Como Rosana se reinventou sexualmente depois de uma relação abusiva
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Rosana, 32 anos, já tinha esquecido qual era a sensação de estar nua, em vias de fazer sexo com um homem desconhecido ou pouco íntimo. Nos últimos 15 anos, desfrutou de uma boa vida sexual com seu marido Carlos, que segundo ela, era um amante disponível e carinhoso. Bem diferente de como agia no cotidiano do casamento, quando ele fazia questão de minimizar suas opiniões e fazer pouco caso das suas conquistas profissionais.
Nos primeiros anos da vida a dois, ela se enchia de orgulho de ter casado com aquele homem inteligente e perspicaz, depois passou a se encolher como um bichinho assustado, pois cada vez que colocava sua opinião, ele a olhava com desdém, e iniciava mais uma aula sobre o assunto da vez. Nos últimos anos ela silenciou, evitando diálogo com ele, que sem plateia, passou a hostilizá-la. Como não tem sangue de barata, pediu a separação.
Uma mulher cheia de vida e de atitude, Rosana, em alguns momentos, duvida de si mesma, principalmente quando está diante de pessoas muito dominantes. Em casa, sua autoestima vivia na corda bamba, a depender do humor do marido e do quanto ele resolvesse dar palestrinhas sobre qualquer dos diversos temas que o casal desenvolvesse no bate-papo cotidiano.
Não é necessário preencher todos os requisitos de uma relação abusiva, como rebaixamento constante da autoestima, o afastamento das pessoas próximas, os xingamentos, o ciúme e o aprisionamento emocional, para avaliar comportamentos tóxicos. Basta que a pessoa decida obter uma vantagem psicológica na relação afetiva, seja romântica, seja fraterna ou filial, mantendo o outro vulnerável para garantir um nível ou outro de toxidade.
Separada e inaugurando a nova fase, Rosana decidiu que iria se desenvolver sexualmente e fortalecer a sua autoestima, mergulhando na descoberta das suas sensações através da terapia tântrica e passou a consumir conteúdo sobre o tema da sexualidade. O ano de 2020 prometia.
Mas a pandemia veio jogar um balde de água fria nos seus planos de curto prazo e ela teve que adiar a possibilidade de encontrar novos parceiros. O mergulho teria que continuar a ser interno. Quando começamos as sessões de terapia, Rosana se via como uma mulher recém-separada, desprovida de ferramentas para iniciar um flerte, fosse ao vivo ou pela internet. Se sentia pouco sexy e desajeitada no campo da paquera.
Mas bastou só um pouco de incentivo para essa mulher virar do avesso. Em 2 meses ela aproveitou a fase verde da quarentena e saiu com 4 homens diferentes. Claro que não fui eu, mas o que o meu eu representava: a mãe que acolhia os seus desejos, diferente daquela, da infância, que a fazia se sentir quase sempre inadequada. Diferente dos olhares de julgamento sobre o ser desejante feminino que não só vem dos homens, mas das outras mulheres, a rotular a busca do prazer como algo sujo, errado ou pecaminoso. A orientação? Seguir com responsabilidade e autocuidado, colocando afeto e respeito na relação com o outro e com o seu próprio corpo.
Primeiro ela resolveu fazer parte de uma orgia virtual. Sim, porque as casas de swing precisaram se reinventar, não é mesmo? Pois Rosana resolveu criar uma persona chamada Brigite. Peruca, maquiagem e lingerie, começou tímida na reunião do zoom que acolhia uns 60 quadradinhos com pessoas das mais diversas em situações das mais bizarras. Ela, muito ligada a estética, toda linda, logo torceu o nariz para o povo pouco preocupado com o ambiente ou a vestimenta, sentados em sofás feios, de cueca e meia, bebendo cerveja e comendo pipoca, esperando o sexo acontecer diante da tela do computador.
Outro dia, li um sujeito dizendo que se você tem problemas com a autoestima, vá a uma casa de swing para ver todos os tipos de corpos se amalgamarem, no que Rosana concordou. Mas ela estava decidida a se desafiar e depois de toda a produção, não ia deixar Brigite chupando o dedo. Depois de algum tempo, meio tímida, achou um casal que lhe agradava e foi para uma sala particular fazer o sexo virtual acontecer. Para quem não sabia se era capaz de flertar a Brigite me saiu melhor que a encomenda. Alerta de gatilho. Quando achou que a festa esmoreceu e ainda cheia de energia, ligou para um amigo animada, propondo apresentá-lo a sua nova persona. Foi uma noite e tanto.
Semana seguinte ela resolveu fazer um curso online de dominação, que muito lhe animou, comprou cordas, chicotes e afins, corpetes de couro e outros apetrechos. Daí, foi como ter ganhado um brinquedo novo. Fez um perfil em um app de relacionamento e colocou Brigite na roda. Na sua primeira sessão de dominação, deu um tapa na cara de um fulano também principiante, o que não se sabe se deixou ela ou ele mais assustado, mas se divertiu amarrando as mãos dele fazendo-o sofrer só um pouquinho, impedindo que a tocasse, enquanto ela o instigava. Nunca tinha dado um tapa na cara de alguém antes e isso lhe rendeu sentimentos bem controversos.
Na segunda vez, se deparou com um masoquista clássico, que estava mesmo a fim de sofrer e a cada "bate mais forte", Rosana entrava em cena, amolecendo Brigite e perdendo o tesão. Percebeu que não gosta de humilhar, nem de bater, mas curte mesmo o jogo de sedução, de ter domínio sobre a situação, de se sentir desejada e ver os homens implorarem por ela.
Todas as culturas marcadas por grandes desigualdades sociais, que criam categorias baseadas em privilégios, produzem relações afetivas atravessadas pela humilhação. Ricos e pobres, Homens e mulheres, brancos e pretos, patrões e empregados. O jogo sadomasoquista esbarra nesse lugar nosso velho conhecido, de poder e submissão, tão entranhado na percepção que temos de nós mesmos e, muitas vezes, a nos compensar em um polo ou outro diante dos outros.
É muito lindo acompanhar essa conversação que Rosana faz com sua Brigite, refletindo o quanto há de perverso e generoso em si mesma. Enquanto Brigite se afirma nos jogos de dominação, Rosana vai também criando intimidade com um homem que conheceu outro dia, meigo, calmo e disponível, com quem troca carinho e chamego.
Por fim, antes da virada do ano e de voltarmos todos para a fase vermelha e nos retiramos em isolamento, ela resolveu fazer um curso de Shibari, técnica erótica com forte apelo estético, que consiste em amarrar a parceria dando vários nós, com cordas de fibras naturais encerada com cera de abelha, aumentando a pressão sobre pontos estratégicos do corpo, promovendo excitação. Nem bem teve a primeira aula, já amarrou docemente um pretendente, encantado que ficou com a sua narrativa entusiasmada sobre o assunto. Parece que dessa vez, Brigite e Rosana estão finalmente trabalhando em conjunto.
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