Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Xenofobia e intolerância: os refugiados não são iguais aos olhos do mundo
Com meus parcos conhecimentos em geopolítica, tenho observado a atual guerra da Ucrânia e tentado entender. Tendo a acreditar que, falando das grandes lideranças, não há mocinhos. Há interesses. Muitos que, em nossa vã filosofia, nem sonhamos (me refiro a nós, analfabetos políticos).
Digo isso, porque minha atenção é capturada pelo que, de algum modo, ainda posso compreender — as pessoas. Civis, militares...
Não consigo ter raiva, por exemplo, de garotos recém-saídos da adolescência, mandados ao front com uma arma em uma mão e um celular noutra, pra garantir a cobertura dessa emocionante e realista partida de "Call of Duty" para o TikTok.
E tem os civis.
A gente sempre acaba se identificando de modo mais íntimo, não? Mulheres, idosos e crianças, sendo arrancados de suas realidades com apenas poucos pertences e documentos, sem saber direito nem para onde, nem como.
Uma vida e um dia a dia deixados para trás. Casa, amigos, família, trabalho. Plantinhas, móveis e itens escolhidos com esmero. Fotos, livros, quadros, memórias. Tudo deixado. Deixam de ser apenas pessoas e se tornam refugiados. Refugiados, que se lançam ao mundo, em busca de acolhida, de uma porta aberta.
Voltando a minha ignorante observação, me chamou muita atenção a abertura oferecida por diversos países europeus aos refugiados ucranianos. Me chamou ainda mais atenção a abertura das portas mais bem fechadas do mundo, as portas americanas.
Para se ter uma ideia, a empresa americana Airbnb anunciou a oferta de alojamento temporário gratuito para até 100 mil pessoas em fuga da Ucrânia.
Numa lógica simples, me pus a comparar pessoas -- por que essas sim e aquelas não? Imediatamente, me vieram à cabeça as violentas e desoladoras cenas de refugiados da África e Oriente Médio.
Lembrei dos refugiados sírios em botes salva-vidas improvisados. Milhares morreram pelo caminho, outros tantos tiveram sua entrada solenemente negada em diversas fronteiras, depois de dias passando frio, fome e medo.
Não fui a única a comparar pessoas, aliás. O primeiro-ministro búlgaro Kiril Petkov disse a jornalistas, no início desta semana, sobre os ucranianos: "Estes não são os refugiados com os quais estamos acostumados... Essas pessoas são europeias. Essas pessoas são inteligentes, são pessoas educadas. [...] Esta não é a onda de refugiados a que estamos acostumados, pessoas que não tínhamos certeza sobre sua identidade, pessoas com passado obscuro, que poderiam ter sido até terroristas...".
Acho que não carece de maiores explicações, não é mesmo? Apenas a manutenção da homogeneidade cultural e étnica. Em outras palavras, racismo, preconceito e intolerância religiosa.
A "tragédia do Mediterrâneo", como é chamada, é a maior crise migratória desde a Segunda Guerra Mundial, e banha o Mar Mediterrâneo e a civilização contemporânea de sangue e corpos.
Qual a diferença desses corpos para esses outros que têm sua entrada facilitada? Para além das diferenças políticas, ideológicas e estratégicas entre conflitos, trata-se de pessoas brancas, de cristãos brancos, vindos de um país desenvolvido.
Naturalmente, o ponto não é sugerir o fechamento de fronteiras para quem quer que seja, mas sim de refletirmos sobre as gritantes diferenças de acolhida.
A imagem de Aylan Kurdi de bruços, morto, nunca sairá da minha cabeça. Aquele menininho sírio, de apenas 3 anos, encontrado no litoral da Turquia, sempre me enche de emoção, lágrimas e incredulidade.
Estamos em guerra, sim. Guerra da sensibilidade e empatia contra a vaidade, mesquinhez e estupidez humana.
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