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Fabi Gomes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Destilar ódio às mulheres piora a vida de todas -como a de quem você ama

Nos últimos dias, o ódio contra mulheres vem ganhando voz, de modo acelerado e surpreendente  - Motoki Tonn
Nos últimos dias, o ódio contra mulheres vem ganhando voz, de modo acelerado e surpreendente Imagem: Motoki Tonn

Colunista do UOL

07/06/2022 04h00

Você conhece alguma mulher? Existem mulheres próximas a você, no teu círculo pessoal e familiar? Bem, quero acreditar que ao menos uma mãe você tenha. Note que atrelei a questão ao círculo mais íntimo. Minha pergunta refere-se às pessoas queridas, que você ama. Você tem mulheres amadas na vida? Mãe, irmã, filha, amiga, tia, madrinha?

Beleza. Então, vem comigo nessa ideia. Quando você se engaja em algum movimento que demoniza, desacredita, faz menções agressivas e, muitas vezes, mata mulheres, você não tá apenas indo contra àquelas minas que você curte chamar de feministas mimizentas. Você tá contribuindo para dar ainda mais corpo ao machismo e ao ódio contra TODAS as mulheres, inclusive as que você ama.

Pensa que outras pessoas, com opiniões e atos agressivos contra mulheres, podem não ter esse teu controle, sanidade, sabedoria e discernimento. Muitas dessas pessoas podem ser ou se tornar violentas. Estamos nos tornando um dos países com maior índice de civis armados no mundo.

Aí, tua filha vai lá namorar um boyzinho que parecia muito gente boa, mas, de repente, as coisas começam a tomar outro rumo. A relação começa a se tornar danosa. Agressões verbais e, em seguida, físicas ditam o ritmo da relação. O boyzinho não era tão gente boa quanto parecia e, um dia, decide matar tua filha com 15 tiros na cabeça e depois queimá-la.

Preferiria evitar essa abordagem a la "Notícias Populares", mas acho que pode funcionar em alguns casos. Quando a gente se implica nas situações, nosso modo de ver, sentir e julgar se altera. Afinal, não estamos tratando dos outros, de desconhecidos, estamos falando dos nossos, da nossa vida. Estamos falando de gente. E somos todos gente, não é mesmo? Sim... Nem todos. Tem razão.

Nos últimos dias, o ódio contra mulheres vem (mais uma vez) transbordando e ganhando voz, de modo acelerado e surpreendente. Sim, é claro que sempre soubemos das armadilhas do machismo. Algumas silenciosas e sorrateiras, outras absurdamente evidentes, escancaradas e, convenientemente, abraçadas pelo manto da impunidade. Mas, evidentemente, os misóginos vêm perdendo a vergonha de se expressar publicamente e destilar seu ódio às mulheres.

A partir do caso Amber x Johnny, que, sem julgar mérito nem entrar nas minúcias processuais, ensejou todo tipo de ataque odioso contra Amber, parece que misóginos do mundo estão numa espécie de momento "uni-vos e vociferai". Um processo criminal é sempre muito doloroso e envolve manobras jurídicas por ambas as partes. Muitas delas fogem ao controle dos reles mortais de fora da magistratura. No entanto, muita, mas muita gente mesmo, decidiu que odiava essa mulher apenas com base numa análise tiktoker (em 15 segundos) do caso. E, mais que isso, decidiu ir a público expressar seu ódio. Que motivação é essa? De onde vem tanto ódio? Com o que ele contribui?

Logo após o julgamento estrelar, iniciaram-se ataques, questionamentos e NOTÍCIAS FALSAS, a.k.a fake news, a respeito do quê? Adivinhem? A Lei Maria da Penha. Não vou me prestar ao desserviço nem de replicar as notícias falsas, nem de divulgar seus autores.

Limito-me a compartilhar alguns trechos sobre o comportamento do senhor Marco Antônio Heredia Viveros, ex-marido de Maria da Penha, que, simulando um assalto, tentou assassiná-la, enquanto a mesma dormia, deixando-a paraplégica. De volta à casa, ainda sem ter se dado conta de que dormia com o inimigo e acreditando na versão inventada sobre o assalto, solicitou ajuda do marido para tomar banho e foi, novamente, vítima de tentativa de assassinato —feminicídio. Dessa vez, Heredia tentou eletrocutá-la.

Quer mais informações sobre o comportamento colérico de Heredia? Compartilho um trecho da matéria da "Revista Isto É" do ano de 2011:

"Dos relatos publicados por Maria da Penha no livro ' Sobrevivi?' , os mais chocantes são os relacionados às meninas. ' Tudo era motivo de bater nas filhas, quebrar os brinquedos ou objetos quaisquer que encontrasse à sua frente. Às vezes, só por encontrar uma cadeira, toalha ou outro objeto fora do lugar, já era motivo para gritar, quebrar as coisas de casa com tanta raiva que nos amedrontava, inclusive as babás (...)'

' A fim de tirar o hábito que minha segunda filha tinha de, para adormecer, chupar o dedo polegar, Marco metia suas mãozinhas em meias e as imobilizava, amarrando-as por elásticos, com tal intensidade que, no dia seguinte, persistiam nos braços da criança vergões vermelhos como se fossem queimaduras. (?) Para evitar que as meninas molhassem a cama durante a noite, elas só podiam tomar água até a hora do almoço'".

Somente 13 anos depois do crime e após pressão de órgãos internacionais, a justiça brasileira condenou Marco Antônio Heredia Viveros, que, com idas e vindas processuais, acabou cumprindo apenas dois anos em regime fechado.

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