Ana Canosa

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Opinião

'Estou grávida e o meu marido não quer transar comigo, o que há de errado?'

Andreza tem 29 anos e está grávida do seu primeiro filho. Está com 22 semanas, ou seja, segundo trimestre da gestação, a fase em que a mulher está mais ativa, inclusive sexualmente. Já passou o primeiro impacto da notícia, que deixa algumas mulheres inseguras, principalmente as que não estão tão certas assim sobre a maternidade. Além disso, não tem mais o sono incontrolável que a tomava nas primeiras semanas, o risco do abortamento espontâneo diminuiu exponencialmente e a barriga já despontou.

Justamente nessa fase em que se sente bem e disposta, José não quer transar, evita a todo custo, justificando a falta de vontade no cansaço do dia a dia e nas preocupações do trabalho. Realmente, ter um filho aumenta a responsabilidade, inclusive financeira, o que pode deixar as pessoas bem mais ansiosas, a depender da situação do casal. Porém, Andreza e José são privilegiados e estão mais sossegados nessa questão. Então, o que pode estar inibindo o desejo sexual dele?

Alguns homens relatam estranhamento com a maternidade de suas companheiras, como se o erotismo não combinasse muito com esse novo papel. Essa divisão da mulher mãe de família, santa e pura, com a da sexualmente ativa, desejante, livre e transgressora, ainda é uma herança internalizada que advém do que Jung chamaria de inconsciente coletivo. Mesmo que estejamos desconstruindo essas crenças, foram séculos da imagem materna associada a abnegação e ao amor — nunca ao prazer sexual. Então, é possível que José esteja navegando por esses mares.

Outra possibilidade que me vem em mente é que agora não serão só os dois, mas os três e isso requer aprender a não ser mais o foco da atenção de alguém. O bebê vai tomando esse espaço, tanto para o pai, quanto para a mãe, e nem sempre é uma tarefa fácil, principalmente quando tudo gira em torno dessa gravidez. José pode estar ressentido de perder a sua exclusividade na vida de Andreza, ainda mais se ela estiver tão encantada com a maternidade, que a vida dela só gira em torno desse assunto. É compreensível, mas há que se acolher as demandas de todos e entender se José está triste com isso - se a falta de sexo é mais melancólica do que raivosa, de quem está de 'luto', por perder algo muito importante.

Penso também na famosa frase "vai machucar o bebê". Por mais que se saiba do absurdo desse pensamento, simplesmente ele vem, na expressão de que 'algo pode dar errado'. É quando a emoção teima em não acompanhar a razão.

A sacanagem da vida é que depois que Otávio nascer, provavelmente quem não vai querer fazer sexo é Andreza, que estará cansada, ansiosa com a maternidade, ora arrependida, ora apaixonada, louca para voltar a trabalhar ou, quem sabe, aventando a possibilidade de pedir demissão e mergulhar na simbiose mãe-bebê.

Sugiro que conversem claramente para compreender o que está em jogo e lembrar que a gravidez é só uma fase. Para Andreza, que já está insegura com as mudanças do corpo, não ser 'desejada' por José piora o cenário e aumenta fantasias de que ele possa estar interessado em outras pessoas. Quem sabe eles possam usufruir de outras práticas e carícias, como masturbação e sexo oral, evitando a penetração, caso identifiquem que é ela o "problema".

O importante é não deixar o assunto virar um tabu e que a retomada do sexo esteja no radar, pois, às vezes, os casais se acostumam com essa falta e ficam anos sem transar.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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