Cristina Fibe

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Opinião

Não quero flores: quero aborto legal, menos feminicídio e Robinho na cadeia

Ah, mas pra que Dia da Mulher? E quando é o dia do homem? Por que vocês precisam disso?

(Silêncio, respira, vamos lá.)

Precisamos disso porque já estamos em 2024 e a França ainda é o primeiro — e único — país que garante a nossa liberdade de decidir se queremos e podemos levar uma gestação adiante.

E justo a França de Emmanuel Macron, um presidente que há poucos meses defendeu o ator Gérard Depardieu, acusado de atacar, importunar e invadir mais de uma dezena de mulheres. Um predador sexual exaltado pela maior autoridade do país como patrimônio nacional.

E agora exalto Macron por uma conquista histórica, um exemplo pro resto do mundo. A partir de hoje, Dia Internacional da Mulher, a Carta Magna francesa prevê "a liberdade garantida de recorrer ao aborto". Vale para qualquer mulher. Cidadã francesa ou não.

Esse direito já era previsto em lei desde 1975, mas a sua inclusão na Constituição é uma maneira de prevenir que ondas ultraconservadoras, como as que andam varrendo Estados Unidos e Brasil, voltem a ameaçar a nossa liberdade.

Enquanto isso, por aqui, nem os direitos já incluídos na legislação são garantidos. Em casos de estupro, risco de vida para a gestante ou anencefalia do feto — os únicos em que o aborto não é crime e, portanto, não pode levar a brasileira para a cadeia —, muitas vezes médicos e hospitais se recusam a fazer o procedimento.

Em algumas cidades, as maiorias masculinas nas Câmaras aprovaram recentemente leis que constrangem e aumentam o sofrimento de quem busca o aborto legal, instaurando procedimentos como o de obrigar a ouvir o batimento cardíaco do feto. Já é o retrocesso se avizinhando.

Ainda precisamos do Dia da Mulher porque na última década mais de 10 mil casos de feminicídio foram registrados no Brasil, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

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Isso significa que milhares de homens assassinaram mulheres, muitas delas em contexto de violência doméstica e familiar. Milhares de homens que pensam que suas vidas valem mais do que as nossas. O ano passado viu o pico desse índice, com quatro mulheres mortas a cada dia.

Isso num país que chega a ter dois estupros por minuto, segundo estimativa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Mais de 800 mil vítimas de violência sexual por ano.

Não surpreende que ainda haja aqui homens que defendam Daniel Alves e Robinho, dois jogadores célebres e poderosos que foram condenados por estupro.

Duas condenações que vieram de fora, da Espanha e da Itália, para nos mostrar que em algum lugar do mundo o direito da mulher ao seu corpo está sendo preservado. Daniel está preso, mas Robinho veio para cá em busca de refúgio, e foi recebido de braços abertos.

Mas ainda há esperança: a partir do dia 20 deste mês, o mês da mulher, o Superior Tribunal de Justiça vai avaliar se a condenação por estupro coletivo foi justa e se Robinho deve ir para a cadeia também.

E é isso que queremos. É por isso que ainda temos Dia da Mulher: para cobrar ações públicas e privadas que nos tragam alguma dignidade.

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Não são flores nem parabéns: queremos o direito à liberdade dos nossos corpos, à segurança de ir e vir, à busca de Justiça sem humilhações, e a tanta coisa mais. A lista é imensa e não acaba em março. Mas podemos começar pela prisão do estuprador.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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