Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Já sabe por que o racismo não foi tema do debate presidencial? Eu te conto
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O primeiro debate entre presidenciáveis organizado por um pool de veículos de comunicação no último domingo (29) foi marcado por falas cheias de cinismo e machismo. Mas a total ausência de pessoas negras entre os candidatos e jornalistas fazendo perguntas marca, também, uma característica violenta do racismo estrutural brasileiro: a invisibilização dos negros.
É como se houvesse uma conspiração silenciosa para que os negros ficassem de fora dos espaços de tomada de decisões, e consequentemente, da construção de uma sociedade igualitádia e plenamente democrática.
Embora o pleito eleitoral de 2022 conte com dois candidatos negros ao Palácio do Planalto —Vera Lúcia (PSTU) e Leonardo Péricles (Unidade Popular)— durante o debate o país mostrou mais uma vez a sua cara e evidenciou que a democracia brasileira é uma festa para poucos ao deixar de fora os dois candidatos e negar as mazelas que o racismo produz.
Durante toda a discussão, o racismo, principal problema brasileiro, sequer foi citado pelos candidatos ou apareceu em perguntas feitas pelos jornalistas que, mesmo sendo todos brancos, possuem ou deveriam possuir conhecimento suficiente para entender que a principal vítima da desigualdade no país é a população negra.
A presença de candidatos e jornalistas negros no debate não garantiria que o tema racial esteja presente nas argumentações, mas traria uma relevante representatividade, permitindo que soluções em direção ao desenvolvimento social, político e econômico do país tenham a participação de diferentes atores.
O Brasil vem assistindo passivamente ao avanço de um fenômeno que até poucos anos atrás não dava as caras em terras tupiniquins. A ideologia nazifacista atravessada pela supremacia branca tem encontrado terreno fértil para florescer durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) que, com atitudes que validam o extermínio de pessoas pretas e pardas por parte de agentes de segurança pública e com falas racistas, empodera sujeitos que se valem dessas ideologias para agredir e matar.
Quem também ficou de fora da festa particular foram os povos originários. A devastação ambiental foi citada de leve, Amazônia e povos indígenas sequer foram mencionados. Vários países do mundo estão de olhos abertos para a destruição que vem ocorrendo no território amazônico e, nós, assistindo a boiada passar sem nem ao menos nos emocionar.
No governo Bolsonaro, o desmatamento na Amazônia bateu um novo recorde e cresceu 57%, segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. Uma política antropológica genocida promove o extermínio dos Yanomamis que estão perdendo suas terras, seus filhos e suas vidas para garimpeiros, madeireiros e criminosos de toda a sorte que ocupam o território.
É flagrante que o debate racial está longe das candidaturas à presidência. Mas nós, como cidadãos, temos a oportunidade de mudar a cara do Congresso Nacional. Esta é a eleição com maior percentual de candidatura de negros desde 2014, quando se iniciopu a autodeclaração de raça. Para a disputa de 2022, 49,49% dos candidatos se declararam pretos ou pardos. Escolher esses candidatos é de suma importância para que a questão racial deixe de ser um impasse para a democracia.
Há 20 anos, durante uma palestra proferida na Conferência Nacional do Instituto Ethos, uma das maiores intelectuais do país, a filósofa Sueli Carneiro, me emocionou com palavras que alimentaram minha esperança na luta pela igualdade racial no Brasil e ainda ecoam em meu sonho ativista. Sueli se referiu à população negra como parte da solução da desigualdade social no país: "Queremos ser corresponsáveis por promover e proteger uma ordem adequada ao desenvolvimento em termos políticos, sociais e econômicos. Queremos conquistar o direito de oferecer ao desenvolvimento deste país nossa inteligência, nosso vigor físico, nossa herança cultural, nossos valores espirituais, nossa criatividade, nossa extraordinária capacidade de resistência. E para que possamos nos tornar agentes ativos no progresso do Brasil".
Nós, negros, somos a chave para o progresso, mas a elite brasileira precisa para de forçar o fechamento dos portões.
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