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OPINIÃO

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Dadá Coelho: 'A Filha Perdida' mostra que ser mãe é tudo, menos romance

Leda, personagem interpretada por Olivia Colman em "A Filha Perdida" - Divulgação
Leda, personagem interpretada por Olivia Colman em "A Filha Perdida" Imagem: Divulgação
Dadá Coelho

Colaboração para o UOL

13/01/2022 04h00

O ano só tem 13 dias, mas já estou declarando: "A Filha Perdida" é um dos filmes mais lindos que vi neste ano. Uma bordoada na venta, um soco na moleira sobre as pressões intensas da maternidade. Eu mesminha nunca entendi essa romantização da maternidade.

É o amor mais profundo que pode existir no mundo, de fato. É um espetáculo. Mas não é romance. Está mais para ação, suspense. Até terror em alguns momentos. Mas romance, não.

Minha amiga, a escritora Giovana Madalosso diz: "Para ser mãe, a pessoa tem que adotar o filho depois que ele nasce. E para uma mãe não importa se o filho está bem. Há sempre algo que possa ser feito. Um gesto que carregue seu filho para salvar de todas as dores do mundo."

Sou mãe de Maria Antônia, cheia de graça. Fui mãe-coragem, fiz produção independente aos 30 anos. Nunca foi fácil. Eu fiquei foi dependente de tantas outras mulheres lá de casa. Minhas irmãs Emmemeirejanes, Leina Mara e Lorena Moema. A babá.

Hoje, Maria tem 21 anos, um jeito lindo de estar no mundo. Já passamos por tantos perrengues juntas. Só eu, Deus e meu biógrafo sabem.

Não vivo sem o amor da minha filha. Ela me deu régua, compasso e limite. Mas, de novo: nunca foi fácil. A gente segue se estranhando, em uma típica relação de mãe e filha. Uma reclamando da outra, se frustrando com a outra. E apesar de tudo, juntas, em uma sororidade indescritível. Seguimos enganchadas, trocando farpas até o último suspiro, na relação mais difícil mas talvez a mais bonita de todas.

Brado em tudo quanto é canto: não existe mãe solteira porque mãe não é estado civil. A mesma sociedade que condena mulheres que escolhem não ter filhos ou ter filhos independentes tolera homens que, mesmo tendo filhos, escolhem não ser pais. E o filme também mostra isso muito bem.

Tem um lugar especial no inferno para o pai que não manda nem meme para filho no Whatsapp. E para o pai de selfie, aquele que pega a criança só para fazer uma foto e postar na rede social. Tinha que inventar um aplicativo para o pai que pega a criança só para postar foto com filho: "pai food", para substituir o pai que fode.

O Brasil não é para amadores. Aqui, 50% das mulheres trabalhadoras são demitidas após voltar da licença maternidade. Um quinto dos casais brasileiros se separam até o primeiro ano do nascimento do neném. Mais de cinco milhões de crianças não têm o nome do pai na certidão de nascimento. Uma infinidade de mulheres cria sozinha crianças abandonadas por um dos cuidadores, o homem da relação.

Falar desse tema me faz lembrar da minha mãe, Maria da Penha, que morreu em 2020. Um saldo afetivo de 13 filhos, 20 netos, 21 bisnetos e um tataraneto. Juntar tanta gente assim no Natal, só a TV Globo para fazer a vinheta de fim de ano. Como ela conseguiu criar tanto filho? Se essa fosse pergunta de Enem, eu zeraria a questão.

Tudo isso para dizer: faz um favorzinho para você mesmo. Assista ao filme "A Filha Perdida". Obrigada Olivia Colman, a diretora Maggie Gyllenhaal e Elena Ferrante.