Cristina Fibe

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Opinião

Jogadoras silenciadas e técnico do Vasco escancaram misoginia no futebol

A violência contra a mulher no futebol vai muito além dos jogadores condenados por estupro e do silêncio cúmplice dos seus parceiros.

A violência está nas jogadoras silenciadas e chefiadas por um acusado de assédio, está nas comentaristas que são alvo de sexualização e chacota por torcedores, e está nos técnicos que desqualificam árbitras apenas por serem mulheres.

O argentino Ramón Díaz, à frente de um dos mais importantes times do país, fez isso publicamente, numa coletiva de imprensa. Diante de jornalistas, o técnico do Vasco afirmou que é "complicado que quem decida no VAR seja uma mulher", referindo-se a Daiane Muniz, que trabalhou numa partida de seu time contra o Grêmio.

"O futebol é diferente", ele disse, sobre a interpretação de um pênalti feita com o uso do VAR. "Acho que é complicado, porque o futebol é tão dinâmico, tanta pressão, tão rápido, com decisões tão rápidas."

Quer dizer, por ser mulher, uma árbitra do quadro da Fifa, que já participou de Copa do Mundo, não teria a capacidade de analisar a ferramenta de vídeo numa partida masculina. Ser dinâmica, rápida, saber trabalhar sob pressão — tudo isso é coisa para macho.

Logo em seguida, algum ágil assistente do técnico avisou a ele que suas declarações tinham sido machistas, vai pegar mal, não pode mais falar em público o que se comenta no vestiário.

E então, meia hora depois, o dinâmico Ramón Díaz chamou os jornalistas para dizer: se alguém interpretou mal a minha declaração, peço desculpas. "Me pareceu que o que eu quis dizer é que uma só pessoa não pode tomar uma decisão tão importante".

Quer dizer, trinta minutos não foram o bastante para o argentino entender a gravidade do que disse. É complicado, é muita pressão dar entrevista coletiva e ainda ter que respeitar todas as pessoas.

Díaz não pediu desculpas por ter desqualificado as mulheres, reduzindo o escopo do que podem ou não fazer, associando suas capacidades a supostas competências biológicas.

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Não pediu desculpas por reforçar estereótipos de gênero que corroboram para um mercado de trabalho desigual e injusto, em que elas só conseguem entrar e permanecer se estiverem sempre atentas e agirem rápido contra as humilhações pelo caminho.

Não pediu desculpas a Muniz e a todas as mulheres, mas a quem o interpretou mal. Quer dizer, somos ofendidas e a culpa ainda é nossa. A gente é que entendeu errado.

Afastado do time feminino do Santos, seu colega Kleiton Lima teve reação parecida. Trocou de papéis, e disse estar saindo da função não por ter sido acusado de assédio moral e sexual por várias mulheres, mas sim por estar sofrendo ameaças e querer preservar a sua própria integridade física e psicológica.

Não para preservar as mulheres que denunciaram o técnico e que o viram ser recontratado para continuar mandando nelas.

Um deboche, um atestado de que nem no futebol feminino seremos respeitadas. O que só mudou, desta vez, porque jogadoras de times como Corinthians, Palmeiras, Grêmio, Internacional e Avaí estavam alertas e se manifestaram publicamente contra a atitude, colocando a mão na boca durante a execução do hino nacional.

Uma imagem simbólica do silenciamento que ainda nos sufoca, no futebol e fora dele, e que nem precisa de VAR

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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