Cristina Fibe

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Opinião

Caso Antony ilustra ciclo da violência que pode terminar em feminicídio

A escalada de violência relatada pela ex-namorada do jogador Antony em reportagem de Beatriz Cesarini e Pedro Lopes é tristemente comum, e não há nada no comportamento dela que justifique as demonstrações de posse e ódio dadas por ele.

A história que a DJ e influencer Gabriela Cavallin foi obrigada a expor serve de alerta para milhares de mulheres que, neste momento, estão sob ameaça de seus parceiros ditos amorosos.

Pode parecer óbvio, mas ainda é importante frisar que não existe amor onde há violência. O que há é ódio e posse. E, em especial nos casos de homens endinheirados e celebrizados, uma terrível sensação de impunidade.

Muitas vezes é difícil para a mulher reconhecer e admitir que é vítima de uma pessoa que ela aprendeu a amar.

As relações nunca começam violentas. Mas, uma vez iniciadas as agressões, elas tendem a escalonar, e não diminuir. O fim delas, a menos que a mulher consiga denunciar e pedir ajuda, pode ser a morte.

O chamado ciclo da violência já é conhecido. Na definição usada pelo Ministério Público de São Paulo, ele tem três fases: na primeira, a evolução da tensão (com ameaças, ofensas, destruição de objetos da casa); na segunda, explosão e incidente de agressão (físicas ou verbais, e cada vez mais violentas); na terceira, a lua de mel — o pedido de desculpas, o comportamento gentil e amoroso. Depois da fase três, a um sempre volta. E volta pior.

No caso exposto por Gabriela para se proteger, vemos claramente esses três elementos. Antony chega a se vitimizar, depois pede a ela que se cuide e cuide do bebê que os dois esperavam juntos. E que ela perdeu, num período em que conta ter sofrido diversas agressões.

Na fase da lua de mel, a mulher, diante do parceiro que ama, por vezes acredita na sua reabilitação. Acredita que ele cometeu um erro, um deslize, perdeu a cabeça. Em geral, por uma provocação feita por ela.

Mas não existe justificativa para a violência — nem psicológica, nem moral, nem sexual, nem física.

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O homem que humilha, xinga, empurra, chuta e estupra uma mulher pode fazer a mesma coisa com a próxima, e assim sucessivamente. Porque esse homem vê as mulheres como seres menores, não merecedores de respeito, liberdade, autonomia. Devem ficar subjugadas a ele.

Por isso, quando percebe que as suas tentativas de dominação não surtem mais efeito, muitas vezes o homem mata: "não é minha, não vai ser de ninguém". Não raramente, o assassino destrói rosto ou regiões íntimas da mulher.

A motivação para tamanha violência jamais é o amor — não existe crime passional. Não existe defesa da honra. O que existe é uma noção tristemente disseminada de que o poder do homem sobre a mulher deve ser mantido a qualquer custo.

Por isso, não basta excluir Antony da seleção brasileira. É importante investigá-lo, puni-lo e excluí-lo de qualquer posição de poder e fama que o faça servir de exemplo para as novas gerações.

É preciso que mesmo instâncias dominadas por homens deixem mais clara a mensagem de que as vidas das mulheres importam.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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