de crimes sexuais que seriam sustentados por uma estruturada rede envolvendo aliciadores, médicos, funcionários, chantagens, muito dinheiro e um ensurdecedor silêncio por parte da mídia e do Judiciário.
Padrões muito semelhantes foram denunciados por mulheres à Agência Pública em investigação publicada no início de abril, em relação ao pai de Saul, Samuel Klein, que morreu em 2014 com sua imagem intocada de 'rei do varejo'. Samuel teria mantido durante décadas um esquema de exploração sexual de crianças e adolescentes dentro das Casas Bahia e nos mesmos imóveis da família apontados pelas vítimas de Saul. E, segundo os depoimentos dados à Pública, Samuel também teria abafado os crimes firmando acordos judiciais e se beneficiado da morosidade de inquéritos criminais, nos quais se esquivou das citações judiciais, sem que fossem tomadas medidas mais enfáticas pela Polícia Civil ou pelo Ministério Público de SP, até levá-los à prescrição
Em entrevista a Djamila Ribeiro no Instagram, a advogada das 32 mulheres que denunciaram Saul Klein por estupro, Gabriela Souza, refletiu sobre o calvário que as vítimas enfrentam quando decidem denunciar seus agressores à Justiça, especialmente quando eles são ricos e poderosos.
Segundo ela, para além de colocar em dúvida a palavra das vítimas, parece haver um esforço no sentido de não acolher as mulheres. À Pública, Gabriela também chamou a atenção para o histórico transgeracional de violências sexuais dos Klein. "Saul Klein recebeu uma educação baseada na exploração sexual das mulheres, com o pior exemplo em casa. E, usando o poder social que o dinheiro lhe beneficia, replicou e especializou o 'modus operandi' paterno para cometer as mais diversas atrocidades."
Quando publicamos as investigações sobre Samuel, recebemos várias outras denúncias envolvendo a família Klein. Em uma denúncia envolvendo Saul, que trago aqui em primeira mão, uma mulher confirma muitos elementos do 'modus operandi' denunciado nas reportagens de Universa e depois de um longo e detalhado relato conclui: "Tudo que vi e vivi foi, no mínimo, bizarro, absurdo, surreal. Parece ficção de fato. Nunca tinha digitado isso tudo. Acho que vivi um filme de terror".
* Andrea Dip é diretora na Agência Pública de Jornalismo Investigativo, apresentadora do podcast Pauta Pública e autora do livro "Em Nome de Quem? A Bancada Evangélica e Seu Projeto de Poder". É membro-fundadora da rede Unidas entre mulheres da América Latina, Caribe e Alemanha. Tem 12 prêmios de jornalismo e cobre principalmente temas relacionados a gênero, infância, encarceramento e as conexões entre política, gênero e religião.
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