Opinião

Liderança e empoderamento: o que as mulheres pretas têm a nos dizer?

Historicamente, as mulheres pretas têm desafiado barreiras e assumido papéis de destaque. No passado, tivemos grandes mulheres liderando grupos para subverter a lógica colonial que recaía sobre os nossos corpos; hoje, elas se destacam no mercado corporativo com o mesmo afinco. A história não é a mesma, mas parte de um mesmo princípio: aquele em que as nossas vozes possam transcender a dinâmica do silenciamento como uma ferramenta para quebrar estereótipos, a partir de estratégias para superar as barreiras impostas social e estruturalmente.

Enquanto mulher preta, que durante muito tempo viveu as adversidades e as bonanças do mundo corporativo, muitas vezes sem uma semelhante do lado, hoje posso visualizar como os avanços das questões étnico-raciais nas organizações, ainda que não tenham chegado em sua totalidade, abriram margem para que as novas gerações, as que vieram depois de mim, deixassem uma marca inegável nas organizações em que atuam.

Os números mostram que 84% das executivas pretas estão engajadas nas empresas em que trabalham. A média geral de engajamento dos executivos entrevistados é de 60%, e dos demais colaboradores é de 33%. Os dados são do Engaja S/A, primeiro Índice de Engajamento de Funcionários no Brasil, realizado pela Flash, plataforma de gestão da jornada de trabalho, em parceria com a FGV-EAESP e com o Grupo Talenses, Foram ouvidos 1.732 trabalhadores de todas as regiões do Brasil, sendo que 481 estão em cargos executivos.

Os resultados não anulam uma série de obstáculos que mulheres pretas enfrentam no mundo corporativo: o preconceito, a jornada dupla de trabalho - quando se é mãe e necessita equilibrar carreira e maternidade - e a falta de oportunidades igualitárias. Mas reflita comigo: o que significa esse engajamento? Ouso dizer que nós, mulheres pretas, analisamos toda essa conjuntura diariamente, não para nos desencorajar, mas para transformar em combustível. Não para o sucesso, isso é consequência, mas para mudar os números de representatividade nas lideranças.

Executivas negras estão moldando não apenas as suas próprias carreiras, mas também inspirando outras mulheres e comunidades a seguirem seus passos. Elas utilizam suas posições de influência para promover a diversidade e a inclusão dentro das organizações, defendendo políticas e práticas que criam um ambiente de trabalho mais equitativo e acolhedor para todos. Um exemplo é o programa Conselheira 101 que, desde a sua fundação, teve mais de 100 executivas impactadas e atuantes em posições em Conselhos e Comitês de Assessoramento, após a formação.

O Conselheira 101 é um projeto sem fins lucrativos, que visa fazer parte dessa mudança que ansiamos há tempos, idealizado por mulheres pretas executivas, que sabem e compreendem as dores do mundo corporativo, mas que estão prontas para quebrar o status quo, da forma mais potente que podemos incentivar as nossas: a partir da educação, da troca e do tête-à-tête.

É crucial que as empresas/organizações reconheçam e somem nesta luta como um aliado. Agora, mais do nunca, a implementação de políticas e práticas que promovam a diversidade e a inclusão em todos os níveis, capazes de garantir que todas as vozes sejam ouvidas e valorizadas, devem deixar de ser uma diferença, tornando-se um plano efetivo e contínuo.

Para encerrar, faço mais um questionamento: você já se permitiu ouvir o que as mulheres pretas têm a dizer? Se não, lá vai: o caminho demandado pelas mulheres pretas, que impactam positivamente o mercado corporativo, não apenas enriquece as organizações em que trabalham, mas também inspira uma geração inteira a acreditar em seu potencial, que muitas vezes é posto como limitado. Seu impacto transcende fronteiras e serve como um lembrete poderoso do poder da determinação, do talento e da resiliência.

*Rachel Maia é CEO do RM Consulting e do Projeto Capacita-me. Conhecida por ser a primeira mulher negra a ocupar o cargo de CEO em uma grande empresa no Brasil e considerada uma das 500 pessoas mais influentes da América Latina pela Bloomberg Línea, Rachel já comandou a Tiffany & Co Joalheria, Pandora e Lacoste Brasil. Em seu novo momento de carreira, Rachel presta consultorias em Diversidade e Inclusão, Varejo e Liderança, por meio da RM Consulting. A empresária também atua como conselheira do CVC, VALE e nos últimos meses foi eleita Presidente do Conselho Administrativo do Pacto Global da ONU no Brasil. Além disso, é fundadora do projeto social Capacita-me, com o viés na educação e empregabilidade de pessoas em situação de vulnerabilidade.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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