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Débora Miranda

REPORTAGEM

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Dora Varella: 'No skate não torcemos para a outra se dar mal'

A skatista Dora Varella - Marcos Duarte/Divulgação
A skatista Dora Varella Imagem: Marcos Duarte/Divulgação

Colunista do UOL

20/02/2022 10h31

Durante a Olimpíada de Tóquio, no ano passado, o Brasil foi encantado por uma nova modalidade esportiva: o skate, que pela primeira vez disputava os Jogos. Por alguns dias, esquecemos o futebol -especialmente ao ver a Fadinha Rayssa Leal competir. Dispostos a tudo por uma medalha, passamos a fazer o que sabemos fazer melhor: secar as adversárias: "Não acredito, mas estou torcendo para uma menina de 13 anos cair", diziam muitos nas redes sociais.

Nas pistas, no entanto, o clima era outro, e as competidoras se ajudaram, se consolaram, comemoraram juntas e mostraram que, mesmo no esporte de alto rendimento, há espaço para a amizade. Em especial duas delas: Dora Varella e Yndiara Asp, as competidoras brasileiras na modalidade park. Ambas ganharam, em janeiro, o prêmio de Fair Play da Olimpíada. O reconhecimento foi pela reação empática das brasileiras após a queda da então campeã mundial Misugu Okamoto.

"Quando a Misugu errou e não conseguiu nota para medalha, ela ficou triste, começou a chorar. E a gente queria mostrar que ela era uma vencedora. Levantamos ela, queríamos criar um momento de felicidade, tranquilizá-la. É a percepção de que só a medalha não era importante", afirma Dora, 20 anos.

Segundo ela, esse apoio entre as atletas é muito comum no dia a dia do skate. "Todo o mundo nas pistas faz festa quando o outro acerta, se motiva, dá dicas. O skate sempre teve esse clima de amizade. Nunca presenciei um clima de uma menina querendo ser melhor do que a outra, torcendo para a adversária se dar mal. A gente se apoia. E acho que todas percebemos que era importante nos unirmos, até para conseguir nossos direitos", afirma, citando inclusive a equidade de premiação entre mulheres e homens e a inclusão da modalidade feminina em campeonatos que antes não tinham espaço para as mulheres.

Dora compete na categoria park - Heverton Ribeiro/Divulgação - Heverton Ribeiro/Divulgação
Dora compete na categoria park
Imagem: Heverton Ribeiro/Divulgação

Sete meses após a primeira Olimpíada do skate, Dora avalia como o bom desempenho do país ecoou no esporte. "O skate teve um boom. Chamou a atenção —e foi principalmente pela diversão e pela empatia que os atletas mostraram uns com os outros. É um esporte divertido de assistir, de torcer. E até distorceu aquela imagem de ser um esporte marginalizado. A galera passou a nos ver com outros olhos."

Ela conta que percebeu um crescimento de pessoas praticando, inclusive de meninas que descobriram novos ídolos em Rayssa, vencedora da medalha de prata, mas também em Leticia Bufoni, Pâmela Rosa, Isadora Pacheco, nela e em Yndiara.

Teve um crescimento para as mulheres. A Rayssa especialmente fez isso. Ganhou uma medalha, e muitas meninas se viram ali. Às vezes tem pais que não gostam de ver as meninas andando de skate, que acham que é coisa de menino, mas a Rayssa mudou a cabeça de muita gente. As pistas têm estado cheia de meninas desde então, e isso era bem raro quando eu comecei.

O bom clima entre as atletas pode favorecer um outro ponto importante e que vem sendo muito discutido no esporte: a saúde mental. Muitos esportistas de ponta foram a público recentemente para falar sobre problemas nessa área, que podem aparecer por causa da grande pressão de treinos e competições -entre diversos outros fatores.

"A saúde mental é para mim um dos pontos mais importantes", afirma Dora. "Sempre digo que nada pode fazer você perder o prazer do esporte. Às vezes é desgastante, mas a saúde mental tem que vir antes de tudo. Nunca passei por nenhum momento extremo, mas claro que tem dias em que não me sinto bem. Então, respeito minha cabeça e meu corpo. E lembro como comecei e por que faço isso."

Dora ganhou o primeiro skate de presente da avó e começou brincando no quintal de casa. Foi o pai quem a levou pela primeira vez a uma pista, aos 10 anos. "Achei que era o paraíso", lembra.

O skate mudou completamente a minha vida. Nem sei o que estaria fazendo se não fosse isso. O skate ensina muito a se portar no dia a dia também, fora do esporte. Como lidar com outras pessoas, como buscar seus objetivos. Caiu? Levanta e tenta de novo. Ensina muito para a vida, inclusive a torcer pelos outros e a respeitar as diferenças.