Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Sobre o dia em que quase morri durante a São Paulo Fashion Week
Semana passada, comecei a contar um dos tantos perrengues que enfrentei na minha incursão na moda.
Em resumo, esse foi o desafio que se apresentou: chegando ao ateliê de um estilista para conduzir um teste de maquiagem, me deparei com duas modelos que já tinham uma ideia de maquiagem esboçada.
No auge da minha cabacice e falta de senso de gerenciamento de majestosas crises, soltei: "Marie (como ela acreditava ser francesa, vou usar um nome afrancesado), acabei de fazer um teste em outro lugar e a maquiagem é muito parecida com essa".
Ao que Marie, já visivelmente impaciente, crocante e com olhos esbugalhados, devolveu: "Pra quem?". Uma Fabiana, com o que parecia ser total despreparo junto a essa já conhecida senhora, respondeu: "Pro Fulano, um estilista novo muito talentoso". Isso é que é ser besta! Uma completa falta de noção. Só taquei um pouco mais de álcool na fogueira das vaidades.
Então, Marie esbravejou "Ele que mude!", e orientou que eu refizesse a maquiagem, seguindo aquela estética.
Assim fiz. Me amaldiçoando pela precipitação e falta de habilidade para conduzir a situação num outro sentido. Eu poderia ter dito que na Europa aquele estilo de maquiagem havia sido jogado no limbo pelo pessoal da Margiela (grife hypadona e que Marie admirava a olhos vistos). Poderia ter falado que os astros estavam desalinhados para aquele estilo e cor de maquiagem. Mas não, meti os pés pelas mãos.
Terminei o look, fotografei e me retirei. Cabeça bombando, pensando em como sair dessa. Dois desfiles com maquiagens tecnicamente diferentes, mas que, aos olhos de não profissionais, pareceriam a mesma. Como o estilista sensação (da primeira make) tinha sido muito profissional, simpático e HUMANO, achei que deveria colocá-lo a par da contenda. Liguei e contei sobre a situação. Suavemente, o lindo me disse: "Fabi, tô muito tranquilo sobre nosso processo e resultado final. Fiquei muito feliz e satisfeito. Nosso trabalho foi absolutamente honesto e genuíno. Seguimos no mesmo look".
Fiquei tocada com a atitude, mas, ao mesmo tempo, me pus a pensar sobre como responder às perguntas que certamente surgiriam a respeito a semelhança dos looks. Procurei amparo e benção nas esferas superiores às quais eu respondia na época. Liguei para Nova York e contei sobre a treta tropical. A senhoura do outro lado da linha respondeu: "Fabi, é assim que nascem as tendências". Pensei, aham. PQP. Eu tinha certeza que aquilo daria ruim, as pessoas comentariam que eram looks iguais. Imaginem! Um desfile após o outro, a mesma maquiadora. Se pá, diriam que nem tirei de um desfile pro outro, que mantive a mesma maquiagem nas modelos.
No fatídico dia dos desfiles, eu ainda assinava um terceiro desfile antes desses dois. Uma maquiagem técnica e trabalhosa, o que significa gastar mais tempo, energia e carisma na manutenção da unidade do trabalho. Assim começou meu dia. Quando cheguei no camarim pro último desfile (o do estilista que estreava), fui informada de que ele queria falar comigo antes que eu começasse a demonstração de maquiagem para a equipe.
Para coroar o drama, esse desfile seria veiculado ao vivo no programa de moda mais importante daquela época. O repórter do referido canal já tava me esperando para saber da concepção da maquiagem e tals.
Fui ao encontro do estilista e o terror se confirmou: "Fabi, você tinha razão, as maquiagens são muito parecidas. Vamos ter que mudar." Esse é o momento em que o som do monitor cardíaco cessa de oscilar, fica uniforme e constante, e você dá uma morridinha.
Mudar a maquiagem horas antes do desfile. Ter uma ideia boa para o desfile inaugural de uma promessa da moda, garantir que seja uma maquiagem que toda equipe possa reproduzir nas modelos, pensar nos produtos necessários para a reprodução de um look não programado...
A ideia foi parida e aprovada de primeira. Lembro do momento da aprovação e da equipe de TV acendendo a luz na minha cara, o repórter botando microfone pra jogo e indagando: "É normal isso de mudar a maquiagem assim no dia do desfile, Fabi?".
Não lembro o que respondi, mas lembro de ter respondido com um sorriso emprestado colado ao rosto. Naquele dia, cheguei em casa e acho que senti o que sente um defunto quando se deita.
E você, já passou por um perrengue fuerte no trabalho? Já precisou improvisar de última hora para escapar de uma treta? Me conta? Bora fazer um compêndio de tretas no trabalho! Vem bater papo no meu instagram @fabi.gomes.
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