Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Luiza Trajano e Simone Tebet: por que mulher só é procurada para ser vice?
Alguns dias separam a confirmação da pré-candidatura da senadora Simone Tebet à Presidência da República pelo MDB - até então a única mulher no pleito para 2022 - e a fala provocativa da dona da Magazine Luiza, Luiza Trajano, no STF, sobre mulheres serem procuradas apenas para serem vice de homens nos processos eleitorais.
Uma coisa não contrapõe a outra, no entanto. Nas últimas semanas, essas têm sido falas recorrentes entre candidatos como o governador de São Paulo e pré-candidato do PSDB à Presidência da República, João Doria. Em entrevista ao Poder 360, ele reafirmou sua intenção em buscar uma vice mulher e se referiu à Tebet: "Ela sempre foi competente, séria, dedicada como mulher, mãe, política, senadora. Enorme respeito pela senadora e pelo MDB, que é parte de nossa base aliada em São Paulo". Destaque para o "dedicada como mulher" e "mãe".
Em entrevista ao UOL, Simone comentou sobre declarações que têm sido feitas por seus colegas homens, de que ela seria uma "excelente vice". "Não me tratem diferente: eu sou pré-candidata a Presidente da República. Eu não aceito nesse momento conversar sobre nenhum outro posto que não seja esse".
E reforçou que não quer ser posta como vice apenas por ser mulher. Mas sinalizou ao eleitorado de direita do partido dizendo que quer lutar ao lado dos homens e fazer um governo cristão.
Desde a redemocratização do Brasil, apenas oito mulheres se candidataram ao posto de chefe do Executivo. A primeira foi Livia Maria Ledo Pio, pelo Partido Nacionalista em 1989. Depois Thereza Ruiz (1998), Ana Maria Rangel (2006), Heloísa Helena (2006), Marina Silva (2010 e 2014), Luciana Genro (2014) e Dilma Rousseff (2010 e 2014) - única mulher eleita presidente da história do país. Em 2018, houve a candidatura de Vera Lúcia (PSTU). Manuela D'Àvila (PCdoB) desistiria para se aliar a Lula e Fernando Haddad, do PT.
Misoginia e assédio
Há poucas semanas, comentei aqui na coluna sobre o caso da deputada estadual Isa Penna (PSOL) que foi assediada por um colega deputado em plena sessão no Plenário da Câmara e lembrei como o hoje presidente da República Jair Bolsonaro disse à deputada federal Maria do Rosário (PT) que não a estupraria porque ela "não merecia".
A misoginia na condução do impeachment de Dilma também é um símbolo de por que precisamos de mais representatividade política. Em entrevista ao Brasil de Fato, a professora da área de Estudos Linguísticos da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) Perla Haydee da Silva, autora da tese de doutorado "De Louca a Incompetente: Construções Discursivas em Relação à Ex-Presidenta Dilma Rousseff" contou que, ao analisar comentários em que a ex-presidente era citada na página do Movimento Brasil Livre (MBL) no Facebook, era possível perceber que existiam três principais eixos:
- O de questionar a capacidade mental e intelectual de Dilma (com termos como "burra" ou "louca").
- O de colocar como pauta a vida sexual da presidente (a chamando de "prostituta").
- O de categorizá-la como "nojenta".
Segundo o estudo, a maioria disparada de xingamentos à Dilma Rousseff eram relacionadas ao seu gênero.
Brasil pior que Afeganistão
Os números de mulheres na política ainda são baixos e o Brasil perde para quase todos os países da América Latina em paridade de gênero, à frente apenas do Paraguai e do Haiti. Enquanto no Brasil as mulheres ocupam 15% da Câmara dos Deputados e 12% do Senado, no Afeganistão, por exemplo, as mulheres ocupam 27% das cadeiras do Parlamento.
Esses números são ainda mais preocupantes pensando que mulheres são mais de 51% da população brasileira, ou seja, há realmente uma desproporção nessa representatividade.
Por conta disso, recentemente o Supremo Tribunal Eleitoral determinou que ao menos 30% do fundo especial de financiamento de campanha devem ser gastos em candidaturas de mulheres.
É claro que não se deve votar em alguém apenas por seu gênero - é preciso avaliar projeto de governo, alinhar ideias e visões de mundo. Mas a disparidade de gênero na política é uma realidade no Brasil e não pode passar incólume por mais um processo eleitoral.
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