Ana Canosa

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Opinião

Para sentir-se macho, amado e acabar com a impotência, Rogério quer ser pai

Rogério tem 29 anos e uma vida socialmente ajustada. Ele é casado há 1 ano com Bruna, e eles têm um ótimo relacionamento. Juntos dividem tarefas, projetos, lazer e ótimos momentos em família. Não brigam nunca e dão risada de tudo. Bruna é hábil em transformar momentos de tensão em descontração e ele sempre me reforça isso: "Ela é leve, a vida com ela não tem tempo ruim".

Mas, minha gente, quem aguenta uma vida sem tempo ruim, não é mesmo? O fantasma da disfunção erétil veio assolar a porta deste adorável casal.

Há 2 anos, depois de um período de namoro com sexo intenso, ele começou a apresentar perda de ereção durante as relações. O sexo foi rareando, porque ele sempre o evitava e a Bruna foi ponderando, tentando conversar, pedindo para que ele fosse ao médico.

Ela me confessou que pensou muito antes de levar adiante o casamento, mas os prós eram maiores do que os contras. Os dois últimos sexos aconteceram durante a lua-de-mel. Passaram 1 mês viajando pelas ilhas gregas e Rogério deu todas as desculpas possíveis para fugir dos momentos de intimidade: dor de cabeça, cansaço, azia e má digestão.

Bruna, que já estava fula da vida com a situação, deu uma prensa e o sexo aconteceu quase de supetão. Foi a última vez.

O que fez esse sujeito sentir-se impotente diante da companheira? Dinheiro? Estresse? Problemas físicos? Disputas de poder na relação? Nada disso.

Rogério tinha sido um garoto tímido, extremamente comprometido com os estudos e os esportes. A masculinidade era pautada no fazer, na ascensão profissional e financeira. Teve um avô com perfil de liderança, comprometido e encantador, uma referência para ele. A ideia do macho provedor faz parte do seu DNA. Teve relações anteriores nas quais era ciumento e de perfil controlador.

Conheceu Bruna namorando outra pessoa e a "competição" com o namorado dela moveu seus instintos. Ele era o bom amigo, confidente e irresistível. Sempre sonhou em ser pai e ter uma família.

Enquanto Bruna cedia às investidas dele, separava do então namorado e começava a se relacionar com Rogério, ele começou a se ocupar de controlá-la. Virou tão ciumento quanto como fora antigamente com outras parceiras. Mas Bruna nunca foi o tipo de mulher que tinha o relacionamento como único desejo da vida e tratou logo de impor limites na ciumeira dele.

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Rogério a admira justamente por ser independente e uma ótima parceira e vivia nessa ambivalência de aceitá-la ao mesmo tempo que desejava que ela fosse mais "dócil". O ápice foi quando ela decidiu fazer intercâmbio nos Estados Unidos, que ele teve que apoiar, mas definitivamente o deixou inseguro. Quando ela voltou, decidiram se casar, mas os episódios de disfunção erétil começaram a ocorrer.

Sessão vai, sessão vem, um dia Rogério faz duas reclamações: Bruna não sabia cozinhar e não queria ser mãe naquele momento. Por isso, me explica, eles usavam preservativo desde que ela decidiu parar de tomar anticoncepcionais para ficar livre de hormônios sintéticos.

Quando perguntei qual era o cenário sexual que os inspirava, enquanto ela curte um vinhozinho e uma pegação no sofá, ele não titubeou: "Ser pai".

Então Rogério me contou que das vezes que fizeram sexo e ele pôde gozar dentro dela, teve um prazer enorme, mesmo que Bruna tenha ficado completamente raivosa com a situação.

Depositar seu sêmen no canal vaginal da mulher era, para ele, sentir-se macho, amado e aceito. A camisinha era uma barreira concreta - ver seu sêmen ali "contido" no látex era broxante. Para ele, não fecundar a fêmea, mesmo que seja só uma "possibilidade", era fazer um sexo incompleto.

O ser humano é mesmo complexo. Mesmo que um casal use método contraceptivo, ainda assim alguns homens podem perder a ereção pelo pavor de engravidar alguém, e outros justamente o contrário — o erotismo que está ancorado na fantasia de ser pai, o escolhido para os filhos da fêmea, o fecundador.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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