Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
'Moro na casa dos meus pais com minha mulher e ela não quer transar'
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Flávio tem 32 anos e me escreve contando que está casado há pouco mais de 2 com Adriana, 22. Eles têm uma filha de 1 ano, fruto de uma gravidez que chegou durante a pandemia e que forçou Adriana a abandonar a faculdade e, ainda por cima, ir morar com Flávio na casa dos pais dele. Como eles também foram afetados financeiramente, continuam morando lá e, embora tenham privacidade (e rede de apoio, o que é muito bom), o quarto do casal fica bem em cima do quarto dos pais dele.
Eu nunca tive uma experiência dessas e sinceramente não sei como me sentiria sentada com meus sogros no café, após ter transformado uma manhã preguiçosa em sexo quente com o filho deles. Agora, já ouvi inúmeras vezes esse tipo de incômodo: o sexo que se escuta pelas pessoas que coabitam com o casal e que inibe o tesão. Claro que digo a Flávio que, mesmo que ele "não ligue" para isso, ou que os pais dele sejam pessoas abertas e que não se incomodem, ele não é Adriana, portanto a sua lógica não se aplica à dela.
Já adianto a Flávio que o projeto "casa própria" seria excelente para o casal, mas eu sei que entre o real e o ideal existe o possível. Enquanto todos moram na mesma casa e ela se incomoda, sugiro que saiam para fazer sexo no motel, no hotel, ou onde mais seja possível ter um pouco de privacidade. Eu poderia dizer para eles aproveitarem os momentos em que os pais de Flávio saem (quem sabe eles estão indo a um motel, hotel ou outro lugar para ter privacidade, já que o filho e a nora devem estar ouvindo o sexo deles no andar de cima), mas nem devem estar saindo muito por causa da pandemia e também acho que Adriana está com o seu "ser transante" tão apático que duvido que ela se anime em priorizar o sexo na janela de oportunidade.
Flávio me conta que Adriana não é de tomar iniciativa, mas que no início do relacionamento a vida sexual deles era ativa; ela respondia bem quando ele a procurava. O corpo grávido despertou desejo nele, mas a esposa já começou a não demonstrar disponibilidade para o sexo nessa época. Digo a ele: "Mas, Flávio, grávida aos 21, no isolamento da pandemia, na casa dos sogros e ainda por cima sem o curso universitário, com suas descobertas, projetos, amigos e sonhos, só se a moça gostasse muito mesmo de sexo".
Não sei se esse bebê foi planejado e desejado, o que também pode fazer diferença na vivência da gravidez, se a Adriana teve apoio e afeto da família dela e amigos(as), se ela teve enjoos e desconfortos, se gostou das mudanças corporais. E depois, no puerpério, tem toda a demanda do bebê, a prolactina alta que interfere na libido e também na excitação (ela ainda amamenta?), a falta de sono, tudo para atrapalhar o desejo.
Me pergunto o quanto Adriana não está deprimida, achando a vida extremamente tediosa, mesmo que goste de você, da família e da filha. Comento: "Flávio, olha só, a maternidade não é esse processo repleto de amor e cheiro de talco. Sei que enfrentar a ideia de que a mãe do seu filho não está superfeliz pode ser difícil para você, mas convém eu te esclarecer que a maternidade consome uma mulher e, a depender do momento da vida em que ela esteja, pode ser quase impossível sorrir."
Ou, quem sabe, pode ser que a Adriana tenha se apegado tanto ao prazer que um bebê também nos dá —a maternidade não é só dor e falta de energia— que ela mergulhou nesse papel e não consegue ter prazer em outro lugar. Acho mesmo que a Adriana deve estar com a sua identidade tão atrapalhada, que fazer sexo parece ser mais uma "demanda".
A situação é crítica, pois o pouco sexo que fazem é sem nenhuma entrega ou interesse por parte dela —não há excitação, nem tampouco orgasmo, nem movimento algum para excitar Flávio —o que reforça essa minha impressão, a distância, de que precisamos urgentemente compreender o momento fisiológico de Adriana e o quanto ela se permite o prazer sexual.
Aos 22 anos, o que sabemos sobre sexo?
Quanta autonomia sexual Adriana conseguiu desenvolver nos poucos anos de vida sexual ativa que teve, até conhecer o marido? Foi então que Flávio me conta que Adriana sofreu abuso sexual intrafamiliar na infância, o que pode ter uma forte correlação com a falta de interesse sexual dela, ou na inibição de sua expressão sexual. Mais uma camada, talvez a mais importante e profunda, para explicar por que o sexo seja um tema difícil para ela, repleto de significados negativos.
Digo a ele: "Sabemos que você é outro homem, Flávio, e não aquele que a ofendeu, mas a mente não funciona com essa lógica, quando está carregada de impressões emocionais negativas e traumáticas —todo homem pode ser uma possível ameaça."
Ajuda profissional é fundamental aqui.
Não é só o casal e seu desajuste no desejo sexual, mas o trauma de Adriana e a mágoa de Flávio, por não ser o homem que provoca prazer na parceira, que está sem dinheiro e mora com os pais. É a soma do resultado da violência com as impotências individuais. Dá vontade de pegar no colo, tamanho me parece o desamparo dos dois. Torço muito para que consigam identificar e enfrentar os conflitos emocionais e, quem sabe, trazerem o tesão para essa relação tão cheia de desafios.
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