Criadores de conteúdo da 'machosfera' transformam ódio às mulheres em lucro
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"Não siga nenhuma mulher"; "Destrua o ego dela e ela vai se arrastar aos seus pés"; "Fuja de mulher que só quer um pai para o filho do outro"; "Deixa de ser trouxa, elas sempre se aproveitam de homem bonzinho".
Essas são algumas das frases recorrentes na chamada "machosfera" ou "manosfera", comunidade de misóginos que usam as redes digitais para se organizar e disseminar o contra-ataque às conquistas feministas.
Falei da machosfera na coluna da semana passada, porque pra mim é o grande tema por trás da série "Adolescência". Retomo o assunto porque percebi, pelos comentários, que fora dessa bolha violenta e cada vez maior pouco se sabe sobre o que rola ali dentro.
É claro que cabe aos responsáveis adultos monitorar o que crianças e adolescentes em formação consomem online, conversar com eles e também educá-los pra que não desenvolvam o ódio às mulheres e outras fobias que nos são ensinadas.
Mas essa ainda não é a raiz do problema. Adolescentes sempre deram e sempre darão um jeito de mentir e agir às escondidas de pais e mães. Ainda mais no mundo digital, onde essa geração é muito mais letrada do que as que vieram antes.
Pra chegar à origem do problema é preciso alcançar, conter e punir os homens adultos que disseminam conteúdo de ódio enquanto tentam organizar um exército em torno de si.
As orientações que abrem este texto foram mapeadas por uma pesquisa lançada no fim do ano passado pelo NetLab (Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais), da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), em parceria com o Ministério das Mulheres.
Ao analisar o ecossistema misógino concentrado no YouTube, o levantamento observa um aumento significativo de vídeos com narrativas masculinistas a partir de 2022. São canais inteiros incentivando comportamentos machistas violentos e disseminando teorias conspiratórias — como a ideia de que o mundo está, na verdade, sob dominação feminina.
Disfarçados de estratégia de valorização do homem, os vídeos, segundo a pesquisa, expressam "aversão, desprezo, controle e ódio às mulheres, com comentários direcionados a grupos específicos, tratados de forma generalizada, como 'as feministas', 'as mães solteiras' e 'as mulheres mais velhas'".
Os mais de 76 mil vídeos analisados pelo NetLab somavam, até o momento da pesquisa, 4 bilhões de visualizações, e já reuniam 23 milhões de comentários. A conclusão é que, além de "encorajar, relativizar ou justificar abusos e violências contras as mulheres", os criadores desse tipo de conteúdo lucram com isso.
No YouTube, assim como nas redes cada vez menos regulamentadas de Mark Zuckerberg, a misoginia dá dinheiro. Eles ganham, enquanto as supostas "dominadoras" são violentadas e eliminadas.
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