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Andrea Dip

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Como bolsonarismo usou mulheres e as descartou ao terem opiniões contrárias

A então bolsonarista Joice Hasselmann e Jair Bolsonaro, em 2018: atacada pelo próprio bolsonarismo, deputada foi limada do jogo político ao criticar presidente - Reprodução / Twitter / Joice Hasselmann
A então bolsonarista Joice Hasselmann e Jair Bolsonaro, em 2018: atacada pelo próprio bolsonarismo, deputada foi limada do jogo político ao criticar presidente Imagem: Reprodução / Twitter / Joice Hasselmann

Colunista de Universa

05/10/2022 11h36

"Alguém sabe se a Joice Hasselmann foi reeleita?" perguntou Bolsonaro de forma retórica e em tom de chacota em frente ao Palácio da Alvorada neste domingo (02), após as eleições. A resposta veio de seus apoiadores em coro: "Não!"

Em 2018 Joice, que na época era do mesmo partido de Bolsonaro, o PSL, foi uma das mulheres que mais defendeu publicamente a eleição dele, chegando a se declarar uma "Bolsonaro de saias". Em um momento de alta rejeição entre as mulheres, marcada pelos protestos de rua que gritavam "ele não", foi peça-chave para a eleição do atual presidente.

Recebeu um milhão de votos para a Câmara dos Deputados, que fizeram dela a deputada federal mais votada em São Paulo. Chegou a ser nomeada líder do governo no Congresso em 2019 mas foi destituída porque o presidente queria no posto um de seus filhos, Eduardo Bolsonaro.

Quando discordâncias e divergências começaram, sua destituição e rompimento com o governo foram imediatos —mas não foram tranquilos ou sequer civilizados. Eduardo Bolsonaro liderou um massivo ataque à deputada nas redes sociais, que foi ameaçada e ofendida sobretudo em sua aparência física (como são sempre os ataques às mulheres).

Em 2022, candidata pelo PSDB, recebeu 13.679 votos e não conseguiu a reeleição. "O que vivi foi um estupro moral. Quando começamos a nos desentender, Bolsonaro trouxe os filhos para ele, os defendeu. Me vi atacada por defender aqueles que sempre ajudei" declarou, em 2020, em entrevista a Universa. "Não percebia que estava sendo tão violentada. Dizia que nunca seria vítima de machismo, que era uma bobagem. Que Bolsonaro era machão, não machista. Mas realmente existe uma violência de gênero política muito grande com a mulher. Aprendi da pior forma.

Algo parecido aconteceu com Janaina Paschoal (PRTB), advogada que foi uma das autoras da petição que deu início ao processo de impeachment de Dilma Rousseff em 2016. Em 2018, chegou a ser cogitada como vice na chapa de Bolsonaro, mas saiu como candidata a deputada estadual em São Paulo. Conseguiu mais de 2 milhões de votos, o máximo que um parlamentar já recebeu no Brasil para uma assembleia legislativa.

Durante os últimos quatro anos, disse que Bolsonaro não era machista e nem autoritário, apoiou a desconfiança com a urna eletrônica e atos antidemocráticos de Bolsonaro no 7 de setembro de 2021. Ao mesmo tempo, desentendimentos começaram durante a condução do presidente à crise gerada pela covid-19. Tornada então em inimiga do bolsonarismo, nas últimas eleições, buscou vaga ao Senado por São Paulo, mas não conseguiu entrar. Bolsonaro decidiu apoiar seu ex-ministro Marcos Pontes e outra mulher foi descartada quando não parecia mais necessária.

"Eu não esperava que ele (Bolsonaro) atuasse para me atrapalhar", reclamou Janaina em dado momento da campanha. Ainda em 2019, quando criticou bolsonaristas na Alesp, sofreu ameaças nas redes sociais e em seus telefones e precisou chamar a polícia. Recentemente, diz ter sido "tratada como lixo por ex-aliados" que preferiram apoiar outros homens.

A lista de mulheres que apoiaram Bolsonaro em algum momento de sua campanha e foram descartadas quando não eram mais "necessárias" parece longa. Até mesmo sua mais fiel ministra, Damares Alves, recebeu apoio de Michelle Bolsonaro durante sua candidatura ao Senado Federal por Brasília, mas não do presidente, que apoiou a candidata de seu partido, Flávia Arruda. Damares foi eleita mesmo assim, mas sem o apoio oficial de Bolsonaro.

E o que dizer de Sara Winter? Que liderou o movimento armado dos "300" em favor de Bolsonaro em Brasília, apareceu ao seu lado em diversas ocasiões posando como "ex-feminista" e, quando foi presa por atacar o presidente do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, em 2020, foi abandonada pela familia Bolsonaro e seus apoiadores. Fontes apontam que Sara teria uma dívida de mais de R$ 3 milhões referentes a processos judiciais.

As "mulheres de Bolsonaro" parecem importar apenas quando ele as julga úteis, trampolins, ponto de impulso na tentativa de conquistar simpatia ou empatia sobretudo de outras mulheres. Mas ai daquelas que ousam discordar ou levantar suas vozes: serão atacadas, abandonadas, limadas e depois esquecidas. Esse é o preço que o bolsonarismo tem cobrado das mulheres políticas que o apoiam.