'Mulher de verdade' é quem faz o que acredita - inclusive sexo no 1º date
Mulher de Verdade
A Jussara tem 28 anos, é uma mulher extrovertida, divertida e cheia de vida. Atualmente está solteira, vivendo as agruras dos desencontros da atualidade e carente de um bom sexo com homens que a tratem com cuidado e respeito.
Outro dia conheceu Rogério, aleatoriamente, quando estava na lanchonete. Desse jeito meio "antigo", quando as pessoas paqueravam as outras nas atividades cotidianas, sorriam, pediam telefone. Era na fila do banco, no supermercado, no transporte público, no elevador de um prédio comercial qualquer, no trânsito.
Depois de algumas trocas de mensagens, Rogério combinou de dar uma passadinha em um bar onde Jussara estava, num sábado, começo da noite. Mas ele não apareceu, o que a deixou desanimada. "Mais um", pensou ela com seus botões, "que inferno essa falta de comprometimento". Mas ele se desculpou e ela resolveu dar mais uma chance para o rapaz.
Rogério foi buscar Jussara com o convite de levá-la para uma festa. Eis que a festa era na casa do tio dele, a família toda presente, uma saia tão justa que faltava ar para respirar. Estava até agradável, não fosse o fato de a mãe do rapaz grudar nela, com aquela simpatia meio forçada que só as mães sabem ter, investigando a vida da Jussara de forma dissimulada, como quem não quer nada, soltando uma pergunta ali outra acolá.
Quando finalmente foram embora, esticaram para um pagode, onde passaram momentos adoráveis juntos, dançando, cantando e trocando beijos ardentes. À noite, enfim, prometia.
Rogério sugeriu que Jussara fosse para casa dele, mas ela, a fim de se sentir mais segura, o convidou para a sua casa. Se atracaram no sofá da sala, uma pegação maravilhosa e expectativas foram criadas sobre uma boa noite de sexo.
Foi quando a Jussara começou a avançar o sinal, querendo transar e Rogério simplesmente interrompeu o fluxo dizendo que eles não iam fazer sexo no primeiro encontro, porque ele ia tratá-la como uma "mulher de verdade".
Eu não sei em que momento esse menino está, em qual planeta ele vive, quem sabe foi só uma desculpa para sua ansiedade de desempenho, o medo de perder a ereção, ou tivesse uma pereba no pênis e não pudesse transar.
O fato é que a tal "mulher de verdade" deixou Jussara tão indignada, pois que estava ali tão somente a fim de usufruir do prazer e da conexão que prometia ser boa. Era o desejo feminino, mais uma vez, sendo castrado e embalado para presente.
Como se o "respeito" que Jussara merece fosse baseado na capacidade dela de se conter sexualmente, e de ser aceita no ambiente familiar do pretendente. Tudo acontecendo na cabeça de Rogério, nas suas fantasias sobre o que é uma parceira ideal.
Essa imagem da mulher de verdade, ou do homem de verdade, é a maior distorção, porque não é possível ser "de verdade" se o que se espera está baseado no julgamento sobre condutas pré-estabelecidas.
Ser homem ou ser mulher é uma busca identitária que, quando bem-sucedida, desemboca em ser pessoa genuína, que pode decidir o que pensar, valorizar e ser. As pessoas que se sentem mais felizes em suas vidas, são as que encontraram a sua autenticidade e nada é tão broxante para elas, do que estar com alguém que não as legitime pelo que são.
A chave da autenticidade é a autodeterminação, ser dono da própria vida, escolher o que compõe a narrativa da própria história, dar sentido sobre porque fazemos e escolhemos determinados comportamentos ou caminhos.
Do outro lado, a inautenticidade tem relação com fazer as coisas para agradar os outros ou a si mesmo — no sentido da imagem que se deseja passar e não da essência de quem se é — e isso torna as pessoas mais confusas, pois já nem sabem ao certo porque estão ali.
Newsletter
OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receberRelações sustentadas por crenças prévias impedem que uma conexão íntima se estabeleça, porque daí é um encontro de imagens e não de pessoas "de verdade".
Deixe seu comentário