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Ana Canosa

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Fingir orgasmo: por que mulheres ainda fazem isso e o que homens têm a ver

Colunista de Universa

17/12/2022 04h00

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Sim, as pessoas fingem orgasmo, e a prevalência desse comportamento aumentou: uma pesquisadora norte-americana fez um estudo comparativo por 30 anos e descobriu que em 1990 33% fingiam orgasmo, número que subiu para 74% em 2020. E são algumas as motivações, entre elas a de proteger a outra pessoa de se sentir inadequada, ferida ou pouco atraente —e isso acontece mais com mulheres em relação aos seus parceiros homens. Aliás, estatisticamente, as mulheres fingem mais: 50 a 67% contra 25 a 36% dos homens.

Outra pesquisa, publicada recentemente pela revista científica Social Psychological and Personality Science com uma amostra de 600 mulheres, investigou se a percepção de uma masculinidade frágil torna as mulheres mais propensas a fingir orgasmos, em relações heterossexuais, a fim de dar um lustro na autoestima sexual de seus parceiros.

O estudo foi dividido em partes:

  • A primeira com 150 mulheres descobriu que a diferença salarial influencia no comportamento sexual da mulher. Se ela ganha mais dinheiro do que o seu parceiro, é mais provável que ela finja orgasmos, mesmo que isso comprometa a sua satisfação sexual.
  • A segunda, feita com 300 mulheres em idade universitária, demonstrou que aquelas que suspeitavam de uma fragilidade na masculinidade do parceiro eram mais propensas a fingir orgasmo e se sentir insatisfeitas sexualmente.

Perceber a vulnerabilidade masculina não é difícil porque aparece em comportamentos que expressam, normalmente, uma necessidade de demonstrar algum tipo de poder para encobrir a insegurança: verborragia intelectual de autopromoção, arrogância profissional, narcisismo corporal e exibição dos bens e da potência sexual (quantas mulheres ele já "comeu", o tamanho do seu membro ou mesmo como ele é experiente, pois já fez "de tudo").

Especificamente na relação sexual, fica visível em homens que se preocupam demais se estão agradando: eles focam no orgasmo feminino como o único marcador de um sexo de qualidade —não percebem que não há nada mais chato que o cara que fica perguntando várias vezes se você já gozou ou que fica problematizando o fato de você não ter gozado).

Também se incomodam com o uso de sex toys ("substitutos" de seu pênis, mãos ou boca) ou tem disfunções sexuais de causa emocional por medo do desempenho.

Mesmo que essas manifestações sejam bem chatas, podem provocar na mulher um misto de empatia e pena. Fingir orgasmo seria uma maneira de dar-lhes alguma "garantia" de sucesso.

Esse tipo de comportamento tem raízes no patriarcado e no machismo estrutural, já mulheres foram educadas a facilitarem as coisas para os outros e aprenderam a valorizar o desejo masculino em detrimento ao feminino, tanto no que se refere ao sexo quanto em outras esferas da vida.

Mas é essa percepção torta que se tem sobre a necessidade do orgasmo, de que seria uma "prova" de que o outro é sexualmente interessante, que leva homens e mulheres a nivelar por baixo a relação sexual.

Em vez de buscar compreender porque o orgasmo não acontece, procurar soluções para melhorar a qualidade da vida sexual do casal, as pessoas evitam um possível embate, pois, normalmente, a conversa também é torta: mulheres que acham que os parceiros já não têm tesão por seus corpos e estão transando com outra pessoa, homens que se julgam inábeis porque não fazem as suas companheiras gozarem, ignorando completamente a resposta sexual feminina.

O estudo que comentei no início do texto teve uma terceira parte, que demonstrou justamente que as mulheres "tendem a reduzir a comunicação sobre sexo para proteger a masculinidade dos seus parceiros. E, embora a motivação destas mulheres seja manter o relacionamento, a situação cria um círculo vicioso que não é benéfico para nenhuma das partes a longo prazo".

Também é importante ressaltar que há um profundo desconhecimento sobre a fisiologia da resposta sexual, e que mitos e crenças culturais sobre o orgasmo fomentam a ideia de que ele deve ocorrer sempre e que a falta de excitação suficiente para dispará-lo está diretamente ligado à outra pessoa.

As pessoas ignoram que não gozar durante uma relação sexual pode acontecer por condicionamento ao gozo na masturbação, dificuldade de concentração, cansaço físico para quem tem uma latência de orgasmo muito longa, falta de adequação na prática sexual do casal para favorecer o orgasmo de ambos. Os motivos são vários. E pasmem: algumas pessoas ainda acreditam que só vale quando o orgasmo dos dois acontece "ao mesmo tempo".