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Ana Canosa

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Como é o acompanhamento psicológico para vitima de estupro?

Klara Castanho foi obrigada a falar sobre violências sofridas; - Instagram/Reprodução
Klara Castanho foi obrigada a falar sobre violências sofridas; Imagem: Instagram/Reprodução

Colunista de Universa

09/07/2022 04h00

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Uma situação de violência, seja ela qual for, deixa marcas profundas na vítima. A experiência da violência sexual é cruel porque há uma apropriação do corpo, o que temos de mais íntimo. Para piorar, o abuso sexual e o estupro são crimes carregados de julgamento moral que, em sociedades machistas como a nossa, recaem majoritariamente sobre a conduta da mulher.

A atriz Klara Castanho, vítima de um estupro e da leviandade dos que expuseram a sua intimidade, fez uma postagem recente em seu perfil do Instagram, agradecendo o apoio de seguidores, familiares, amigos, colegas de profissão e imprensa, dizendo que está se cuidando e sendo assistida por acompanhamento psicológico e profissionais que "estão trabalhando para a preservação dos meus direitos". Uma lição de assertividade, gratidão e autocuidado. Que a sua atitude sirva de modelo para todos nós!

A notícia de uma violência sexual desperta sentimentos muito intensos. De parte da vítima, vergonha, raiva, indignação e, muitas vezes, culpa, por não ter conseguido conter as ações do vitimizador. Silenciar diante dessas situações é bastante comum, pois é frequente que a reação das pessoas seja também violenta.

Seja a dúvida sobre o relato - "tem certeza de que isso aconteceu?" -, a negação da situação - "não vamos falar isso para ninguém ou a inversão da culpa"; "eu disse para você não sair com aquela roupa" - para preservar o ego, emudecer e tentar lidar sozinha com as próprias emoções parece o mais sensato a fazer.

Até uma frase bem-intencionada como: "porque você não me contou antes?" pode soar acusatória. Outra reação bastante comum, que acontece principalmente de parceiros homens, é querer resolver a situação a partir de suas próprias convicções, passando por cima da vontade da companheira.

Além das consequências visíveis como a gravidez não planejada e indesejada, fístulas genitais, infecções sexualmente transmissíveis e aborto inseguro, a Organização Mundial da Saúde destaca também outras consequências como dificuldade para dormir, depressão, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), ansiedade, transtorno de pânico, ideação suicida e disfunções sexuais.

Muitas mulheres e homens vítimas de violência sexual tem ansiedade antecipatória diante de uma relação sexual, provocando transtornos de excitação, orgasmo, e, em alguns casos, o vaginismo - que é um reflexo de defesa da musculatura do assoalho pélvico, desencadeando espasmos involuntários dos músculos perineais que impedem total ou parcialmente a penetração na vagina, impossibilitando ou dificultando o coito e o exame ginecológico. Já atendi muitas pessoas nessas condições e sempre é difícil ouvir os dolorosos relatos.

Quando alguém me diz: "eu nunca contei isso para ninguém, mas vou dividir com você", me sinto grata por oportunizar essa escuta e acolhimento, pela confiança depositada em meu trabalho e por ser colo de quem esteve durante algum ou muito tempo, só tendo os próprios pensamentos para apaziguar a sua tristeza. Busco toda a sensibilidade possível que há dentro de mim, escolhendo cada palavra para legitimar a dor de quem está na minha frente.

Não pensem que é fácil! Muitas situações requerem denúncia, pois comportamentos contra a dignidade sexual são considerados crime (estupro, assédio sexual, importunação sexual, dentre outros). Essa orientação deve ser passada para a paciente, além de a intervenção rápida no ambiente familiar e social da vítima que, muitas vezes, encontra resistência dos envolvidos.

Buscar ajuda profissional é fundamental para que esse espaço neutro e seguro favoreça a elaboração da experiência traumática. Encontrar um lugar dentro de si, para acomodar a memória desinvestida de tanta emoção negativa pode levar tempo, mas é possível!