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Ana Canosa

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Maria se casou com mulher após deixar marido: 'Término com ela doeu mais'

Maria sofreu mais quando se separou de mulheres, pois dizia haver mais parceria - Unsplash
Maria sofreu mais quando se separou de mulheres, pois dizia haver mais parceria Imagem: Unsplash

Colunista de Universa

25/02/2023 04h00

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Maria tem 42 anos, é uma mulher autônoma e bem-sucedida, que mora sozinha em São Paulo. Seu apartamento é uma delícia, uma pequena cobertura com um espaço repleto de plantas no andar superior, um prolongamento da sala e da cozinha, o que faz com que as noites de celebração, com amigos ou crushes, sejam em volta da comida, da bebida, do violão, das risadas, das estrelas, do cheiro de planta molhada quando chove.

Maria tem uma filha, Luana, que mora na Austrália. Ela tem 18 anos e nasceu do casamento dela com Pedro, quando eles tinham seus 20 e poucos. Depois dessa união de cinco anos, Maria se casou com Paola, sua primeira paixão homoafetiva, que virou a sua cabeça e a fez procurar terapia. Ela não tinha exatamente lembrança de ter atração por mulheres, muito embora também não fosse totalmente imune aos encantos femininos. Com Paola estabeleceu uma conexão emocional que não tinha com Pedro, uma união natural, baseada na escuta de necessidades emocionais, no amparo diante das dificuldades, na gentileza. O sexo durava mais tempo e era mais íntimo, sendo que Paola fazia questão que ela se sentisse amada e satisfeita, tendo os orgasmos mais garantidos de todas as relações que já teve.

Sim, embora a gente namore pessoas, séculos de desigualdade de gênero lapidam homens e mulheres de maneira diferente, não só para o sexo, como também para o amor. Com Paola, Maria tinha sensação maior de que o trabalho emocional era comum, elas estavam alinhadas na importância de falar, ouvir, cuidar e agradar; com Pedro estava cansada em ter que "explicar" o que sentia, a dificuldade de compreensão da parte dele era grande. Por outro lado, Paola era muito intensa e qualquer acorde desafinado parecia um tsunami, uma catarata emocional, um drama, uma ameaça à relação, que ficou "exigente" demais. Elas se separaram três anos depois.

Então, Maria conheceu Jefferson, professor de ioga, super "boa praça", mas que resolvia tudo com respiração e alongamento. Se brigavam, ele se colocava na posição de lótus, pedia a ela que falasse abertamente sobre seus sentimentos e emoções, puxava uma respiração profunda e a conversa virava um mantra, que depois, com frequência se tornava sexo. A gente ama ioga, mas ela não substitui um bom papo, não é mesmo?

Maria cansou de fazer a posição do cachorro olhando para baixo, mesmo que adorasse quando Jefferson segurava no seu quadril e aquilo acabava em sexo, onde ela matava as saudades de um pênis de "carne e osso" — como me dizia. O problema é que embora sentisse que com Jefferson as coisas se resolviam de maneira mais fácil, ele não se abria, ela não sabia o que ele estava sentindo e a comunicação estava sempre truncada — e não teve ioga que desse conta dessa falta de intimidade emocional. Que fique claro que isso não tem nada a ver com a prática, que por acaso era a maneira como ele se conectava com o mundo.

Maria teve alguns casos esporádicos com outras mulheres e homens e atualmente se define como bissexual. Sente diferença nas relações baseadas no gênero, às vezes mais, às vezes menos. Seus rompimentos amorosos com as mulheres pareceram mais devastadores, pois sentia que a vida no todo era mais compartilhada, das conquistas, passando pelos pequenos detalhes ao enfrentamento de grandes problemas. Por outro lado, com os homens se sente mais sensual, talvez por ser tomada pela cultura erótica da performance feminina em relações heterossexuais.

Enquanto a atração sexual por ambos os sexos dá a ela uma sensação de "liberdade", por outro lado, quando relata suas interações amorosas e sexuais, percebe uma narrativa de gênero que também a atravessa. Não tem jeito. Maria é Maria, com sua história, sua personalidade, sua herança familiar, mas é também uma porção de todas as outras Marias do seu mundo.

Ser traído com outra mulher dói menos?