Ela finge orgasmo para o marido há 16 anos. Como parar de mentir?
A Jussara tem 45 anos, é casada há 16 e nunca teve um orgasmo na relação sexual com o marido. Ela me conta que finge sentir prazer com ele, principalmente o orgasmo, mas só chega ao clímax quando se masturba, algo que aconteceu "tardiamente" na vida dela. Ela repetiu a cartilha que aprendeu no seu contexto social: projetar a atuação feminina na cama para satisfazer os homens.
Consequentemente, teve dificuldade em manifestar sua vontade, insatisfações e frustações com os parceiros, nem sequer conhecia bem seu corpo e desejos. Mas ela quer falar a verdade para ele e me pergunta como, pois é difícil para ela imaginar essa cena. Respondo que compreendo suas motivações e angústias. Mais da metade das mulheres já fingiram orgasmo e, dessas, boa parte o fizeram com a intenção de "proteger seus parceiros de um sentimento de inadequação ou incompetência". Tem até um conceito para isso: 'engano altruísta'.
Reside também nesse tipo de comportamento a dificuldade de enfrentar conversas difíceis, que podem ser constrangedoras. Quando eu era uma adolescente, no século passado —quando fazer sexo nessa etapa da vida era enxergado como coisa de "galinha"— menti para um namorado um pouco mais velho que eu. Disse que era virgem. Não me lembro exatamente porque, mas provavelmente para me livrar de ser julgada como uma mulher "fácil", dessas que os homens não deveriam namorar. Daí que, na Hora H, não dava para fingir 'costume', menos ainda inexperiência, porque eu não sou boa atriz e acabei revelando que eu não tinha mais o 'selo da garantia celestial' antes que a relação fosse consumada. Deu ruim, o namorado ficou inconformado, segundo ele com a 'mentira', e não com o fato de já ter tido ou não relação sexual com penetração. Fui para casa com o 'rabinho' entre as pernas, me sentindo culpada e ao mesmo tempo ridícula. Ainda por cima tinha perdido a chance de ter feito sexo naquela noite.
Então, digo para a Jussara que, embora ela provavelmente deseje que seu marido seja compreensivo, se coloque no lugar dela, faça uma análise mais ampla sobre o que a levou esconder tanto tempo sua falta de prazer sexual e fique até grato por ela ter decidido se abrir, também se prepare para acolher a raiva dele. A frustração. A tristeza. A sensação de ter sido enganado, traído e sei lá mais o quê. Jussara, se quer parar de mentir e começar a construir uma comunicação sexual que favoreça também o seu prazer, vai ter que passar por isso.
No entanto, alerto, há limite para tudo. Se o marido dela for um ser agressivo e machista e o risco de violência for grande, já acho que não vale a pena se expor. Quem sabe ele é do tipo dramático, que vai fazer desse assunto uma tragédia grega, deprimir, como se ela estivesse contando sobre um amante —comportamento que também pode aumentar a sua culpa. Outra possibilidade é ela sair arrasada, se sentindo a última das mulheres, no caso dele ser do tipo exigente e crítico, que vai ficar dando lição de moral e palestrinha sobre integridade moral.
Pior é se ele resolver ameaçar o vínculo de amor, passando dias inteiros distante e frio, só falando bom dia, boa noite, para puni-la de maneira silenciosa, aumentando a sua insegurança. Será que ele tem dificuldade em ser acolhedor e atento com as suas necessidades? Provoco Jussara a pensar se ela só está reproduzindo um comportamento de gênero —no sexo— ou se ela também esconde outros sentimentos de seu parceiro. E o quanto tem dele e/ou dela —da sua história de vida, da sua educação, da dificuldade de ser aberta e coerente com a sua própria satisfação. Provavelmente uma somatória de tudo isso.
Essa situação, a clássica da revelação dos segredos, omissões e mentiras que contamos para nossas parcerias, pode ser uma excelente oportunidade para a melhora da comunicação e o fortalecimento do amor. Para que possamos nos tornar vulneráveis, apresentando nossas maiores dificuldades e medos, é preciso confiar que o parceiro, embora tenha sentimentos ruins ao escutar algo difícil, consiga também ser empático e valorizar a iniciativa daquele que se decidiu desnudar diante do outro.
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