Ao investir no clichê, ele fez sua mulher voltar a ser feliz no sexo
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Alexandre avisou que chegaria um pacote pelos correios e pediu que a mulher não abrisse. "Era uma calça e uma camisa", o que já a deixou repleta de curiosidade, tipo criança na véspera do Natal. Certeza, era um presente para ela. Foi uma tortura de quase 20 dias. Primeiro o atraso na entrega; depois a caixa lá à vista, intocável, por três longos dias.
Ela é Janaína, uma mulher inteligente e cheia de vida. Tem lindos cabelos encaracolados e olhos levemente puxadinhos e uma sensualidade matreira e um tanto desconfiada. Recentemente foi minha paciente em uma pontual terapia sexual, pois estava sem desejo e com autoestima no pé. Passando por uma fase difícil no trabalho, que sempre foi o motor da sua energia no mundo, ela se viu insegura e sem atrativos, o que a fez ter ciúme de uma colega de trabalho do marido.
Dentre todos os pontos de conflito, sentir ciúme era o que mais lhe atormentava, pois a colocava na condição de ser humano ordinário. Justo ela que tinha feito de tudo para ser autônoma e independente de homens, alguém que se bastasse e pudesse compartilhar a vida conjugal a partir de um amor sublime, desses que se autoalimentam a partir de individualidades bem definidas.
Mas foi só o pilar central da sua autoestima abrir rachaduras, que a insegurança veio com tudo. A grande falácia da intelectualidade, em nossa cultura, é sugerir um desprendimento emocional das pessoas. Fico chocada quando alguém inventa um novo workshop com propostas de sucesso emocional, pautadas no nunca sentir ciúme, não se contradizer, não ter raiva ou ter uma fé inabalável na sua autoimagem. Uma pena que as pessoas de fato acreditem nisso.
Por algum tempo trabalhamos algumas possibilidades de resgate lúdico. Janaína tinha ficado séria demais e com dificuldade de tornar o sexo uma possibilidade de estimular a sua criatividade e a sedução. A questão não é o parceiro, por quem ela tem atração e interesse, mas a retração da libido espontânea com o também decréscimo da motivação para realizações.
Difícil desejar sexualmente o outro para quem não se sente desejante na vida.
Eles têm ótimo relacionamento e passaram a conversar muito sobre a sexualidade a partir de então. Alexandre abraçou a questão com interesse e compreensão, e passou a intensificar os elogios sobre seu corpo, reafirmando o seu amor por ela, todas as noites, tentando ajudá-la a vencer a fase difícil que estava vivendo.
Mas num sábado ele se superou. Enquanto ela estava na parte inferior da casa, ele desceu uniformizado de nada mais nada menos do que bombeiro. Sim, leitoras, lembram daquela entrega? Pois é, Alexandre mandou fazer uma camiseta vermelha com seu sobrenome bordado, comprou uma calça, um cinto de utilidades e foi lavar a louça que estava na pia. Eu vi essa cena, pois recebi a foto. (Eu simplesmente AMO quando meus pacientes me mandam fotos e relatos pós-sexo —claro, com o devido recato que se exige nessa relação).
Ele ficou um tempão circulando com a roupa, como se tivesse chegado do trabalho. O sexo não aconteceu de maneira explosiva, mas foi sendo construído, bem ao modo responsivo de que ela precisava naquele momento. "Logo que o vi, o meu corpicho sedentário não respondeu de maneira erótica", me disse ela, "mas achei lindo, lindo, me senti apaixonada, encantada".
Eles assistiram a um filme juntos, do tipo comédia romântica. Daí ela subiu, colocou uma lingerie bonita, fez uma maquiagem e se sentiu "gostosa pra cacete". Foi quando ele entrou no quarto e se apresentou como Tenente Carraro, controlando a situação toda. Ela me contou que deixou sua porção stripper aparecer, rebolou, se exibiu, como havia anos não fazia.
Eles fizeram um sexo gostoso, e dormiram agarradinhos no frio. Sorrindo sozinha, ela me descreveu uma noite divertida, sensual, gostosa e romântica, que a fez se sentir viva de novo.
Eu sei que essa história do "pega na minha mangueira" e "apaga meu fogo", pode parecer bem clichê, mas, como disse um amigo querido anos atrás, os clichês existem para serem usados. A questão que se apresenta, no desafio de quem se vê sem apelo sexual físico, é justamente acionar a possibilidade de brincar de novo, encontrar graça onde não há nenhuma, montar cenários eróticos interessantes.
Se o caminho é o do sexo explícito, do estímulo corporal do tantra, do ambiente ou do romantismo, não importa. O maior problema é convencer os casais a saírem da posição de medo, raiva, dor, insegurança ou ressentimento, principalmente da parceria que está no vácuo, não se sentindo desejada e estimulada pela falta de libido do outro.
Incontáveis são as situações dos que se fecham e acham tudo uma grande "bobagem", reclamam, se ofendem ou se desesperam. O que Alexandre fez foi diferente disso tudo, o que o fez ser definitivamente colocado no rol dos meus "maridos prediletos".
Mais do que de mim, Janaína precisava era dele.
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