Opinião

Ter ou não ter filhos? Por que essa é uma questão e a quem importa?

Mudar de cidade pode parecer uma decisão estratégica quando queremos avançar na carreira. Foi o que fiz. Peguei minhas malas, levei meus filhos e fui para São Paulo. No papel, fazia todo sentido: mais oportunidades, crescimento profissional, visibilidade. Mas a realidade foi complexa. O que parecia uma escolha certeira veio acompanhada de um peso que eu não previa: a ausência da minha rede de apoio, o impacto emocional nos meus filhos e a solidão de um recomeço.

E aí surge a pergunta: foi um erro? Talvez. Mas a questão mais importante não é essa. O ponto central é o compromisso com as consequências das nossas escolhas - e a responsabilidade de aprender com elas.

Para mulheres, decidir não é apenas escolher um caminho, mas lidar com o julgamento que vem junto. Ao buscar crescimento profissional, ouvimos frases do tipo: 'Você tem certeza de que vai dar conta de se dedicar à carreira e cuidar de seus filhos?' Ao optar por não sermos mães, escutamos: 'Mas, e se você se arrepender?' Ao priorizarmos a família, nos perguntam: 'E a sua carreira, como fica?' O peso das escolhas femininas vai além da decisão em si - é um fardo histórico, emocional e estrutural.

Historicamente, as mulheres nem sempre podiam escolher. Até 1962, uma mulher casada precisava da permissão do marido para trabalhar. Até 1977, não podíamos pedir o divórcio sem a autorização do marido. Até 1988, a Constituição Brasileira permitia que um casamento fosse anulado se a esposa não fosse virgem.

Conquistamos direitos, mas a cobrança permanece. O erro ainda é visto como fracasso. E isso paralisa. Só que a maior falha não está em escolher errado, mas em não escolher.

O custo da indecisão e a sobrecarga feminina

Se adiar uma decisão fosse apenas um detalhe, não haveria problema. Mas, não escolher tem impacto direto na nossa paz mental, no nosso bem-estar e na nossa carreira. O cérebro entra em fadiga decisória, aumenta a ansiedade, e o medo do erro cresce.

Essa sobrecarga mental feminina não é um mito. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as mulheres têm o dobro de chances de desenvolver transtornos de ansiedade em comparação aos homens. O acúmulo de responsabilidades domésticas, profissionais e emocionais impacta diretamente a saúde mental.

Além disso, um estudo da McKinsey & Company revelou que 42% das mulheres em cargos de liderança enfrentam níveis altos de burnout. A cobrança social de ser uma profissional exemplar, uma mãe presente e uma mulher emocionalmente equilibrada, cria um peso invisível que se reflete no adoecimento físico e psicológico dessa mulher.

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E, quando não decidimos, outras pessoas decidem por nós. E, de certa forma, isso já é uma escolha - uma escolha passiva.
Se eu tivesse esperado a certeza absoluta antes de me mudar, talvez nunca tivesse ido. Mas também não teria aprendido tanto sobre mim mesma, sobre meus filhos e sobre o que realmente importa.

Ter ou não ter filhos? Por que essa é uma questão e a quem importa?

A sociedade ainda vê a maternidade como um fator determinante na vida profissional das mulheres. Segundo um relatório da Harvard Business Review, mais de 40% das mulheres já foram questionadas sobre filhos em entrevistas de emprego. Esse número reflete uma mentalidade ultrapassada, mas ainda presente, onde a mulher precisa provar sua competência constantemente.

Ao sermos questionadas, o invés de justificar nossas escolhas, sejamos firmes ao responder: "Obrigada, essa é uma decisão pessoal e já foi tomada. E, talvez, devolver para a pessoa "Por que essa pergunta ainda é tão comum e importa tanto para você?".

Não devemos mais aceitar que a maternidade ou a escolha de não ter filhos definam nossa trajetória profissional e pessoal.
como escolher com mais segurança? O segredo não é evitar riscos, mas saber que podemos nos adaptar ao longo do caminho.

Para isso, você terá que criar o seu próprio mapa para esses caminhos e suas escolhas. Algumas estratégias podem ajudar:

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  1. Memórias e história: o que sua intuição diz sobre suas escolhas? Que experiências você já viveu que podem te ajudar a tomar novas decisões?
  2. Autenticidade: essa decisão está alinhada com seus valores? O que é inegociável para você?
  3. Planejamento: do que você precisa para se sentir segura?
  4. Ação: como você pode agir sem se paralisar pelo medo?

Uma forma de trazer essas respostas é usar também a regra proposta por Suzy Welch, regra dos 10-10-10. Com essa decisão, como vou me sentir daqui a 10 minutos? Como vou me sentir daqui a 10 meses? Como vou me sentir daqui a 10 anos? Se a resposta a longo prazo for positiva, talvez seja um bom indicativo de que vale a pena seguir adiante.

A maior armadilha da jornada feminina é acreditar que podemos e devemos acertar sempre. Se você está sempre acertando tudo e sendo perfeita é porque está na hora de novos passos na sua caminhada.

O erro é capaz de nos ensinar novas e importantes lições na busca do nosso tesouro. Ele é apenas um feedback para que você mude e recomece, como um degrau para crescer. Cada escolha - boa ou ruim - constrói nossa trajetória. A segurança está em confiar que somos capazes de corrigir o curso sempre que necessário.

É da sequência de decisões que tomamos - erradas também - que ganhamos confiança para seguir e resiliência para se levantar.

Hoje, olhando para trás, sei que minha mudança para São Paulo não foi perfeita. Mas foi minha decisão. Sem essa decisão, eu não estaria aqui. E isso é um aprendizado valioso.

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