Gilson tem tara por pés e quer dominadora, mas como pedir isso para Elisa?
Gilson tem relações sexuais prazerosas com a namorada, Elisa, em práticas ditas "tradicionais", mas sua fantasia é mesmo de ser dominado e beijar-lhe os pés sujos com cheiro de chulé. A não realização desse desejo o frustra.
Embora ele não tenha ainda se declarado para Elisa um podólatra convicto, seus traços de idolatria e servidão aparecem quando ele revela que seu tesão é ver a parceira excitada e que lhe dar prazer é seu maior objetivo. Diz que se precisasse escolher entre dar ou receber sexo oral, sem dúvida nenhuma prefere mil vezes oferecer.
Embora ele não tenha chamado sua namorada de Domme, quando fala dela é com tal amorosidade que eu imagino como essa mulher está confortável nessa relação.
Na relação cotidiana dos dois, equilibram interesses e desejos, embora ele admita que é uma pessoa fácil de agradar e que o mais importante é deixá-la feliz, o que faz naturalmente a balança da dominância pender para o lado dela. Demonstra amor com ações cotidianas, como acordar mais cedo para fazer o café da manhã, esperá-la chegar do trabalho com o almoço pronto e a casa arrumada.
Acontece que, embora ele já tenha demonstrado o interesse pelos seus pés, falta a Elisa a atitude de dominância. De vez em quando ela pede para ele os beijar, mas sem uma atitude que lhe coloque no papel de dominação que verdadeiramente o excita. Além disso ele sente que ela não dá muita importância para o assunto, embora tenha acolhido a informação sem julgamentos. Claramente suas fantasias sexuais não passam por aí. E é aí que Gilson me conta o seu dilema:
Me sinto extremamente desconfortável com esse paradoxo: exigir que a mulher tenha uma atitude dominadora não me torna, no fim das contas, o dominador? A atitude de superioridade, se não é genuína e é apenas feita como uma demanda minha, parece perder a graça, afinal o objetivo maior é o prazer dela.
Considero que Elisa pode simplesmente não se identificar com o papel de dominadora. Se de um lado ter um parceiro amoroso e dedicado no dia a dia é uma benção dos céus, ter um "escravo" sexual pode ser, ao longo do tempo, frustrante.
Elisa pode querer também, no sexo, um homem que seja mais dominador, que a desafie, por exemplo. Sendo a relação deles tão afetiva, mandar, exigir, mesmo sendo parte de um jogo, pode ser que pareçam a ela atitudes que entende serem contrárias ao amor. Para Gilson é o oposto, mas sua namorada precisa fazer essa desconstrução, e isso pode levar algum tempo.
Por outro lado, fico aqui pensando se ele também não tem medo de ficar totalmente vulnerável nessa relação, o impedindo de avançar na realização do seu desejo.
Uma coisa é, no campo da fantasia, nos vermos humilhados ou moralmente incorretos. Outra é enfrentar a vergonha dessa descoberta no concreto. Talvez por isso ele não abra o jogo, contando a Elisa o quão importante é, para a sua excitação, adorar os pés dela, subjulgado.
Embora eu compreenda a lógica dele de tornar-se "dominador", caso seja mais assertivo sobre o seu desejo, mantendo o silêncio deixa o desinteresse dela pela prática ligeiramente sugerida, lhe impingindo a situação de dominado; se não é pelos pés, é pela falta de disponibilidade dela.
Então, de alguma forma a Elisa, já está com o chicote na mão, pois o mantém na política da escassez: dizem que o desejo nasce na falta - o que talvez lhe alimente a expectativa de, em algum momento, ter-lhe os tão poderosos pezinhos.
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