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ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

A mãe de Henry já foi condenada por mais de 200 milhões de jurados

Monique Medeiros: estamos julgando a mãe de Henry antes da hora? - Tania Rego/Agência Brasil
Monique Medeiros: estamos julgando a mãe de Henry antes da hora? Imagem: Tania Rego/Agência Brasil

Colunista de Universa

12/04/2021 15h51

Um crime hediondo. Uma criança desprotegida. Um assassino vistoso, rico e poderoso. Uma família branca, linda, de classe média alta. Uma mulher vaidosa. Mãe da vítima. Cúmplice no crime. A morte de Henry reúne tantos elementos mesmerizantes que fica quase impossível evitar o assunto.

Todos, inclusive eu, se veem meio que obrigados a falar dele, dar sua opinião, julgar os envolvidos. Digo inclusive eu porque já trabalhei, como jornalista, em histórias assim. E se aprendi alguma coisa nesta carreira é que julgamentos apressados - tanto da polícia quanto dos jornalistas - podem ser injustos e destrutivos.

Então, vou falar sobre o assunto. Não para apontar o dedo na direção dos acusados. Nem para defendê-los, isso é trabalho para profissionais: investigadores, advogados. Quero apenas provocar o leitor com algumas reflexões. Quero falar da mãe.

O que um caso assim faz com a gente, em primeiro lugar? Nos revolta. Onde já se viu uma mãe deixar que o filho seja maltratado, espancado e morto pelo homem com quem se dorme? Onde já se viu uma mulher educada - foi diretora de escola -, com recursos e acesso à proteção, caso fosse necessário, ser omissa e conivente? Como ela não fez tudo o que podia para proteger sua criança? Não é esta a missão primordial de uma mulher? Gerar e proteger? Muito fácil julgar uma personagem assim. Mais do que o suposto assassino, com suposto histórico de maus-tratos aplicados a crianças, a mãe que não cumpre o seu papel é quem nos revira o estômago e nos enche de ira.

Monique está sendo investigada como criminosa, mas já a condenamos como mãe. Fria, foi fazer unha na manicure um dia depois do enterro do filho. Fria, trocou duas vezes de roupa antes de prestar seu depoimento aos policiais. Fria, fez uma selfie na delegacia. Fria, não chorou.

Em uma inversão do caso da mulher de César, não basta ser péssima mãe, tem que parecer também. Se o vereador viesse a ser inocentado das acusações, você consegue vê-lo voltando à vida, retomando seu cargo público, talvez tendo outros filhos. Mas a reputação de Monique, mesmo que também fosse inocentada, já foi pro beleléu.

Jamais poderia ser mãe novamente sem que uma enorme suspeita a acompanhasse por toda a vida. E não devemos esquecer que, por mais fartas que sejam as informações sobre o caso que a polícia se prontificou a dividir conosco, o crime ainda está na fase de investigação. As coisas podem mudar.

Mesmo sem nos darmos conta disso, somos implacáveis com mulheres que não se comportam como as mães que deveriam ser. Com a mesma intensidade que endeusamos as mães no Brasil, exigimos delas o cumprimento de um modelo rígido, o de santa. Acontece que sempre existiram e sempre existirão boas, más e medianas mães.

Fico incomodada quando ouço colegas de profissão falarem do caso como se fossem repórteres policiais de programas escandalosos. Eles estão tão chocados e parecem não entender como é possível que a mãe seja apontada como cúmplice. Mas uma mãe... Como ela foi capaz?

Todas nós, mães, nos projetamos em Monique para repudiá-la, afastar da gente uma mulher que nos macula como grupo. Precisamos jogá-la na fogueira, ela parece culpada do mais imperdoável dos crimes: não amar o filho o suficiente. Essa ideia é incômoda e perturbadora demais para que a olhemos com distanciamento. Simplesmente não a suportamos.

Ah, então, deixar que matem seu filho é ok? Claro que não é ok. É muito pior que ok. Monique pode vir a ser revelada como a mais pérfida vilã deste planeta e, se for culpada do crime pelo qual está sendo acusada, espero que receba a condenação devida. Mas não antes do tempo. E nem por outro motivo.

Mães não precisam de carga extra de culpa e de castigo em nenhuma circunstância. Nem nas mais extremas.

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