Opinião

É emocionante ver vítimas de violência em espaços de lazer serem acolhidas

Novembro é o marco de um ano do Pacto Aqui Ninguém se Cala, iniciativa do Ministério Público de São Paulo e do Ministério Público do Trabalho para fomentar e reconhecer os agentes da sociedade civil e iniciativa privada que se engajam nos protocolos das leis de acolhimento à vítima de violência sexual em espaços de lazer, entretenimento, bares e eventos.

E além de discutir a importância de uma lei que exige ação correta e punir quem é negligente, vale refletir a grande oportunidade que festivais oferecem para intervenções importantes que salvam vidas.

Eu atuo em grandes eventos com protocolos de prevenção ao assédio desde 2017, tenho orgulho de ter sido pioneira. O que começou como uma ação pragmática de um manifesto pela liberdade da mulher e o empoderamento para que exigíssemos o respeito aos nossos direitos, permitiu-me entender que há ali uma avenida de possibilidades de cessar ciclos de violência.

Desde o testemunho de vítimas de abuso que me disseram conseguir retornar aos espaços de diversão por saberem que os protocolos existiam, a entender que festivais são um miniuniverso das mazelas de uma sociedade desigual, machista, misógina, racista e homofóbica. E, assim sendo, oferecer a oportunidade segura de pôr fim a uma violência porque ali se consegue acessar uma delegacia de forma segura, porque se consegue encontrar um ponto de acolhimento.

Imagine aqui uma vítima de violência doméstica que consegue estar em um espaço em que ela pode pedir ajuda para, de forma sigilosa e privativa, acessar seus direitos e ter suporte para acionar rede de apoio, polícia militar ou polícia especializada.

Testemunhei e sigo assim vendo mulheres que estão em um relacionamento abusivo serem encaminhadas para a rede do Estado após as intervenções das equipes responsáveis pelos protocolos. E quando descobrem que existe até a possibilidade de registrar queixa de forma online, como no estado do Rio de Janeiro, é de emocionar ver os olhos dessas vítimas se encherem de esperança.

Por fim, denunciar não é fácil. Um estudo, do qual fiz parte com a organização Data Pop Alliance, em São Paulo, Bogotá e Cidade do México mostrou que a mulher busca denunciar quando se desloca, quando sai da comunidade que a julga ou protege o agressor - quando sai para trabalhar, vai ao mercado. Com a lei que exige o protocolo em eventos e o suporte às vítimas, ir a um evento tem funcionado como esse corredor de esperança que tira as mulheres desse labirinto do ciclo da violência.

*Ana Addobbati é CEO e fundadora da Livre de Assédio, startup que apoia a prevenção ao assédio sexual, moral e discriminação por meio de ações estratégicas de impacto.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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