Cris Guterres

Cris Guterres

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Opinião

'A IA é imparável e não deve gerar medo': como nos preparamos para o futuro

Olha eu aqui mais uma vez falando de SXSW 2025, o meu convite a enxergar o futuro por múltiplas lentes. E que futuro! Foram dias de imersão em um festival que se multiplica em milhares, porque cada pessoa que caminha por Austin, cerca de 300 mil pessoas, durante essa semana intensa, leva consigo um olhar único sobre tudo o que acontece. E olha que acontece muita coisa!

Eu estive lá, de caderno (digital, claro) na mão, olhos atentos e ouvidos ainda mais. Entre palestras, shows, encontros inusitados e muitos quilômetros percorridos entre um painel e outro, o festival se revelou uma experiência viva e pulsante.

Este foi meu primeiro SXSW, e eu vivi essa experiência com o olhar de criança que acabou de ganhar um brinquedo novo. Tudo parecia gigante, cheio de possibilidades, de descobertas e de surpresas. Este é meu último texto sobre a viagem, e muita coisa já foi dita nas colunas anteriores. Então, o que você vai ler aqui é uma breve curadoria dos temas que mais me marcaram.

Inteligência Artificial: quem manda em quem?

Se teve um tema que dominou os corredores do festival, foi a IA. De robôs emocionais a ferramentas que prometem revolucionar o trabalho (ou acabar com ele?), a tecnologia foi discutida em todos os seus tons, do otimismo exacerbado ao ceticismo necessário. O debate sobre ética e regulação ganhou ainda mais força, porque, convenhamos, uma IA sem rédea pode virar um pesadelo cinematográfico (alô, Black Mirror!).

Assim como eu, que vivenciei meu primeiro SXSW com um olhar de descobertas, Barbara Sapunar, Diretora Executiva de Business Transformation da Nestlé Brasil, também percebeu a grandiosidade desse encontro de ideias. "Apesar da IA generativa dominar a agenda do festival, há um movimento de reconexão com o humano: saúde social e poder dos conhecimentos ancestrais foram temas tão relevantes quanto a tecnologia. A IA é imparável e não deve gerar medo. Segundo Amy Webb, ao fazer 'do futuro' o 'meu' futuro, trazemos concretude e decisão, um futuro próprio, sem medo e desejável, construído com as decisões de hoje", comenta Barbara.

As redes sociais seguem vivas? mas até quando?

Outra grande pauta foi o futuro das redes sociais. Com mudanças drásticas acontecendo no TikTok, discussões sobre regulamentação e um possível novo modelo de internet mais descentralizado, paira no ar a pergunta: o que vai sobreviver? A resposta ainda não está clara, mas o consenso é que criadores de conteúdo precisarão se reinventar constantemente. Na verdade já o fazem, mas estarão cada vez mais obrigados a isso.

Computação Quântica: o que vem por aí?

Se você acha que a Inteligência Artificial já deu nó na cabeça, segura essa: a computação quântica chegou para deixar tudo ainda mais futurista. A promessa? Resolver problemas complexos que hoje levariam décadas em segundos. A IBM e outras gigantes trouxeram painéis discutindo como essa tecnologia pode revolucionar a medicina, a cibersegurança e até a economia. É aquele assunto que faz você repensar tudo o que sabe sobre tecnologia, e talvez te faça sentir um pouco analógico.

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Longevidade e Futurismo: queremos viver mais, mas como?

Se antes a discussão sobre envelhecimento saudável parecia restrita a um nicho específico, agora é pauta de todas as indústrias. Empresas de biotecnologia apresentaram soluções inovadoras para qualidade de vida, desde terapias genéticas até novos modelos de trabalho que respeitam as necessidades de um mundo onde as pessoas vivem mais. A pergunta que fica: estamos preparados para essa nova realidade?

Diversidade: um avanço tímido

O SXSW se propõe a ser um espaço de inovação, mas quando se trata de diversidade, ainda há um longo caminho a percorrer. A diversidade racial e de gênero ainda é pequena tanto nos palcos quanto na plateia. Embora algumas iniciativas busquem trazer mais vozes diversas para o evento, o número de palestrantes negros, indígenas e trans ainda é limitado em comparação à quantidade de painéis sobre tecnologia, negócios e inovação.

Nas discussões, o tema apareceu em diferentes momentos, como no painel sobre equidade racial na indústria da tecnologia, que destacou as barreiras enfrentadas por profissionais negros no Vale do Silício. Também houve espaço para conversas sobre a sub-representação de mulheres e a importância de ampliar a participação feminina em espaços de liderança e inovação. Mas a pergunta que fica é: quando isso deixará de ser uma pauta para se tornar uma realidade evidente?

Música, moda e presença brasileira

E não foi só de tecnologia que se fez o SXSW 2025! A música segue sendo um grande destaque do festival, com mais de mil shows espalhados por Austin. A cena independente brilhou, e artistas brasileiros marcaram presença com performances que encantaram públicos do mundo todo.

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No quesito moda, as ruas se transformaram em passarelas improvisadas, onde a criatividade tomou conta. Looks futuristas, muita alfaiataria desconstruída e um mix entre vintage e tecnologia dominaram as tendências. Entre os meus destaques musicais, os londrinos do Steam Down apresentaram uma fusão vibrante de jazz, hip-hop e afrobeat, cativando os espectadores com sua energia contagiante. Não consigo para de ouvir, eles estão reinando na minha playlist. O brasileiro Jonathan Ferr, uma revelação do jazz nacional, trouxe ao festival seu "Urban Jazz", que combina hip-hop, rock, música urbana brasileira, neo soul e eletrônica.

A SP House, espaço oficial de São Paulo no festival, foi sucesso. Recebendo mais de 15 mil visitantes de 55 nacionalidades. O espaço trouxe 32 horas de conteúdo, incluindo painéis, masterclasses e shows. Este ano, a grande novidade foi a área business exclusiva, que se tornou um ponto estratégico de networking e conexões internacionais. A SP House foi palco de discussões sobre inteligência artificial no Brasil, economia criativa periférica, tecnologia social e inovação urbana.

Outro destaque foi o painel "Clipe da Quebrada", que apresentou o projeto de videoclipes criados por diretores de pequenas produtoras para artistas das Fábricas de Cultura, garantindo visibilidade a talentos periféricos. Além disso, o evento anunciou o SP2B, um novo festival que ocupará o Parque Ibirapuera em 2026, consolidando São Paulo como um hub global de criatividade e negócios.

O SXSW é um festival ou mil? O que isso tem a ver com o Brasil?

Adaptação e resiliência. Se eu tivesse que escolher duas palavras para definir o SXSW 2025, seriam essas. Adaptação é sobre mudar rápido, entender o que está acontecendo e reagir. Resiliência é sobre aguentar a pressão, continuar de pé e seguir em frente, mesmo quando tudo parece desmoronar.

E se tem um povo que entende disso na prática, é o brasileiro. A gente cresce no caos, dribla dificuldade como quem joga futebol de rua e inventa solução pra problema que nem sabia que tinha. Um país que vive entre crises políticas, econômicas e instabilidades de todo tipo, mas que nunca deixa de dar um jeito. A arte de resolver no improviso tem até nome: gambiarrologia. Brasileiro tem borogodó.

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Mas será que só resistir basta? O Brasil foi construído pela resistência, mas precisa ser um país onde a gente também consegue avançar. O mercado brasileiro já mostrou que sabe se reinventar diante das crises. Agora, o desafio é transformar essa reinvenção em estratégia, sair da reação para a ação, crescer com inteligência, criar nossas próprias tendências.

E se tem um ativo que o brasileiro tem de sobra, é a conexão humana. Nossa cultura é naturalmente coletiva. Enquanto mercados mais individualistas tentam criar pertencimento, a gente já nasce sabendo o que é isso. Coletivos, cooperativas, iniciativas de impacto social, a gente se junta, se apoia e se movimenta.

O grande aprendizado do SXSW é que quem souber traduzir esse senso de comunidade para o digital vai sair na frente. Mas não basta falar de futuro sem falar de um futuro inclusivo. Porque um Brasil do amanhã onde só Enzos e Valentinas tomem decisões não será o Brasil que vai avançar. O protagonismo precisa ser plural, diverso e acessível.

Enfim, o SXSW para alguns é sobre inovação. Para outros, é sobre cultura. Para mim, foi sobre estar aberta a novas perspectivas, questionar o que parecia óbvio e, principalmente, sentir o impacto real das mudanças que já estão moldando o nosso presente e que, a cada SXSW, desenham o nosso futuro.

Até o próximo!

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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