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Cris Guterres

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Nos orientaram a não falar de sexo e não transar no 1º date. Descumpri tudo

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Colunista de Universa

28/06/2023 04h00

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A última edição do Universa Talks reuniu, no sábado (24), um time de mulheres incríveis e fez uma celebração às paixões. Claro que eu não ficaria de fora de um evento como esse e ocupei meu lugar de honra como apresentadora conduzindo diálogos sobre os desejos que movem as mulheres no trabalho, na família, nas amizades e também no sexo, muito sexo.

Teve um interessantíssimo Museu do Vibrador e conversas fluidas sobre sexo na maternidade com Rafa Brites; teve Luiza Brunet falando de sexo após os 60 anos; e teve também o lançamento da pesquisa "Prazeres Universa + Tech4Sex" durante a edição especial do "Sem Filtro" que eu e a jornalista Camila Brandalise gravamos. Tivemos a presença da empresária Lídia Cabral, fundadora da Tech4Sex, e Mayumi Sato, CMO da Sexlog, a maior rede social de sexo do Brasil.

Conversa boa, de qualidade e com muitos insights sobre o comportamento sexual da mulher brasileira. Universa está de parabéns, pois criou um espaço seguro para as mulheres expressarem voz e autonomia sobre seus próprios corpos e se sentirem confortáveis para manifestar suas opiniões sobre sexo.

Mesmo com tantas conquistas femininas, o que me chama a atenção em meio a tudo é que nós, mulheres, ainda somos tachadas quando ousamos falar abertamente sobre nossos desejos sexuais. Já me senti julgada por expressar o que me dá prazer quando o assunto é sexo e sei que você, que fala sem medo sobre o que gosta e o que não gosta, provavelmente já recebeu o selo "não é para casar" alguma vez na vida.

Pra mim, o julgamento, muitas vezes, vem na frase: "Você assusta os homens". Ai, como eu tenho ódio dessa frase. Se ficou assustado, cai fora, meu bem, que aqui eu tenho atitude. Desde cedo, recebi o manual de conduta feminina para mulheres que querem casar. Entre as orientações que nos são dadas ao longo da vida estavam: não falar de sexo em público e não transar na primeira noite com o futuro pretendente. Não cumpri nenhum dos dois. Tem mais um monte de regra que posso citar aqui, mas só essas duas já me causaram várias situações de desconforto e culpa.

Muitos homens ousaram tentar me ensinar como eu deveria me comportar se quisesse ter um relacionamento sério com alguém. Mandei todos para um lugar distante e impronunciável. Nunca fui de obedecer a seres do sexo masculino, ainda assim, diante de tanta opressão, já me peguei varias vezes reavaliando minha conduta com um boy que parecia mais interessante.

Existe um duplo padrão de gênero que coloca expectativas diferentes para homens e mulheres em relação à sua sexualidade.

Enquanto a masculina é encorajada e até glorificada, a feminina é frequentemente reprimida e considerada inapropriada ou promíscua. O julgamento está enraizado em valores e crenças conservadoras, que tendem a impor ideias restritivas sobre o comportamento sexual feminino e que associam as conversas abertas sobre sexo à falta de moralidade e decência.

Na última edição do reality "Casamento às Cegas", que está sendo apresentado na Netflix, um dos participantes do grupo masculino incitou uma das integrantes do grupo feminino a falar sobre sexo. Insistiu em perguntar sobre a posição que ela mais gostava, sobre o tamanho do órgão masculino que mais a agradava. Colocou a moça numa situação de visível desconforto e, depois que ela respondeu todas as questões, ele alegou que nunca se relacionaria com uma mulher que fala abertamente de sexo. A moça, curiosamente uma mulher negra, recebeu o carimbo de "não é para casar" por ter se manifestado sobre seus desejos publicamente.

Na verdade, o que nossas conversas nos trazem é uma compreensão mais saudável, relações mais igualitárias e a uma maior conscientização sobre a importância do consentimento, da educação sexual e do respeito mútuo. Mas parece que nem todo mundo tem essa mesma compreensão, e uma das razões para a permanência desse tabu é a vontade de continuar formando mulheres belas, recatadas e do lar para casar com homens que desejam manter a superioridade diante de nós.

Mulheres podem e devem falar sobre sexo para promover o conhecimento pessoal e ir em busca da igualdade de gênero e de relacionamentos saudáveis. É fundamental desafiar os estigmas em torno da sexualidade feminina e exigir nosso direito de dar voz sobre nossas próprias vidas e experiências.

Mais do que falar, nós também queremos gozar.