Cristina Fibe

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Opinião

'Casamento às Cegas' chama estupro de 'assunto delicado' e segue o baile

Me dá o nome, Leandro, do que você fez comigo.

Em rede internacional, num dos principais serviços de streaming do mundo, vimos nesta semana uma mulher sangrar.

Ingrid Santa Rita, participante do "Casamento às Cegas", encarou as câmeras e ficou frente a frente com o seu agressor para implorar por respeito. Pra pedir um fio de reparação que a ajudasse a se recuperar do trauma.

Só que ela ficou sem resposta.

"Me dá o nome, Leandro."

O que nem Leandro Marçal, nem os apresentadores do programa fizeram foi dar a Ingrid, uma mulher negra, o direito ao reconhecimento do crime do qual disse, em detalhes, ter sido vítima.

Mas o que ela relatou tem nome, sim. Ela disse que Leandro a esperava dormir para atacá-la sexualmente, ainda que ela fizesse tudo para evitar esse contato. Inclusive pedir, nas palavras dela, pelo amor de Deus.

Isso é estupro, Leandro. Pior ainda: atacar sexualmente a sua companheira, quando ela está dormindo, é estupro marital de vulnerável.

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A pena é a maior possível para um crime sexual no Brasil: de 8 a 15 anos de prisão.

E, ainda que seja importante que se fale sobre essa violência num programa popular e de grande alcance, não se pode cair na armadilha de deixar uma vítima sangrar sozinha, pelas razões erradas.

O resultado que se viu na edição foi uma mulher deixando o palco em frangalhos, depois de ver o seu agressor pedir desculpas pelo que chamou de "erro", e ainda insinuar que Ingrid tinha sido covarde de não terminar o relacionamento antes.

Leandro passou mais tempo tentando justificar sua disfunção erétil do que a violência que não negou, em nenhum momento, ter cometido.

Mesmo assim, ele conseguiu deixar o palco sem que ninguém ouvisse o nome do crime: não foi dita a palavra "estupro".

A violência foi chamada, pelos apresentadores, de "assunto delicado". Uma espécie de nota oficial foi lida por Camila Queiroz:

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"Ainda que algo tenha acontecido durante o relacionamento da Ingrid e do Leandro após o fim do programa, assuntos delicados como o abordado agora precisam ser tratados com muita seriedade e cuidado — e nós esperamos que essa história encontre um desfecho oportuno para todos".

Ela não falou o que seria um desfecho "oportuno". A delegacia?

Depois, a atriz pediu que Leandro também se retirasse do palco — Ingrid já tinha saído, sem suportar tanto gatilho. O outro apresentador, Klebber Toledo, emendou:

"Obrigado, Leandro".

Virando-se para a câmera, avisou: "Nós temos que retomar, ainda temos histórias de outros casais pra contar?".

E mudaram de assunto. O show, afinal, tem que continuar.

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Ou somos nós que precisamos passar por cima das violências pra seguir perseguindo o conto de fadas que é o casamento perfeito. Mesmo que seja arranjado às cegas. O sonho, afinal, tem que continuar.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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